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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O PT quer estancar a debandada de simpatizantes rumo à pré-candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) para prefeito de São Paulo com conversa e, no caso de filiados, fazendo valer as medidas previstas em seu estatuto.
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O partido está incomodado com o apoio dado a Boulos por personalidades historicamente ligadas à legenda e ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O concorrente oficial da sigla é o ex-deputado federal Jilmar Tatto.
"A filiação petista carrega consigo algumas responsabilidades, entre elas a de lealdade ao candidato do partido. Obviamente que o estatuto prevê medidas para casos em que isso não acontece", diz a presidente nacional do partido, Gleisi Hoffmann.
Ela não quis citar diretamente que medidas seriam essas, mas as punições previstas incluem censura, suspensão ou até expulsão.
Entre as personalidades que já declararam apoio ao pré-candidato do PSOL estão o ex-ministro das Relações Exteriores Celso Amorim, que é filiado ao PT, além da fundadora do partido e ex-deputada Bete Mendes.
Também se manifestaram nesse sentido o cientista político e ex-porta-voz de Lula André Singer, além de artistas e intelectuais como Chico Buarque, Wagner Moura, Camila Pitanga e Luis Fernando Verissimo.
A presidente petista defende, como primeira medida, o diálogo, sobretudo com relação aos que não são ligados formalmente ao partido. "Em relação aos não-filiados, mas que são próximos, é um direito deles fazerem essa opção. Nesses casos, o PT da capital, o estadual e o nacional, têm de chamar as pessoas para conversar", afirma Gleisi.
Muitos destes apoios a Boulos são puramente simbólicos, pois vêm de pessoas que nem são de São Paulo, como Amorim, Chico e Moura. Mas afetam a imagem de Tatto como candidato viável e criam uma sombra ao PT no campo da esquerda.
Escolhido em um processo interno por diferença apertada, após as prévias terem sido canceladas em razão da pandemia, Tatto tem força na máquina partidária e em bairros da periferia, sobretudo na região da Capela do Socorro e adjacências.
Mas líderes partidários têm dúvida sobre sua capacidade de empolgar a classe média e ampliar sua aceitação nas regiões centrais da cidade. Boulos, por outro lado, sempre teve interlocução fácil com os meios acadêmico e cultural, além de cativar parte das classes mais ricas simpatizantes da esquerda.
Para Gleisi, Tatto vai crescer naturalmente na campanha, embalado pela capilaridade do PT nos bairros mais pobres.
"O Jilmar tem uma atuação grande na periferia de São Paulo, um trabalho muito antigo. A nossa militância está bem organizada, em várias zonais e coordenações regionais. Acredito que a campanha vai crescer muito", afirma a presidente nacional do partido.
O fato de tantos nomes ligados a Lula estarem apoiando outro candidato deve antecipar a entrada do ex-presidente na campanha, primeiro por meio de vídeos e lives e depois, se a pandemia permitir, eventos presenciais.
Também se discute trazer mais para o centro da candidatura o ex-prefeito Fernando Haddad, que se recusou a entrar na disputa eleitoral.
Pré-candidatos a vereador preocupados com seus mandatos em caso de desempenho fraco ainda sonham com uma mudança de ideia de Haddad, que pode ocorrer até a data-limite para as convenções, em 16 de setembro.
O ex-prefeito mantém-se firme em sua decisão, no entanto, citando como álibi o fato de que Tatto foi escolhido por uma decisão soberana do partido.
Coordenador da campanha de Tatto, Laércio Ribeiro afirma que filiados na cidade que declararem apoio a Boulos terão de sofrer as consequências previstas pelo partido.
"Se aparecerem filiados da capital, expressões do partido aqui em São Paulo, aí vamos tomar providências com base no estatuto do PT. Comissão de ética é uma possibilidade", afirma Ribeiro, que também preside o diretório municipal do partido.
Segundo ele, Tatto pode estar sendo rejeitado por algumas figuras da esquerda porque não tem o perfil típico da classe média.
"Tenho curiosidade de perguntar a essas pessoas [que apoiam Boulos] o que está acontecendo. Qual a diferença do programa? Ou é porque querem alguém com estética de classe média? O Tatto veio da Capela do Socorro, não tem esse estereótipo", afirma.
O partido aposta que a campanha crescerá conforme ficar claro que Tatto é nome oficial do PT. Também busca reforçar alguns pontos associados à imagem do pré-candidato, especialmente no setor de transportes. Ele ocupou o cargo de secretário municipal na área e foi responsável por implementar corredores de ônibus e o bilhete único.
Para contrabalançar o apoio dos artistas ao PSOL, o PT prepara seu próprio manifesto na área cultural, a ser lançado nas próximas semanas. "Teremos mais de 800 artistas populares. Eles não são globais, mas são reconhecidos nos bairros, cantam nos bares, têm uma representatividade na ponta", diz Ribeiro.
Para o deputado estadual Emídio de Souza, o PT precisa fazer uma reflexão sobre os motivos que levaram a essa perda de apoios na esquerda. "É um sintoma de que algo precisa ser pensado, corrigido. Precisa avaliar a situação se esse movimento continuar se ampliando", afirma ele, que deve ser candidato a prefeito de Osasco.
Ex-presidente do partido no Estado, Souza afirma ser contra medidas punitivas. "O PT tem que dialogar com as pessoas, mostrar o nosso projeto".
A quantidade de votos que cada debandada significa representa menos que o simbolismo, segundo ele. "Sempre foram aliados nossos, não é bom perdê-los, nem circunstancialmente", declara.
O deputado federal Alexandre Padilha (SP), que disputou a indicação com Tatto internamente, diz que o momento é de ampliar o grau de conhecimento do candidato na cidade.
"O PT precisa se preocupar e se concentrar em agregar pessoas, em botar a campanha na rua. E ao longo da campanha vamos afirmando cada vez mais a candidatura do PT como aquela que tem condições de ser alternativa real".
Segundo ele, a candidatura de Boulos não é o verdadeiro alvo do PT na cidade. "Boulos e [Luiza] Erundina [candidata a vice] são companheiros valorosos, não são os adversários da campanha do Tatto. Os principais adversários são o projeto genocida de Bolsonaro e a atitude privatista e elitizante de Bruno Covas e João Doria", diz.