© Com Paes à frente, Crivella, Martha Rocha e Benedita disputam 2º lugar no Rio, diz Datafolha
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Completando seu primeiro ano à frente da Prefeitura do Rio de Janeiro pela terceira vez, Eduardo Paes (PSD) admite que a conservação da cidade "vai muito mal" e que ainda não conseguiu avançar do jeito que gostaria nas áreas de saúde, transporte e emprego.
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Em entrevista concedida no último dia 22, ele justificou afirmando que o foco foi a gestão da pandemia de Covid-19 e o reequilíbrio das finanças, além de insistir que o legado que deixou nos outros dois mandatos foi destruído pelo seu antecessor, Marcelo Crivella (Republicanos).
Paes também defendeu sua decisão de desobrigar as máscaras ao ar livre e disse desconhecer a relação disso com a epidemia de influenza.
O prefeito reafirmou que não deixará a prefeitura para concorrer novamente ao governo do estado em 2022 e condenou a "falta de compreensão federativa" de Jair Bolsonaro (PL), dizendo que não tem motivo para ir a Brasília.
PERGUNTA - Quais os principais feitos da sua gestão neste ano?
EDUARDO PAES - Eu destacaria primeiro a questão das finanças, básica para qualquer administração. A gente conseguiu colocar as contas no azul. Tínhamos o desafio de pagar 15 salários neste ano, duas folhas de salário atrasadas do governo Crivella, e conseguimos avançar. Depois, tivemos o enorme desafio, que de certa maneira ainda não se foi, que foi a pandemia. Vacinar o maior número de pessoas e evitar o maior número de mortes possível. Acho que fomos muito bem. Tem também o desafio de retomar a qualidade dos serviços prestados na cidade: a partir do momento em que as contas começaram a melhorar, no fim do primeiro semestre, veio uma melhora gradual. Ainda não é aquilo que eu imagino como adequado, longe do ideal. Mas a gente hoje está preparado para olhar para o futuro de novo.
O que o senhor queria ter feito em 2021, mas não fez?
EP - Três coisas me angustiam muito, duas mais ligadas à prefeitura. Primeiro, a melhoria da rede de saúde pública, que foi destruída ao longo dos últimos quatro anos. Segundo, os transportes. Tivemos alguns avanços no BRT [corredor exclusivo de ônibus], mas tem uma crise muito profunda, não tem uma solução rápida. E a questão do emprego. Você vê a quantidade de pessoas desempregadas, o aumento da desigualdade, é angustiante. É fácil resolver isso em um ano? Não, mas a gente sempre quer resolver tudo logo. Às vezes fala-se: a conservação da cidade não está boa, o asfalto está esburacado, mas a gente vive com isso. Mas a gente não vive sem saúde, transporte de qualidade, emprego.
O senhor desobrigou o uso de máscaras em lugares abertos em outubro e, duas semanas depois, o Rio encabeçou uma epidemia de gripe no país. Foi precipitado?
EP - Não. Foi uma decisão do comitê científico, e nós continuamos com um número baixíssimo de transmissão da Covid, então mostrou que a decisão foi acertada. Por eles, eu até já teria retirado também em locais fechados, mas decidi não retirar. Se a gente tiver elementos que tragam necessidade, voltamos a usar. Sobre a gripe, tem que perguntar para os especialistas de saúde, é a primeira vez que ouço essa vinculação da influenza com a retirada de máscaras. São Paulo está com as máscaras e a influenza agora está apertando forte lá.
A falta de equipes na rede básica de saúde e UPAs é uma das principais queixas à sua gestão. Por que ainda não foi resolvido?
EP - Eu disse aqui: uma das minhas maiores frustrações foi não ter recuperado a saúde do jeito que ela mereceria. Nas equipes de atenção básica, eu saí de 3,5% de cobertura para 70% nos meus oito anos de mandato. Deixamos uma estrutura fantástica na cidade, mas jogaram [a gestão anterior] para 40% de cobertura de saúde da família. É um dos meus grandes objetivos. Só que isso foi consumido esse ano pela pandemia. Então o orçamento da Saúde vai aumentar muito [em 2022], e a gente vai reiniciar o processo de recuperação e recontratação. Mas é uma das minhas frustrações. É triste eu dizer isso, mas você volta quatro anos depois e a sua meta no fim do governo é chegar àquilo que você deixou.
A conservação da cidade, outro foco seu, é algo que o carioca ainda não viu na prática. Como o senhor avalia o último ano?
