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BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Ameaçado de perder o cargo, o ministro Ernesto Araújo desencadeou nesta quinta-feira (25) uma operação para tentar se manter no Itamaraty, enquanto assessores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já consideram inevitável a demissão do chanceler.
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De acordo com interlocutores, Bolsonaro entendeu que será difícil manter Ernesto na Esplanada -embora só queira realizar a troca após ter encontrado um substituto.Auxiliares começaram a discutir nomes para a troca.
Um dos cotados é o embaixador do Brasil em Paris, Luís Fernando Serra, que tem forte atuação rebatendo críticas da imprensa francesa ao governo Bolsonaro.
Também foi ventilado o nome do senador e ex-presidente Fernando Collor (PROS-AL), mas aliados de Bolsonaro opinam que, nesse caso, o mandatário perderia influência sobre a chancelaria.
O mesmo obstáculo é apontado para o nome do também ex-presidente Michel Temer (MDB), que entrou na bolsa de apostas em ocasiões anteriores.
Segundo auxiliares, a situação de Ernesto ficou insustentável após a formação de uma ampla coalizão para rifá-lo do governo, capitaneada pelas cúpulas do Congresso Nacional e formada por militares, lideranças do agronegócio, parlamentares do centrão e grandes empresários.
A participação do chanceler numa sessão do Senado na quarta (24), em que diversos parlamentares pediram publicamente sua renúncia, foi entendida pelo Planalto como o recado de que não há mais interlocução do Legislativo com o ministro.
Também na quarta, Ernesto foi cobrado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), por uma mudança de rumos na diplomacia brasileira.
Ernesto, no entanto, ainda conta com o apoio do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente que trabalha para manter sua influência no Itamaraty.
Ciente da fritura, o chanceler pediu na manhã desta quinta uma reunião com Lira. Na residência oficial da presidência da Câmara, em Brasília, tentou se justificar e apresentou dados para argumentar que não foi omisso na crise da pandemia.
No encontro, o ministro prestou contas do que foi feito até o momento pelo Itamaraty no combate à Covid-19, enquanto Lira, segundo aliados do deputado, reforçou cobrança feita nesta quarta: é preciso uma melhora na diplomacia, com mais diálogo com países como Estados Unidos e China.
Em encontro convocado por Jair Bolsonaro no Palácio do Alvorada com as cúpulas do Legislativo e do Judiciário, o presidente da Câmara e governadores fizeram críticas à atuação do chanceler na crise sanitária. Os líderes estaduais, por exemplo, pediram cobranças à OMS (Organização Mundial da Saúde) em relação ao monopólio de laboratórios na produção de imunizantes.
De acordo com pessoas próximas, Lira não mudou de opinião e continua achando que o chanceler deve renunciar ou ser demitido.
A equipe de Ernesto também tentou contatar parlamentares para oferecer explicações sobre o enfrentamento da crise sanitária, sem maiores resultados.
Lira e Pacheco assumiram a articulação pela derrubada de Ernesto após uma reunião com grandes empresários em São Paulo, em 22 de março.
Os presentes se queixaram que o Itamaraty falhou nas negociações para a obtenção de vacinas, insumos e medicamentos, o que contribuiu para o cenário de calamidade vivido hoje pelo país.
O Brasil tem registrado subsequentes recordes de mortes pela Covid-19 –nesta quarta, o país ultrapassou a marca de 300 mil óbitos pela Covid-19, apenas dois meses e meio depois de cruzar a linha das 200 mil mortes.
Enquanto isso, o ritmo de vacinação é insuficiente para fazer frente aos meses mais duros da epidemia.
Não por acaso, as críticas por uma suposta omissão de Ernesto nas negociações de vacina ocuparam grande parte da sessão do Senado em que o chanceler foi fustigado por parlamentares.
Expoente da ala ideológica e aliado de Ernesto, Martins foi flagrado pelas câmeras do Senado fazendo um gesto com as mãos às costas do presidente da casa, Rodrigo Pacheco.
Senadores presentes consideraram o ato obsceno. Além do mais, a forma como Martins realizou o gesto –juntando o polegar ao indicador e mantendo os demais dedos esticados– é associada a movimentos de supremacia branca.
O assessor nega qualquer conotação racial e afirma que estava arrumando a lapela.
A cena foi avaliada como inaceitável por Pacheco, que cobrou a demissão de Martins. Bolsonaro deve atendê-lo e reacomodar Martins em alguma assessoria na Esplanada.
"Não podemos ter pré-julgamentos em relação ao fato, mas, verdadeiramente, vendo as imagens, nós identificamos um gesto completamente inapropriado para o ambiente do Senado", disse Pacheco.
"Queremos aqui, uma vez mais, repudiar todo e qualquer ato que envolva racismo ou discriminação de qualquer natureza, repudiar qualquer tipo de ato obsceno também, caso tenha sido essa a conotação, no Senado ou fora dele. E Senado não é lugar de brincadeira. Senado é lugar de trabalho", disse Pacheco.