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MANAUS, AM (FOLHAPRESS) - Coveiros carregando caixões de morto em razão da Covid-19 sem nenhum tipo de proteção. Um, de camiseta regata, chega a deitar sobre um túmulo de terra para descansar. Três caixões dispostos lado a lado, com famílias dos mortos aglomeradas em torno deles. Uma escavadeira abrindo valas em série. Ao menos o dobro de enterros por dia. Essa foi a rotina no cemitério municipal Nossa Senhora Aparecida, o maior de Manaus, nesta quarta-feira (15).
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A cidade é o epicentro da epidemia do novo coronavírus no Amazonas, estado com maior taxa de incidência. São 303 casos a cada 1 milhão de habitantes, quase duas vezes a média nacional de 111/1 milhão. "É uma esculhambação", desabafa o agente funerário de uma empresa privada.
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Vestido de bota, macacão com capuz, luva e óculos, ele parecia uma alienígena ao carregar o caixão de uma vítima da Covid-19 ao lado de quatro coveiros do cemitério com pouca ou nenhuma proteção.Alguns coveiros usavam máscara e luva, outros, apenas um dos itens. Um circulava sem camisa.
Outro, encarregado de cavar, estava sem nenhuma proteção e usava uma camiseta regata estampada com a palavra Danger (perigo) e uma caveira. No intervalo entre enterros, ele chegou a deitar sobre uma cova de terra para descansar por alguns minutos.
Em apenas um dos enterros por Covid-19, os coveiros usavam trajes de proteção que cobriam todo o corpo.O hospital, no bairro Tarumã, é administrado pelo município, comandado pelo prefeito Arthur Virgílio Neto (PSDB), que tem criticado duramente o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por defender o fim do isolamento social no país.
Na terça-feira (14), Virgílio Neto assinou um decreto recomendando o uso de máscara em lugares públicos, sem prever nenhuma punição para quem não o fizesse.O movimento no maior cemitério de Manaus mais forte aconteceu a partir das 13h30, quando a administração do local reabre. Sete corpos chegaram para ser enterrados quase ao mesmo tempo em um setor recém-aberto do cemitério.
Desses, três vieram do Serviço Pronto Atendimento (SPA) Joventina Dias após morrerem com suspeita de Covid-19.Os corpos foram colocados sobre duas pequenas estruturas metálicas, cada uma com espaço para três caixões. Ficaram ao lado de mortos por outras causas, gerando uma pequena aglomeração de familiares dos seis enterros. O arranjo contraria documento do Ministério da Saúde com orientações sobre enterro de mortos por Covid-19: "A cerimônia de sepultamento não deve contar com aglomerado de pessoas, respeitando a distância mínima de, pelo menos, dois metros entre elas, bem como outras medidas de isolamento social e de etiqueta respiratória", orienta o texto.
Um dos mortos vindos do Joventina Dias era o aposentado Raimundo Gomes Moreira, 80. Presente ao enterro, o filho Aldo Gomes, 53, disse que acompanhou seu pai nos dois dias em que ele esteve internado. Durante o enterro, ele usava uma máscara cirúrgica. No documento de óbito, abaixo do item Descrição Sumária do Evento, lia-se: Covid. Gomes, porém, afirmou que o resultado definitivo do exame de seu pai ainda não havia saído. "Muitos acreditam no perigo e nem abrem a porta de casa, mas tem pessoas que não estão ligando, não", afirma Gomes, que trabalha como técnico de tampografia.
Sob a condição do anonimato, funcionários do cemitério disseram que há pelo menos 50 enterros diários desde o último domingo (12). De acordo com o site da prefeitura de Manaus, o cemitério registrou uma média de 20 enterros diários durante 2019.
A reportagem solicitou à prefeitura números de enterros e enviou perguntas sobre os procedimentos para os sepultamentos, mas não houve resposta até a conclusão desta edição.
Adversários políticos, Vírgilio Neto e o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC) não se encontraram nenhuma vez para discutir a crise. No início, eles chegaram a trocar críticas sobre o manejo da saúde vias redes sociais.Nesta quarta-feira, o Amazonas registrou mais 70 casos do novo coronavírus. O estado soma 1.554 casos confirmados, com 106 mortes –16 óbitos novos em 24 horas.