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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A China fez nesta sexta-feira (26) a maior incursão com aeronaves militares contra o território de Taiwan, a ilha autônoma que Pequim considera uma província rebelde. Foram enviados 20 aviões para o setor sudoeste da chamada Adiz (sigla inglesa para Zona de Identificação de Defesa Aérea) da ilha, que começa na metade da distância entre os dois países, sobre o estreito de Taiwan.
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Entre eles, 4 bombardeiros com capacidade nuclear H-6K e 10 caças pesados J-16. Antes, a maior ação do tipo ocorrera em setembro do ano passado, com 18 aviões.
Os taiwaneses haviam suspendido nesta semana seus voos de defesa devido a um choque que derrubou dois caças F-5E. Assim, aviões foram despachados em regime de urgência para afastar a frota chinesa, e baterias de mísseis antiaéreos colocaram os aviões adversários na mira.
Os detalhes foram dados pelo Ministério da Defesa de Taiwan, enquanto as autoridades chinesas não fizeram comentários, como é usual.
Esse tipo de incursão visa testar a capacidade de reação de rivais e ocorre quase todos os dias em diversos teatros de operação mundo afora -notadamente, no Pacífico e nos mares Báltico e Negro.
Mas o tamanho da ação chinesa parece relacionado a outro fato: na manhã da sexta, Taiwan e EUA assinaram o primeiro acordo de cooperação desde que Joe Biden assumiu a Presidência, em janeiro.
Pelo acordo, foi estabelecido um grupo de trabalho conjunto para coordenar as ações da Guarda Costeira taiwanesa. O arranjo veio após a China aprovar uma lei segundo a qual sua força litorânea é autorizada a atirar em qualquer navio estrangeiro que considerar suspeito.
Segundo Taipé, alguns dos aviões voaram em direção ao canal de Bashi, que separa a ilha das Filipinas, onde a Marinha chinesa faz um exercício aeronaval de interdição de área contra navios adversários.
A tensão entre China e Taiwan não tem nada de recente, sendo originária da vitória dos comunistas na revolução que fundou a ditadura moderna do continente, em 1949. Parte dos derrotados se refugiou na ilha, que teve governos autoritários por décadas, mas hoje é uma democracia.
Hoje, é um ponto central da disputa hegemônica entre Washington e Pequim.
Quase nenhum país reconhece Taiwan como independente para não melindrar a China, que considera o território seu. Os EUA mantêm um acerto heterodoxo: desde que reconheceram Pequim em 1979, dão teoricamente suporte à demanda chinesa. Mas na prática, e por lei, comprometem-se a defender Taiwan em caso de invasão e são os principais fornecedores de equipamentos militares do governo da ilha.
Nos anos de Donald Trump no poder, entre 2017 e 2021, a relação política foi estreitada. Além das usuais vendas de armas, Washington passou a enviar altos funcionários para visitar Taipé, algo que gerou duras reações de Pequim –inclusive a incursão de setembro de 2020.
Biden, desde que assumiu, manteve os princípios da Guerra Fria 2.0 de Trump com a China. Americanos e chineses até fizeram uma reunião de cúpula diplomática na semana passada, mas o tom foi áspero e pouco construtivo. Um dos itens que a China coloca como inegociáveis é sua integridade territorial, e isso inclui na visão de Pequim tanto o território semiautônomo de Hong Kong, objeto de dura repressão de seus movimentos pró-democracia, quanto Taiwan.
As Forças Armadas chinesas disseram, no começo do ano, que uma declaração de independência da ilha geraria uma guerra. Analistas militares têm dúvidas sobre a exequibilidade de uma operação anfíbia para tomar Taiwan, dado o grau de defesas da ilha e, principalmente, o risco de ver os EUA envolvidos. Mas o perigo de algum fio desencapado causar curto-circuito segue em alta, como provam as ações desta sexta.