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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Sem figurar como postulante a prefeita ou a vice, a professora Lúcia França, 58, vem experimentando dias de candidata na eleição municipal em São Paulo. Desde agosto, sua agenda soma mais de 80 compromissos, entre reuniões e visitas, além de gravações para o horário eleitoral.
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A esposa de Márcio França (PSB) tem papel central na candidatura do ex-governador, que está em terceiro lugar na pesquisa Datafolha, com 8%, empatado com Guilherme Boulos (PSOL), que alcança 9%.
Parceira do marido na vida pública desde que se conheceram, há 40 anos, Lúcia assumiu protagonismo equivalente ao do vice, o sindicalista Antônio Neto (PDT), e é vista pela coordenação da campanha como um elo com o eleitorado feminino e com organizações não governamentais.
Usando a primeira pessoa do plural ao se referir à candidatura, ela reivindica a função de conselheira política do marido e diz ser consultada para tudo. "Sou incapaz de falar 'o prefeito', como se ele fosse o personagem. Falo 'nós', 'quando nós assumirmos a prefeitura'", afirma à reportagem.
A ex-primeira-dama, descrita por pessoas próximas como comunicativa e perspicaz, ainda preenche na campanha espaço da discussão sobre a participação feminina na política, tema tão presente nesta eleição. Outros concorrentes emplacaram ou tentaram –colocar– mulheres como vices.
Nas ruas, Lúcia (que teve Covid-19 em julho e já se recuperou) se divide com o marido na missão de tentar alavancá-lo na cidade, onde ele teve 945 mil votos a mais que João Doria (PSDB) no segundo turno de 2018 –o atual governador venceu com margem apertada, impulsionado pelo interior do estado.
"Raramente fazemos uma agenda conjunta", diz ela. "A gente gosta que as pessoas tenham certeza de que onde eu estou o Márcio está, e vice-versa. Ele carrega o olhar da professora. E eu levo o do administrador, que tem o know-how [da gestão], a expertise para resolver problemas."
De acordo com ela, disputar a Prefeitura de São Paulo não estava nos planos de França, que foi vereador e prefeito de São Vicente (Baixada Santista), deputado federal, vice-governador e governador por nove meses em 2018, após a renúncia de Geraldo Alckmin (PSDB) para disputar a Presidência.
Mas o resultado de dois anos atrás mudou tudo. "Falei: 'Márcio, você vai ser candidato. A gente deve isso à cidade, todo o mundo botou fé em você. A gente não pode virar as costas'."
Com as obrigações na capital (onde nasceu e voltou a morar em 2019), Lúcia tem se dedicado menos ao colégio particular dirigido por ela em Praia Grande. Delegou tarefas à filha e à nora, que trabalham na escola.
Alinhada à estratégia do marido de encarnar a figura do anti-Doria, Lúcia endossa as críticas dele ao tucano, em movimento para desgastar o prefeito e candidato à reeleição, Bruno Covas (PSDB), aliado do governador. França ajudou a estruturar a campanha do PSDB à prefeitura em 2016.
"Nós, como a maioria da população, acreditamos nas falsas promessas do Doria. Nos frustramos", diz ela, alfinetando-o por abandonar o mandato e deixar de "honrar a história de tantos anos de seu partido".
A ex-primeira-dama afirma que Doria transformou Covas em marionete. "Conheço o Bruno desde criança. É um cara do bem. Mas, infelizmente, todo mundo que chega perto do governador fica acuado."
E segue: "Vejo constrangida aquelas entrevistas [coletivas sobre a pandemia do coronavírus], em que o prefeito fala, e na sequência o governador diz: 'Olha, ele quis dizer que tal e tal'. Não dá, não dá".
Lúcia também faz eco ao marido para justificar a já célebre foto de França com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), tirada em agosto em São Vicente. O aparente flerte eleitoral custou ao candidato do PSB críticas de apoiadores à esquerda. "Nós não somos bolsonaristas", rebate a professora. "Mas o Bolsonaro é o nosso presidente da República. A gente não pode fechar as portas nem para o presidente nem para o governador. Não é algo pessoal."
De acordo com a versão propagada por França (e reforçada pela esposa), ele foi ao encontro do presidente para discutir o auxílio do Brasil a Beirute após a explosão ocorrida na capital do Líbano.A família de Lúcia tem raízes no país árabe, o que motivou o interesse em ajudar, segundo o casal.
Em 2018, quando virou primeira-dama e assumiu a presidência do Fundo Social de Solidariedade (braço do governo para programas sociais), Lúcia disse à Folha de S.Paulo ser "bastante feminista", mas sem radicalismos. Ela reforça a posição agora e diz que França "valoriza a mulher", tanto que sempre a incentivou a buscar sua autonomia intelectual e financeira.
"Desde o começo, ele entendeu que eu não seria um bibelô."
No debate de quinta-feira (1º) na Band, Boulos perguntou a França se o rival concorda em "lavar as mãos" diante da violência contra a mulher, relembrando a afirmação dele em 2018 de que a Polícia Militar poderia ser mais eficiente se não tivesse que atender a tantas brigas domésticas.
"Quando um casal tá brigando, não necessariamente precisaria ter um PM ou dois PMs com viatura, revólver", afirmou o então governador, ao comentar o alto volume de ocorrências de desinteligência. Na TV, França refutou a insinuação de Boulos, dizendo que tinha falado sobre maneiras alternativas de resolver o problema, sem necessariamente depender de policiais.
A campanha, em nota, afirma que a declaração foi distorcida e que o candidato do PSB defende atendimento especializado para conflitos familiares, envolvendo, além de PMs, profissionais de saúde e de assistência social.
França, no texto enviado à reportagem, diz ainda que a vice de Boulos, Luiza Erundina (PSOL), foi sua colega de partido e o apoiou em eleições para líder de bancada na Câmara dos Deputados.
"Erundina não votaria em mim se eu fosse o que Boulos tenta qualificar."
Ao responder sobre o tema no debate, o ex-governador disse que a esposa ("minha marqueteira número um") o acompanhava no estúdio.
O marqueteiro oficial da campanha, Raul Cruz Lima, confirma Lúcia como peça-chave na estratégia de comunicação do postulante. A professora já aparece nas redes sociais e estará nas propagandas de TV.
"É uma pessoa ativa, com boa oratória. É um diferencial. Nenhum outro candidato tem uma mulher com essa imagem de companheira, que está ao lado do marido e participa do trabalho dele", diz.
Lúcia prefere relativizar o peso da esposa em uma campanha. "As pessoas prestam atenção na família [do candidato]. E as famílias estão aí, cada uma a seu modo, e a minha é do jeito que é", diz ela, que tem dois filhos –um deles o deputado estadual Caio França (PSB)– e dois netos.