Veja como países europeus estão usando a vacina de Oxford

Já foram aplicados pelo menos 20 milhões de doses da AstraZeneca no Reino Unido e União Europeia, e mais de 27 milhões na Índia da Covishield

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Mundo VACINA-OXFORD/ASTRAZENECA 09/04/21 POR Folhapress

BRUXELAS, BÉLGICA (FOLHAPRESS) - Um dia depois de a agência regulatória da União Europeia (EMA) ter concluído que a vacina de Oxford/AstraZeneca deve ser usada por todos os adultos porque seus benefícios superam os riscos (incluindo o de casos raros de acidente vascular), ao menos 11 de seus 27 membros mantiveram ou criaram regras que restringem seu uso.

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Nesta quinta (8), a Comissão Europeia pediu aos ministros de Saúde do bloco que tentem chegar a uma política de vacinação coordenada. "É essencial que sigamos uma abordagem baseada em ciência, que não confunda os cidadãos nem alimente a hesitação em se vacinar", defendeu a comissária de Saúde da UE, Stella Kyriakides.

As diferenças por si só não são consideradas um problema de saúde pública pela EMA. Segundo sua diretora-geral, Emer Cooke, a tarefa da agência regulatória é avaliar a segurança e a eficácia do produto com base em dados científicos e concluir se seus benefícios superam seus riscos, de forma geral.

Cabe a cada governo, porém, decidir qual a melhor estratégia em seu país, já que isso depende de vários fatores. "A forma como as vacinas são usadas e distribuídas por diferentes Estados-membros é afetada pela disponibilidade de vacinas, pelas taxas de infecção locais, pela capacidade do hospital, por quem já foi vacinado", disse Peter Arlett, chefe da força-tarefa de análise e métodos de dados da EMA.

Em tese, na avaliação da agência, não há motivo para deixar de usar a AstraZeneca em qualquer faixa etária. O grupo de especialistas independentes não encontrou evidências de que idade, sexo ou condições clínicas sejam fatores de risco específicos para os acidentes vasculares graves.

Como a Covid-19 provoca mortes e outras sequelas graves em números muito superiores aos desses eventos raros -em todas as faixas etárias-, sempre vale mais a pena proteger as pessoas contra o coronavírus, dizem os especialistas.

O cálculo não vale apenas para a população como um todo, mas para o próprio indivíduo, já que, segundo os cientistas, o risco de pegar Covid-19 também supera em muito o dos acidentes vasculares graves.

"Se um estádio lotado de pessoas de 20 anos fosse vacinado com a AstraZeneca, provavelmente só uma desenvolveria os coágulos raros", afirmou David Spiegelhalter, presidente do Centro Winton para Comunicação de Provas e Riscos da Universidade de Cambridge. Em entrevista à rádio BBC, ele acrescentou que manter a imunização dos mais jovens também protege suas famílias, amigos e vizinhos.

Sob esse raciocínio, um governo não deve restringir o uso da AstraZeneca se isso reduzir seu ritmo de vacinação. Foi o que aconteceu por exemplo na Dinamarca, que era a líder do bloco em porcentagem de doses aplicadas até suspender o uso do imunizante, no mês passado. Sem retomá-lo até agora, o país caiu para a décima posição.

Por outro lado, governos que tiverem uma quantidade suficiente de produtos de outros fabricantes para suprir seus centros de imunização podem destinar determinadas marcas para grupos diferentes, sem impacto.

Até esta quarta (7), 10 dos 27 membros da UE recomendavam que a AstraZeneca fosse aplicada apenas em pessoas mais velhas, embora a faixa etária definida varie. As restrições são menores na França e na Bélgica (onde ela está sendo dada a quem tem no mínimo 55 ou 56 anos, respectivamente) e maiores na Finlândia e na Suécia (que só a aplicam nos que já completaram 65 anos).

Itália e Reino Unido (que não faz parte da UE) adotaram uma abordagem intermediária: não proibiram o uso da AstraZeneca, mas recomendaram que outra marca seja usada nos menores de 60 anos (na Itália) ou de 30 anos (para britânicos), quando for possível.

A capacidade de tranquilizar a população apesar de notícias contraditórias e desinformação também tem impacto no desempenho dos países. Portugal e República Tcheca são exemplos de locais em que a população não vem se recusando a receber a AstraZeneca, enquanto na Grécia houve uma corrida para desmarcar agendamentos ou tentar mudar a marca do imunizante.

Recusa semelhante foi vista na França, um dos países que historicamente registra a maior taxa de ceticismo em relação às vacinas. Segundo a imprensa francesa, na primeira semana de abril 30% dos agendamentos de imunização com a AstraZeneca foram cancelados.

Uma questão ainda não respondida pelos cientistas e autoridades de saúde, no caso dos países que adotaram restrições ou nos quais os habitantes estão inseguros, é o que fazer com quem já tomou a primeira dose de AstraZeneca.

