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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Entre os dias 16 de março e 30 de junho deste ano, os chamados para reparar interferências na rede de energia na capital paulista relacionadas a pipas aumentaram 205%, passando de 1.114 no mesmo período de 2019 para 2.067 no atual, durante a pandemia.
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Os dados, fornecidos pela Enel-SP, indicam que as regiões mais afetadas são leste e sul, seguidas de oeste e norte, respectivamente. A principal queixa é a falta de energia, que geralmente ocorre quando uma pipa com material cortante -cerol ou "linha chilena"- rompe um cabo elétrico, causando curto-circuito.
"Um bairro inteiro pode ficar sem luz por causa de uma única pipa", alerta Vinicyus Lima, gerente de operações da distribuidora.Ele atribui o aumento de casos nesse primeiro semestre à quarentena.
"Com a antecipação das férias, o impacto foi maior para a nossa rede, porque muitas pessoas soltaram pipa em época que não é comum."O período de registros crescentes da Enel envolvendo o brinquedo coincide com a alta demanda na Nenê Pipas, que fica em Americanópolis, na periferia da zona sul paulistana.
"Antes da pandemia vinha uma média de 15 pessoas por dia na loja. Depois, nesse período de quarentena, principalmente em maio, foi para mil. Quando eu não podia abrir, chegou a formar fila na porta", conta Renato Haro, o dono da loja.Segundo o comerciante -que tem clientes de todas as regiões de São Paulo e até de outros estados, como Sergipe e Acre-, muitos fornecedores não têm mais matéria-prima para vender.
Na zona leste, outro comerciante do ramo, Danilo Jorge Pereira, de 38 anos, também viu a clientela disparar. "Geralmente, assim que passa o Carnaval a procura já diminui, mas este ano, com shopping e parque fechados, aumentou em aproximadamente 100%. Tem gente que veio na loja depois de 8, 10 anos sem empinar", afirma o dono da Danilão Pipas, que fica no bairro de Cidade Patriarca.
Na redondeza, ele garante que é comum, principalmente aos domingos, ver gente soltando pipa "até da sacada do apartamento".Com cuidados, a prática é bem-vinda O pintor residencial Edvaldo Capdevilla tem 58 anos e é adepto da prática desde a juventude. De uns tempos pra cá, só empinava uma vez por ano, mas não resistiu ao ver o céu "parecendo um enxame" nos últimos meses."A gente vê um baita quadrado bonito e se sente estimulado, quer colocar um no alto também. Mas a gente sabe onde pode soltar."
Morador da Vila Germinal, na zona norte, ele cita locais da mesma região que são mais abertos e seguros, como um terminal de cargas da Vila Sabrina onde os pais levam filhos pequenos nas tardes de domingo. Por falar em segurança, aliás, o pintor já viu muito acidente por causa de pipa."É o que mais tem. Um conhecido provocou um curto e levou um choque porque foi mexer em uma pipa que estava enroscada em um cabo de energia."Assim como o risco que linhas com material cortante oferecem à vida de motociclistas e pedestres, ocorrências com choque também podem ser fatais, segundo o especialista da Enel.
"Muitas pessoas acham que podem resgatar pipa usando bambu ou um pedaço de madeira, achando que é isolante [elétrico]. A madeira em si pode não conduzir energia, mas as impurezas que ela carrega devido à poluição, somadas à umidade podem causar um acidente fatal, assim como o bambu, que retém água."
Para Maria Angela Barbato Carneiro, coordenadora do Núcleo Cultura e Pesquisas do Brincar da PUC-SP, uma vez tomados os cuidados, a prática traz benefícios."Traz equilíbrio, concentração e até noções de Física, por estimular a observação da direção do vento."
A brincadeira antiga, segundo ela, era usada como sinalização na guerra pelos japoneses, que indicavam, no alto, onde estavam sendo atacados. Mas, para entreter as crianças, o objeto não precisa ser complexo."Os pais podem montar uma capucheta [espécie de pipa sem varetas] com jornal. É barato e lúdico."