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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em luto, um dia após a grande explosão que deixou mais de 110 mortos e 4.000 feridos, a cidade de Beirute está bem longe de voltar à normalidade. Além dos que não sobreviveram à tragédia, dos que seguem internados em hospitais lotados e das possíveis vítimas ainda presas em escombros, a capital libanesa vai precisar lidar com mais de 300 mil desabrigados.
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"Mais da metade de Beirute está destruída ou danificada", disse o governador Marwan Abboud.
Autoridades libanesas ainda aguardam uma avaliação mais precisa feita por especialistas e engenheiros, mas o governador estima que os danos podem chegar a valores entre US$ 3 bilhões e US$ 5 bilhões (entre R$ 15 bilhões e R$ 23 bilhões).
Chorando, Abboud comparou a destruição à causada pelas explosões nucleares em Hiroshima, 75 anos atrás. "A situação é apocalíptica. Beirute nunca viveu isso em sua história."A mesma comparação foi evocada por outros sobreviventes que falaram à agência de notícias AFP.
"Parecia um tsunami, ou Hiroshima. Foi um verdadeiro inferno. Algo me atingiu na cabeça, e todos os objetos começaram a voar ao meu redor", conta Elie Zakaria, morador do bairro de Mar Mikhail, famoso por seus bares noturnos e que se encontra voltado para o porto.
"É um massacre. Fui para a varanda e vi gente gritando, ensanguentada. Estava tudo destruído".
A intensidade das explosões chegou a ser detectada pelo Serviço Geológico dos Estados Unidos (USGS), que monitora atividades sísmicas em todo o mundo. O impacto em Beirute foi registrado como equivalente a um terremoto de magnitude 3.3.
Segundo testemunhas, o estampido da explosão foi ouvido até na cidade costeira de Larnaca, no Chipre, a cerca de 200 km da costa libanesa.
No epicentro da tragédia, o panorama é desolador: carros foram incinerados e lixeiras parecem latas de conserva retorcidas. Nas ruas de Beirute, soldados ainda evacuam moradores atordoados, muitos ensanguentados, com camisas amarradas ao redor da cabeça para conter os ferimentos.
Paredes de prédios foram destruídas, janelas quebraram, carros foram virados de cabeça para baixo e destroços bloquearam várias ruas, forçando feridos a caminhar em meio à fumaça até hospitais.
O brasileiro Rajeh Merhi mora a 20 km do local da explosão, em Aley. Ainda assim, viu parte do teto de gesso da casa de sua mãe cair.
O barulho fez com que pensasse se tratar de uma bomba jogada por um avião –talvez o início de uma guerra. O prédio de quatro andares tremeu, conta ele, que chegou a ouvir o barulho da explosão.
Já debilitado por anos de dificuldades políticas e econômicas, o Líbano agora depende de ajuda internacional para tentar se reerguer.
O sistema de saúde, já sobrecarregado pelo atendimento a paciente contaminados pelo coronavírus, agora luta para conseguir prestar primeiros socorros às vítimas da explosão.
Países como França, Alemanha, Turquia, Rússia, Qatar e Irã anunciaram o envio de assistência médica, profissionais de saúde, hospitais de campanha, equipamentos cirúrgicos e equipes de busca e salvamento.
Localmente, uma rede de solidariedade também começou a se fortalecer nas redes sociais. Perfis em diferentes plataformas têm feito publicações para ajudar a localizar os desaparecidos e para oferecer moradia aos milhares de desabrigados.
"Entre em contato comigo se você ou alguém que você conhece precisar de abrigo", escreveu uma usuária no Twitter. "A casa da minha família não foi afetada e está aberta. Também podemos providenciar transporte."
Outro perfil, antes destinado a monitorar os protestos que se espalharam pelo país, agora faz um mapeamento dos locais disponíveis para abrigar aqueles que perderam suas casas.
Usando a hashtag #ourhomesareopen (nossas casas estão abertas) o movimento se espalha pelas redes para tentar amenizar a grave crise humanitária instalada em Beirute.
Enquanto ainda se investigam as causas da explosão, a segurança alimentar dos libaneses também está ameaçada.
De acordo com o ministro da Economia, Raoul Nehme, a explosão destruiu o principal silo de grãos do país, deixando o Líbano com menos de um mês de reservas de trigo.
O ministro afirmou que há navios a caminho para cobrir as necessidades a longo prazo. O porto de Beirute, entretanto, era a principal porta de entrada para os alimentos importados.
"Tememos que haja um enorme problema na cadeia de suprimentos, a menos que haja um consenso internacional para nos salvar", disse Hani Bohsali, chefe do sindicato dos importadores.
Agências da ONU estão reunidas nesta quarta-feira para coordenar os esforços de socorro a Beirute, disse Tamara al-Rifai, porta-voz da agência palestina de refugiados.
"As pessoas são extremamente pobres, é cada vez mais difícil para qualquer um comprar comida e o fato de Beirute ser o maior porto do Líbano torna a situação muito ruim."
Segundo ela, o porto de Trípoli, a segunda maior cidade do país localizada a 85 km da capital, é a principal alternativa no momento, mas pode não ser capaz de atender as demandas dos libaneses.