A Alemanha recomendou que os que têm 60 anos ou mais completem sua proteção com uma dose de outro imunizante, enquanto o Reino Unido recomendou que isso só seja feito em quem desenvolveu problema vascular após a primeira dose.

A França estuda a possibilidade de usar vacinas da Pfizer/BioNTech ou Moderna na segunda dose, mas ainda não houve conclusão definitiva. Na Espanha, discute-se também a possibilidade de deixar os mais jovens com apenas uma dose de vacina.

"Nenhum país europeu ainda tem uma resposta para isso", disse o ministro de Saúde da Bélgica, Frank Vandenbroucke, que também estuda a questão. Na quarta, os técnicos da EMA afirmaram que não há evidências suficientes sobre a segurança e a eficácia de tomar doses de vacinas diferentes.

"Esta tem que ser uma decisão técnica, não uma decisão política", afirmou a ministra da Saúde de Portugal, Marta Temido, que coordenou a reunião de ministros na quarta. Os membros do bloco, porém, não chegaram a uma abordagem comum.

A vacina da AstraZeneca também faz parte do programa do governo federal brasileiro e, segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), passará a incluir em sua bula uma advertência sobre possíveis casos muito raros de formação de coágulos sanguíneos que podem estar associados a seu uso.

A agência brasileira manteve a recomendação do imunizante sem restrições de idade, "uma vez que, até o momento, os benefícios superam os riscos". Dentre 4 milhões de doses aplicadas da vacina de Oxford no país, foram registrados até o momento 47 casos suspeitos de eventos adversos tromboembólicos, sendo apenas um associado à trombocitopenia (diminuição do número de plaquetas, que são fragmentos de células que ajudam a coagular o sangue).

Não há comprovação, segundo a Anvisa, de que esses casos tenham relação com o uso da vacina. "Também não foram identificados fatores de risco específicos para a ocorrência do evento adverso", informa.

ENTENDA O CASO

Por que o regulador europeu faz novas investigações sobre a vacina de Oxford/AstraZeneca?

Porque países relataram a ocorrência de coágulos sanguíneos em pessoas nos quais o imunizante foi aplicado.

Quais foram os problemas relatados?

Os mais preocupantes foram casos raros de coágulos nos vasos que drenam o sangue do cérebro -chamados de CVST- e quadros graves e mais raros de coágulos associados a níveis baixos de plaquetas sanguíneas (elementos no sangue que ajudam a coagular), conhecidos como DIC.

Com que frequência aconteceram esses problemas?

No Reino Unido foram identificados 79 casos de coágulos sanguíneos raros entre mais de 21 milhões de doses da AstraZeneca; 19 vacinados morreram. Isso corresponde a 3,8 casos e 0,9 morte a cada 1 milhão de vacinados.

A EMA recebeu até 22 de março 62 relatos de tromboses venosas no seio cavernoso cerebral (CVST) e 24 casos de trombose venosa esplâncnica (que envolve veias abdominais), dos quais 18 resultaram em morte, considerando um total de 25 milhões de vacinados. Isso corresponde a 3 casos e 0,72 morte por 1 milhão de vacinados.

Houve tromboses raras também em pessoas que receberam outras vacinas?

Sim. Até esta quarta, a EMA registrou 3 casos entre 4,5 milhões de doses administradas da Janssen, 35 casos em 54 milhões de doses da Pfizer/BioNtech e 5 casos em 4 milhões de doses da vacina da Moderna.

Quais as conclusões da análise?

O comitê de segurança concluiu que:

os benefícios da vacina no combate à Covid-19 (que por si só resulta em problemas de coagulação e pode ser fatal) superam o risco de efeitos colaterais;

acidentes vasculares graves raros são efeitos colaterais possíveis do imunizante

não há evidência de um problema relacionado a lotes específicos da vacina ou a locais de fabricação específicos;

não foi possível identificar fatores de risco específicos ou explicar como se daria o efeito

Por que se diz que os casos são raros?

Os episódios relatados até agora aconteceram em proporções menores que os normalmente desencadeados por outros medicamentos, como, por exemplo, a pílula contraceptiva.

Segundo o chefe do Departamento de Farmacovigilância e Epidemiologia da EMA, Peter Arlett, "se foram dados contraceptivos hormonais combinados durante um ano a 10 mil mulheres, haverá uma formação de coágulos sanguíneos em excesso nesse ano".

Como as conclusões afetam a vacinação?

A EMA recomenda que a vacinação prossiga normalmente, já que os riscos são raros e os benefícios são comprovados. Mas continuará analisando possíveis riscos e fez alertas de cuidado para pacientes e equipes de saúde

Que alertas foram feitos aos pacientes?

