© Suhyeon Choi / Unsplash
GUARULHOS, SP (FOLHAPRESS) - Maior festival do calendário da China, conhecido por levar à migração em massa e aquecer setores econômicos, o Ano-Novo chinês –ou Ano-Novo Lunar– teve início nesta terça (1º) em meio a um cenário ainda mais crítico em termos de crise sanitária do que o observado no país asiático no mesmo período do ano passado.
PUB
Afetada pela variante ômicron, a China assistiu à alta de casos diários de coronavírus em dezembro. As cifras começaram a cair na terceira semana de janeiro, mas voltaram a apresentar leve alta nos últimos dias. A média móvel de novos casos de Covid foi de 62 nesta segunda (31), um valor considerado baixo em países ocidentais, mas alto para os padrões chineses. Em 12 de fevereiro do ano passado, quando teve início a celebração daquele ano, a média móvel girava em torno de 10.
Somente a capital Pequim registrou 20 novas infecções da doença no último domingo (30), o maior número desde junho de 2020, de acordo com a Comissão Nacional de Saúde. O cenário se torna preocupante não apenas porque pode ser agravado pelas celebrações do Ano-Novo chinês, mas também porque os Jogos Olímpicos de Inverno, sediados em Pequim, têm início ainda nesta semana, na sexta (4).
A despeito de reiterados pedidos das autoridades para que os cidadãos permanecessem em casa durante o feriado, muitos chineses, há anos sem reencontrar suas famílias, pretendem viajar mesmo em meio ao cenário pandêmico. Somente até o fim da última semana, 260 milhões haviam viajado com esta finalidade –cifra menor que a observada antes da pandemia, mas um aumento de 46% em relação ao ano passado–, segundo dados oficiais publicados pela Associated Press.
O número deve crescer exponencialmente ao longo dos próximos 40 dias, período de férias na China, quando, historicamente, foram registrados volumes recordes de migração humana. O regime chinês prevê que, mesmo com a ômicron, um total de 1,2 bilhão de viagens seja realizado, aumento de 36% em relação ao ano anterior.
O volume de deslocamentos pode desafiar a estratégia de "Covid zero" que vem sendo adotada pelo regime de Xi Jinping, numa tentativa de eliminar a presença do vírus. Até meados de janeiro, pelo menos três importantes cidades do país estavam confinadas para conter surtos locais da doença, o que afetou cerca de 20 milhões de pessoas.
A expectativa é de que as consequências dos grandes deslocamentos possam ser mitigadas devido aos índices de vacinação. O país asiático tem cerca de 85% da população com o primeiro esquema vacinal completo (duas doses), e 22,9% já receberam a terceira dose, mostram informações compiladas pela plataforma Our World in Data.
Projeta-se que as viagens acarretadas pelo feriado e as celebrações ajudem a reaquecer setores como turismo, varejo e transporte, afetados durante a pandemia. No Ano-Novo Lunar do ano passado, os consumidores chineses gastaram cerca de 821 bilhões de yuans (R$ 681 bi) no varejo, aumento de 28,7% em relação ao feriado de 2020.
A economista-chefe da consultoria Greater China, Iris Pang, disse à agência de notícias Reuters esperar aumento de 10% nos gastos em relação ao ano passado. "Mesmo que as pessoas não possam viajar, elas ainda têm dinheiro para gastar, especialmente se não gastam com transporte. Algumas economizaram desde dezembro para o feriado."
Por outro lado, no setor hoteleiro, as expectativas parecem ter sido frustradas. Relatório recente da Trip.com, maior agência de viagens online da China, constatou que as reservas de quartos de hotel –cujos preços chegam a aumentar mais de dez vezes nesta época do ano– continuam muito longe do observado em 2019, segundo informações publicadas pelo jornal South China Morning Post.
"É uma tendência irreversível que mais cancelamentos ocorram devido ao aumento de infecções", diz o documento. Grandes hotéis chineses acumularam perda recorde de 41,4 bilhões de yuans (R$ 34,3 bi) em 2020, consequência substancial para o setor de turismo, que emprega cerca de 30 milhões de pessoas no país.
Em 2019, cerca de 415 milhões de chineses viajaram durante o feriado. O número caiu para quase zero em 2020, quando o surto inicial de coronavírus resultou em bloqueios rigorosos em todo o país. No ano passado, a indústria de viagens domésticas atendeu 256 milhões de turistas durante o feriado, ainda segundo informações do SCMP.
Outro fator de preocupação é o fato de muitas indústrias chinesas fecharem as portas ou, então, operarem com capacidade reduzida por semanas durante as celebrações, o que atinge em cheio varejistas e importadores que dependem de produtos do país.
Uma novidade deste Ano-Novo chinês diz respeito ao ambiente –mais especificamente à qualidade do ar. Tradicionalmente, os chineses celebram a véspera do feriado acendendo fogos de artifício, mas, neste ano, a capital Pequim proibiu a atividade pela primeira vez. Não ficou claro se a proibição está relacionada aos Jogos de Inverno, mas as consequências puderam ser sentidas.
A concentração de material particulado (especificamente PM2,5) ficou em 5 microgramas por metro cúbico na noite desta segunda (manhã no horário de Brasília). Na véspera do Ano-Novo chinês de 2021, a média era de 289 microgramas por metro cúbico.
Durante discurso sobre o feriado feito no último fim de semana, o líder chinês, Xi Jinping, voltou a falar em bandeiras como a da união nacional e o legado do centenário Partido Comunista Chinês. "Não importa quais reviravoltas ou desafios possamos enfrentar, devemos levar adiante o grande espírito fundador do PC Chinês", disse, segundo relato da agência estatal Xinhua.
"Devemos ter uma perspectiva de longo prazo, estar preparados para os perigos potenciais mesmo em tempos de calma, manter uma forte unidade e trabalhar duro para continuar impulsionando a grande causa do rejuvenescimento nacional", seguiu Xi.