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RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Documentos apreendidos no gabinete do prefeito Marcelo Crivella (Republicanos), candidato à reeleição, mostram que o loteamento de cargos em sua gestão atendeu até a vereadores dos partidos de Eduardo Paes (DEM) e Martha Rocha (PDT).
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A lista inclui também o vereador Major Elitusalem (PSC), um dos principais aliados de Carlos Bolsonaro (Republicanos) na Câmara Municipal. Os dois apoiam a reeleição de Crivella.
A apreensão foi feita em setembro durante o cumprimento de buscas feitas na Operação Hades, que apura um suposto esquema de propina na prefeitura com a participação de Crivella.
Alguns vereadores que aparecem nas anotações reconhecem parte das indicações ali descritas e afirmam se tratar de nomes técnicos para os cargos que ocupam. Outros, negam os vínculos com as pessoas nomeadas.
Os documentos manuscritos estavam escaneados e gravados num pen drive dentro do gabinete do prefeito na sede administrativa do município, no centro do Rio de Janeiro. As datas inscritas em alguns dos papéis indicam que as anotações foram feitas em junho deste ano.
Os arquivos mostram a redução do espaço de alguns vereadores na máquina da prefeitura. Em todos os casos, porém, eles mantiveram ainda controle sobre alguns cargos, mesmo com a proximidade da eleição e vinculados a outros candidatos.
É o caso, por exemplo, do vereador Thiago K. Ribeiro (DEM), que, de acordo com os papéis, tinha indicados na subprefeitura de Jacarepaguá, na Casa Civil, subsecretaria de Esporte e Lazer e na Secretaria de Urbanismo.
O aliado de Paes perdeu a maioria dos postos, mantendo seis na Casa Civil e quatro no Urbanismo, apontam as anotações.
O mesmo ocorreu com o vereador Rafael Aloisio Freitas (Cidadania), cuja anotação já destaca o vínculo com "Edu Paes". Ele perdeu o controle sobre a superintendência do Méier, e a administração regional de Vila Isabel. Manteve apenas os cargos na Secretaria de Envelhecimento Saudável.
O vereador Wellington Dias (PDT), do partido de Martha Rocha, perdeu a administração regional de Campo Grande, mantendo dois dos sete cargos que tinha na Casa Civil.
Major Elitusalem, por sua vez, manteve dois dos quatro cargos que tinha na Casa Civil, segundo as anotações.
Os documentos também descrevem as movimentações vinculadas aos vereadores João Ricardo (PSC), Célio Luparelli (DEM) e Italo Ciba (DEM).
A Coordenadoria de Investigações de Agentes com Foro da Polícia Civil interpretou os documentos como "orientações de cargos a serem mantidos e retirados" da estrutura da prefeitura.
A apreensão foi feita em meio à investigação de um esquema de pagamento de propina na prefeitura comandado pelo empresário Rafael Alves, amigo de Crivella. Trocas de mensagens indicaram, para o Ministério Público, que o prefeito tinha ciência das ilegalidades supostamente cometidas no município. O caso ainda está sob investigação e não há denúncia formalizada.
O loteamento dos cargos indicados nas anotações não tem, a princípio, relação com os fatos investigados.
Os documentos mostram, porém, uma prática comum ao longo dos quatro anos da gestão Crivella em que o prefeito não conseguiu formar uma base sólida na Câmara Municipal. Muitos vereadores ganhavam e perdiam cargos com frequência, e muitas vezes sequer era avisado da exoneração de seus indicados.
Dessa forma, de acordo com os documentos, mesmo vereadores que apoiariam adversários do prefeito mantiveram indicados na estrutura municipal. O objetivo seria manter uma relação amistosa mesmo com adversários.
Crivella está em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto empatado tecnicamente com Martha Rocha. A pesquisa Datafolha divulgada nesta quinta-feira (5) mostrou o prefeito com 15% da preferência do eleitorado, contra 13% da deputada do PDT.
O líder nas pesquisas é Paes, com 31% das intenções de voto segundo o Datafolha.
Em nota, a assessoria do prefeito afirmou que "não tem como saber se são verdadeiros os referidos documentos citados na demanda".
"Mas, mesmo que fossem, não há nenhuma ilegalidade em partidos políticos indicarem representantes para compor governos e auxiliarem na gestão, prática notória e sabida em todas as esferas de poder", declarou a prefeitura, em nota.
O vereador Thiago K. Ribeiro afirmou, por meio de sua assessoria, que não faz indicação direta para a gestão Crivella. Ele disse, porém, que conhece dezenas de servidores públicos desde a época da gestão Paes, a quem é ligado politicamente.
Wellington Dias (PDT) afirmou que indicou o administrador regional de Campo Grande por critérios técnicos. Disse que a pessoa não foi exonerada do cargo e que não trabalha para ele politicamente. Ele disse, porém, não ter cargos na Casa Civil, como indicam as anotações.
"Eu não sou base do prefeito. Tanto que votei a favor do impeachment dele", afirmou o vereador pedetista.
O vereador Major Elitusalem afirmou que apoia o governo Crivella, motivo pelo qual acredita que "pode participar, indicando pessoas qualificadas e comprometidas com o interesse público".
"Deixamos claro que nosso mandato está caminhando independente de indicações ou não, tendo em vista a não ingerência sobre esses cargos. Ressaltando aqui que votamos as questões referentes às CPIs do Executivo e nada mudou a relação ao governo Crivella", afirmou a assessoria do vereador do PSC.
O vereador João Ricardo (PSC) disse que de fato a pessoa que havia indicado para a administração regional de Santa Teresa foi exonerada em junho. Ele nega, porém, ter vínculos com nomeados na Casa Civil e diz não ter influência na escolha do administrador regional de Paquetá. "Todas as indicações que fiz foram técnicas", afirmou ele.
Célio Luparelli negou ter indicado nomes para ocupar cargos no Executivo.
Italo Ciba, por sua vez, confirmou que a pessoa que havia indicado para a subprefeitura de Magalhães Bastos perdeu o cargo, e que ainda mantém um aliado na Casa Civil, como indicam as anotações.
A reportagem não conseguiu contato com o gabinete Rafael Aloisio Freitas.