Devem procurar assistência médica imediata e mencionar sua imunização recente se tiverem qualquer um destes sintomas após receber a vacina:

falta de ar,

dor no peito ou estômago,

inchaço ou frio em um braço ou perna,

dor de cabeça grave ou piorando ou visão turva após a vacinação

sangramento persistente,

vários pequenos hematomas, manchas avermelhadas ou arroxeadas ou bolhas de sangue sob a pele

Quem recebeu a primeira dose da AstraZeneca deve tomar a segunda?

A agência reguladora do Reino Unido recomenda que sim, a não ser que a pessoa tenha experimentado qualquer problema relacionado à circulação venosa. Outros países têm considerado trocar o produto na segunda dose ou aplicar apenas uma dose nos mais velhos.

Mas, afinal, a vacina da AstraZeneca é segura?

Sim, de acordo com os parâmetros de segurança usados pelos reguladores.

Não existe medicamento 100% seguro e efeitos colaterais adversos podem ocorrer em escala diminuta com qualquer produto farmacêutico.

No Brasil, a ocorrência de efeitos adversos graves nos vacinados corresponde a 0,007%, segundo dados do Ministério da Saúde divulgados em março, considerando ainda as duas vacinas aplicadas, a Coronavac e a Oxford/AstraZeneca.

Que efeitos colaterais têm sido reportados no Brasil?

Dentre 4 milhões de doses aplicadas da vacina de Oxford por aqui, foram registrados até o momento 47 casos suspeitos de eventos adversos tromboembólicos, sendo apenas um associado à trombocitopenia (diminuição do número de plaquetas, que são fragmentos de células que ajudam a coagular o sangue).

Por que os reguladores insistem que os benefícios superam os riscos?

Ensaios clínicos feitos no ano passado mostraram que a vacina da AstraZeneca tinha eficácia de 70% em indivíduos com menos de 55 anos. O imunizante apresentou uma boa resposta imune, inclusive celular, era seguro e induzia resposta imune em todas as faixas etárias.

No mês passado, a farmacêutica divulgou uma nova taxa de eficácia de 76%, a partir de estudos feitos nos EUA, Peru e Chile, com proteção de de 100% nos casos graves e internações.

Os resultados preliminares indicaram uma proteção acima de 80% contra casos sintomáticos da Covid-19 em pessoas com mais de 65 anos --idosos são os mais suscetíveis a complicações sérias e óbitos.

Ao evitar que pessoas adoeçam gravemente e morram, a vacina salva vidas em um número muitas vezes superior às que podem eventualmente ser perdidas se for identificada uma relação direta entre o imunizante e os casos raros de acidente vascular, dizem os reguladores.

Quais países já autorizaram o uso da vacina?

A vacina da Oxford recebeu, em dezembro de 2020, autorização para uso emergencial no Reino Unido e, em janeiro, a Anvisa aprovou o uso do imunizante no Brasil. Alguns dias depois, a agência regulatória europeia também aprovou seu uso emergencial na União Europeia.

A Índia aprovou o uso da Covishield, vacina da AstraZeneca e do Instituto Serum indiano, no início do ano. África do Sul, Canadá, e a própria OMS também aprovaram a vacina da Oxford. A FDA, agência regulatória norte-americana, deve concluir a análise dos dados dos testes e aprovar o uso emergencial do imunizante no país nas próximas semanas.

E como a vacina se comporta contra as novas variantes?

Com os novos estudos reconduzidos pela Oxford/AstraZeneca no Reino Unido e na África do Sul, a vacina se mostrou eficaz contra a variante do Reino Unido (a B.1.1.7), mas, na África do Sul, um ensaio clínico com poucos participantes, a maioria infectado com a variante sul-africana B.1.351, mostrou que a vacina não teve eficácia contra a nova cepa.

Dados ainda preliminares de um estudo feito pela Fiocruz em laboratório com soros de indivíduos vacinados mostram que há potencial da vacina de proteção contra a variante P.1, mas ainda é preciso fazer testes na população.

Qual a relevância da vacina da AstraZeneca para a imunização em todo o mundo?

O produto continua sendo a melhor opção para países de baixa e média renda, por dois motivos principais: seu baixo custo (preço unitário da dose entre US$ 3 e US$ 4, cerca de R$ 17 a R$ 23, bem menos do que o preço de US$ 20 da Pfizer ou US$ 37 da Moderna, ou R$ 112 e R$ 214, respectivamente) e o seu armazenamento a temperaturas de 2? a 8?C, de refrigerador comum.

Já foram aplicados pelo menos 20 milhões de doses da AstraZeneca no Reino Unido e União Europeia, e mais de 27 milhões na Índia da Covishield.

No Brasil, o governo federal prevê a entrega de 100,4 milhões de doses da vacina até o final do primeiro semestre e mais 100 milhões até o final do ano.

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