EP - Acho que ela vai muito mal. Agora a gente começa. Nos últimos dois meses, comecei a liberar recursos. Por exemplo, umas placas brancas que alguns túneis têm, a gente recuperou todas, um negócio horroroso. Mas foi muito abandono durante muito tempo. Isso vai caminhar agora bem, o orçamento da Secretaria de Conservação é infinitamente maior [em 2022], vamos voltar com o [programa] Asfalto Liso, a Comlurb está com mais musculatura. Estamos precisando quase que reconstruir. Não há cidade que resista a quatro anos de abandono e falta de investimento.
O senhor já admitiu que há muita população de rua e desorganização no comércio ambulante. Como pretende reduzi-los?
EP - Esse problema tem relação direta com a desgraça social no Brasil: aumento de fome, miséria, desemprego. Sobre a população de rua, estamos buscando ampliar vagas em abrigos, dar mais atenção a isso e ser um pouco mais rigorosos com a instalação de barracas nas ruas, oferecendo alternativas. Sobre o comércio ambulante, a gente está fazendo o programa Ambulante Harmonia, que é organizar, limitar espaços, definir claramente que tipo de barraca pode usar. Não é o momento, com tanto desemprego, tanta fome, tanta miséria, de ser muito duro nisso, então a gente vem fazendo com calma, bairro por bairro, e mesmo assim de vez em quando ainda acontecem alguns conflitos, então é algo que estou tomando muito cuidado.
Sua gestão até agora teve um foco no BRT, mas o sistema de ônibus segue sucateado. Ele será prioridade?
EP - A questão dos transportes é a mais complexa de resolver. Porque ela não é só financeira, tem uma crise institucional, reputacional, desequilíbrio econômico, um conjunto de coisas. Então temos que fazer uma mudança no sistema, passar a fazer subsídio, estamos licitando a bilhetagem. Não vamos seguir o modelo de São Paulo, um convênio com uma associação de empresas. Vamos fazer uma coisa nova, totalmente independente. Vamos fazer subsídio por quilômetro rodado, não pelo número de passageiros. Vai exigir mudanças muito profundas que acho que dificilmente conseguimos resolver ainda neste ano. Vamos avançando aos poucos, mas vai demorar.
Atividades originalmente de milícias se expandiram para o tráfico, como a cobrança de transportes alternativos. Como a prefeitura tem lidado com a questão?
EP - Cada vez mais vem havendo uma ampliação dos braços da milícia em direção a atividades de tráfico e vice-versa. O que busco fazer no campo municipal é combater essa raiz econômica das atividades criminosas, como [remover] construções irregulares. Neste momento se tornou muito mais fácil fazer, porque setores progressistas da sociedade hoje entendem que você não está tirando casa de pobre, você está combatendo uma indústria criminosa. Isso não era assim no meu último governo. E no caso do transporte irregular é a mesma coisa, a gente vai combatendo, tentando organizar, fazendo licitação. O problema do transporte irregular era um que a gente já tinha resolvido.
Alguma chance de deixar a prefeitura para tentar novamente o governo do estado?
EP - Nenhuma. Sou o homem mais feliz do mundo sendo prefeito do Rio e cá ficarei. Meu candidato chama-se Felipe Santa Cruz. A gente precisa de um governador que tenha capacidade de articulação, o que ele tem, mas também uma coluna vertebral ereta, pronta para enfrentar os desafios principalmente na segurança pública. Que dialogue com o Judiciário, com o Ministério Público.
O senhor fez muitas críticas abertas a Bolsonaro no início do ano, mas agora parece ter amenizado o discurso. O que mudou?
EP - [Pausa] Achei que foi o contrário [risos]. Eu tenho uma relação institucional sempre. Sou prefeito, não opositor. Só que acho o governo Bolsonaro muito pouco institucional. E falo isso não por me sentir perseguido, mas porque vejo acontecer com todos os estados e cidades. A não ser com quem bate continência para ele. A falta de compreensão federativa desse governo é algo muito impressionante. Se você perguntar: qual é o programa do governo federal –que não sejam as transferências obrigatórias– que te leva a Brasília? Nenhum. Fui prefeito antes e toda hora tinha um lançamento, uma linha de financiamento. Agora não tem nada. É um governo que só olha para o próprio umbigo. [A última vez que conversei com o presidente] foi na semana seguinte da minha eleição. Ah, e ele gentilmente me ligou quando meu pai foi intubado com Covid.
RAIO-X
Eduardo Paes, 52, foi prefeito do Rio de Janeiro de 2009 a 2016 e voltou ao cargo em 2021. Foi secretário de Turismo, Esporte e Lazer do governo Sérgio Cabral (2007-2008), deputado federal (1999-2006), vereador (1997-1998) e subprefeito da zona oeste carioca (1993-1996). É formado em direito pela PUC-Rio.