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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Enquanto Chelyda Brenda, 25, empunhava bandeiras de um candidato a vereador em Fortaleza, seu filho Jean, 6, a acompanhava no carro da coordenação do ato de rua da campanha eleitoral.
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Sem emprego e sem auxílio emergencial , a campanha é sua única fonte de renda neste mês de outubro.
Mas o dinheiro tem data para acabar: o trabalho termina em novembro, pouco antes do primeiro turno das eleições.
Sua situação se repete em outras capitais, pois pandemia vem eliminando até os empregos menos qualificados.
A população ocupada chegou a 81,7 milhões de pessoas em agosto deste ano, queda de 12 milhões de pessoas ante igual mês de 2019.
A taxa de informalidade, que antes segurava o mercado de trabalho, caiu de 41,4% –quando batia o recorde– para 38% entre os trimestres encerrados em agosto de 2019 e agosto de 2020. Ao todo, há 31 milhões de trabalhadores informais no país.
Cresce ainda o número de brasileiros subutilizados, que trabalham menos do que gostariam: eram 33,3 milhões em agosto, 3 milhões mais que no trimestre anterior.
Assim, as campanhas eleitorais têm sido um paliativo de curto prazo para a renda de milhares de famílias.
Chelyda é mãe solo e negra, mora com o filho, a mãe e o irmão mais novo na periferia de Fortaleza. Cumpre jornadas de trabalho de oito horas seguindo a agenda do candidato O contrato temporário prevê salário mensal de R$ 1.500.
Também mãe solo, Marcia Lourenço, 18, exerce desde o início de outubro a função de mobilizadora de campanha. Em 2018, grávida, foi expulsa de casa pelo pai e foi morar com a ex-sogra. Parou de estudar para cuidar do filho.
"Será meu primeiro salário. Vai ajudar com as despesas do Gabriel", conta a jovem que nunca havia trabalhado.
Igor Almeida, 29, vive situação semelhante após ter perdido o emprego em uma empresa de cosméticos. Sem carteira assinada, ficou sem o seguro-desemprego e não foi aceito no auxílio emergencial.
Há cinco meses, ele e a esposa Sara, 31, vivem do Benefício de Prestação Continuada da mãe. "Nas campanhas anteriores, eu ajudava o candidato, amigo de infância, de forma voluntária. Desta vez, eu precisava do dinheiro. É cansativo, mas vou ter o que comer", explica.
No Recife, o manobrista desempregado Márcio Silva, 40, virou "vigia de bandeira". Ganha R$ 30 por dia, sem direito à alimentação. Todos os dias, às 12h, fixa dez bandeiras na Avenida Rosa e Silva, na zona norte do Recife, de um candidato à eleição majoritária.
"Coloco as bandeiras e fico olhando até 17h para ninguém mexer. O sol é forte e o tempo demora a passar, mas foi o trabalho que apareceu", conta.
Ele, que ainda tenta sacar a última parcela do auxílio emergencial do governo, foi contratado por 15 dias pela campanha de um candidato a prefeito e diz torcer pelo segundo turno.
Em Casa Forte, bairro de classe média alta do Recife, a estudante Alice Raissa, 19, trabalha das 14h às 20h distribuindo material de uma candidata a vereadora. Diz ter só 15 minutos de descanso, sem transporte ou alimentação. Foi contratada por R$ 1.100 para 45 dias. "Fiquei preocupada com a pandemia, mas a gente tem que se virar", diz
Em Salvador, as campanhas também são opção de renda extra para quem estava desempregado.
Moradora do bairro de Cajazeiras 8, periferia da capital baiana, Raquel dos Santos, 38, trabalha na campanha de um candidato a vereador por um salário mínimo e jornadas diárias de 9h às 17h.
Além do aumento do desemprego, o período da pandemia também é marcado pelo crescimento do desalento, de pessoas que não procuraram trabalho, mas estavam disponíveis para trabalhar. Em agosto, eles eram 5,9 milhões. Ante igual período de 2019, o número cresceu em 1,1 milhão, um avanço de 24,2%.
Adriana Beringuy, analista da Pnad Contínua, pesquisa do IBGE que calcula os números do emprego no país, disse que a Covid-19, além de tirar o emprego de muita gente, também impossibilitou que essas pessoas buscassem ocupação.
"Isso pelas medidas restritivas, porque as atividades econômicas estavam suspensas ou, ainda, por saúde pessoal", diz.
Segurando a bandeira de um candidato a vereador em no bairro da Liberdade, Agatha Cruz, 21, foi uma das que perderam o emprego de recepcionista na pandemia.
O trabalho de cabo-eleitoral foi o que surgiu. Mesmo com as jornadas longas, que incluem alguns atos de campanha que acontecem à noite, afirma que o esforço vale à pena.
Diz Agatha : "Estou me mantendo com esse dinheiro da campanha. Depois que a eleição passar, não sei que vai ser. Espero que as coisas melhorem".