© null
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Uma das estratégias da candidatura de Guilherme Boulos (PSOL) pega carona em tema que ganhou protagonismo político nos últimos anos e no qual ele próprio teve posições duras, embora nem sempre lineares.
PUB
Boulos resolveu adotar o discurso do combate à corrupção em sua campanha à Prefeitura de São Paulo –assunto discretamente debatido na eleição deste ano.
Em entrevistas e debates, o psolista tem dito que sua gestão vai acabar com "esquemas" no município, em áreas como habitação e ônibus, e que essa será uma forma de financiar suas novas ações na área social da cidade.
"Se o dinheiro público não vai para os esquemas, se não vai para a máfia do transporte, máfia de empresa de lixo, se não vai para empreiteira, sobra para fazer política social", disse, em entrevista em outubro.
Esse tipo de afirmação vem sendo usado para rebater argumentos de que, caso eleito, não encontrará recursos disponíveis para concretizar suas promessas.
Boulos foi ao longo dos últimos anos um dos mais ferrenhos oponentes da Operação Lava Jato, principal investigação da história do país, que prendeu um de seus principais aliados, o ex-presidente Lula, condenado duas vezes por corrupção em Curitiba e réu em outras seis ações penais pelo país.
O hoje candidato do PSOL, em seu programa de governo registrado na Justiça Eleitoral, diz logo no início que um primeiro passo é o compromisso "de quebrar os velhos esquemas –como na saúde, nos transportes, na educação e na segurança".
Como medidas nessa seara, lista, entre outras, criar um "Diário Cidadão" para melhor compreensão do Diário Oficial e auditar e publicizar "contratos de terceirização com sanções e ressarcimentos por improbidade e corrupção".
Boulos tem mencionado que sua vice, Luiza Erundina, enfrentou "máfias" quando foi prefeita (de 1989 a 1993) e que isso permitiu que a prefeitura tocasse mais obras e projetos públicos.
"Não aceito que SP tenha um orçamento de 70 bilhões de reais e grande parte desse orçamento esteja indo pra esquema, pra corrupção", escreveu em rede social, no início do mês.
As declarações dele acerca do assunto trazem crítica implícita ao PSDB do prefeito Bruno Covas, com quem disputa o segundo turno.
Frente ao desgaste dos tucanos, alvejados por investigações contra suas lideranças e processos na Justiça, o prefeito tem evitado mencionar seu partido ou exibir a marca do PSDB em seus materiais de campanha.
Mesmo sendo crítico com os métodos das equipes de Curitiba e do então juiz Sergio Moro, Boulos não deixou de atacar seus adversários políticos quando os desdobramentos das investigações os atingiam.
Em 2018, ele liderou protestos contra a prisão de Lula, em decorrência de condenação na Lava Jato, e acabou alvo de denúncia do Ministério Público Federal depois que sem-teto invadiram o tríplex de Guarujá (SP) atribuído ao petista.
Já chamou as autoridades da Lava Jato de "organização criminosa" e o procurador Deltan Dallagnol de "mercador da Justiça" e "moralista sem moral".
Na época do auge da operação, ajudou a promover mobilizações pela saída do então presidente Michel Temer (MDB), principal envolvido na delação do frigorífico JBS, em 2017.
"A mala com os R$ 500 mil apareceu. O que falta para Temer cair?", escreveu à época.
A delação da empreiteira Odebrecht também serviu de munição contra um dos expoentes tucanos do período. "Aloysio Nunes, que fez discursos inflamados contra a corrupção para golpear Dilma, é denunciado por receber R$ 500 mil ilegais da Odebrecht."
Em julho deste ano, Boulos disse: "Alckmin é denunciado por corrupção, lavagem de dinheiro e caixa 2. PF diz que Serra e plano de saúde estão no 'topo de cadeia criminosa'. Esse é o legado de 20 anos dos tucanos em SP?"
Antes da campanha, o candidato do PSOL também questionou a maneira como o presidente Jair Bolsonaro se aproveitou do discurso do combate à corrupção na disputa presidencial de 2018, na qual também concorreu.
Afirmou que Bolsonaro elaborou "uma tática eleitoral" e que se criou uma "mistificação" de que iria combater os desvios. Com as acusações contra o governo surgindo, disse que há discurso hipócrita sobre o assunto "desde Carlos Lacerda" (jornalista e ex-governador morto em 1977).
Tema recorrente nas eleições do país desde 2014, a Lava Jato foi deixada de lado na eleição municipal deste ano. A investigação sofreu um abalo em sua credibilidade em 2019 com a divulgação de mensagens de aplicativo que mostravam cooperação entre o então juiz Moro e procuradores.
Em São Paulo, quem mais citou a operação neste pleito foi a candidata do PSL, Joice Hasselmann, que ficou apenas em sétimo lugar.
Na sexta-feira (20), o assunto foi abordado por Bruno Covas, que falou na ideia de Joice, agora sua aliada no segundo turno, de fazer uma "Lava Jato municipal", inspecionando contratos municipais.
Combater corrupção é pré-requisito, diz candidato do PSOLoutro lado
A reportagem questionou Guilherme Boulos a respeito do teor de suas declarações sobre esquemas no município.
O candidato, por meio de sua assessoria, disse, sem especificar, que grandes empresários financiam legal e ilegalmente candidaturas para, em troca, manter privilégios.
Afirma que esse tipo de grupo, "como toda a corrupção, opera no subsolo" e que vai combatê-los caso seja eleito.
A respeito de seu histórico de críticas às investigações que atingiram aliados petistas, Boulos disse que o combate à corrupção é pré-requisito para qualquer governante digno do cargo.
"O que denunciamos ao longo de todos esses anos foi a instrumentalização do combate à corrupção em benefício de um grupo politico –que, a partir dessa mesma instrumentalização, assumiu o poder na pessoa de Jair Bolsonaro."
Também disse que apontou contradições causadas pelas medidas de autoridades da operação iniciada no Paraná. "A Operação Lava Jato não pode atuar de forma diferente dependendo do investigado. Defendemos que a Justiça atue de forma imparcial e não partidarizada."