© Marcello Casal Jr. / Agência Brasil
Dois anos após o início da pandemia, medicamentos com eficácia comprovada contra a covid-19 não estão incorporados pelo Sistema Único Saúde (SUS). Em hospitais privados, alguns remédios aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para tratar a doença já são colocados à disposição dos pacientes. No caso das pílulas antivirais, como Molnupiravir e Paxlovid, ainda não houve aval para uso no Brasil. Aprovadas em outros países, elas podem fazer diferença quando ingeridas após os primeiros sintomas.
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Como um dos principais entraves está o preço dos tratamentos. Não há perspectiva de data para que esses remédios estejam disponíveis no SUS, uma vez que a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) não recomendou a incorporação.
Remédios como Sotrovimabe e Evusheld não estão disponíveis para comercialização no País ou não têm cobertura para o uso ambulatorial e domiciliar pela Agência Nacional de Saúde (ANS), que regula os planos de saúde. A agência informou que os medicamentos desse tipo só têm cobertura obrigatória caso sejam prescritos pelo médico para administração durante a internação. Posteriormente, pode ser feita a solicitação de reembolso, mas, ainda assim, em alguns casos os pacientes acabam tendo de arcar com os medicamentos.
Esse, no entanto, não seria o cenário ideal, uma vez que tratamentos com remédios como o Remdesivir podem custar até R$ 20 mil, aponta a farmacologista e pesquisadora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Soraya Smaili. "Quem mais sofreu óbitos com o pico da Ômicron foram pessoas acima de 80 anos. A vacina protege, mas a proteção pode ser reduzida em idosos e pessoas com comorbidades", diz. "Nessas condições, deveriam existir alternativas tanto no hospital quanto no ambulatório, o que poderia impedir quadros graves."
Os remédios para a covid se dividem em duas frentes: a das pílulas antivirais de via oral, que podem ser efetivas quando administradas no início dos sintomas, e a dos anticorpos monoclonais, que simulam a proteção conferida pela vacina em diferentes estágios da infecção e correspondem à maioria dos remédios aprovados pela Anvisa.
Até o momento, apesar de o primeiro tipo já ter sido aprovado em países da Europa e nos Estados Unidos, somente o segundo tipo recebeu aval no Brasil. Ainda assim, nenhum foi recomendado pela Conitec para uso na rede pública.
Chefe do departamento de Infectologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Alexandre Naime Barbosa explica que, para pacientes com covid leve da rede privada, o Regdanvimabe seria o único com estoque disponível no Brasil. Produzido pela Celltrion Healthcare, ele seria capaz de reduzir o risco de progressão da covid em 70%, segundo estudos clínicos de fase 3.
O preço, no entanto, é um entrave para a rede pública - vai de R$ 9,8 mil a R$ 12 mil, a depender do peso do paciente. Além disso, há uma hesitação em relação à eficácia dos anticorpos monoclonais no combate à Ômicron, mais transmissível, o que faz mesmo hospitais privados repensarem as estratégias para tratar a covid.
No caso de pacientes com covid-19 hospitalar, Naime Barbosa reforça, por outro lado, que a rede pública consegue oferecer opções como o corticosteróide Dexametasona, primeira droga que se mostrou eficaz nesses casos. Outras alternativas, como ventilação e intubação, também foram incorporadas pelo SUS.
A Conitec analisa o Baracitinibe, inibidor seletivo da Eli Lilly usado para artrite reumatoide e que se mostrou eficaz contra a covid. Na rede privada, tratamentos envolvendo o remédio custam entre R$ 2 mil e R$ 3 mil, o que o tornaria mais acessível.
Em nota, o Ministério da Saúde reforçou que encerrou no último dia 24 o prazo para o envio de contribuições à consulta pública sobre a proposta de incorporação do remédio para tratamento da covid. "Agora, o tema voltará para a Conitec para que os membros do plenário possam emitir a recomendação final", acrescentou. A pasta ressaltou que o Baricitinibe já tem registro no Brasil para o tratamento de artrite reumatoide e o uso para tratar a covid foi aprovado pela Anvisa.
No Brasil, a Anvisa recebeu pedido de uso emergencial do Molnupiravir, da Merck Sharp & Dohme (MSD), em novembro. Conforme painel da agência, 53% da documentação teve a análise concluída, 41% está em análise e 5% ainda está pendente de complementação. Em nota, a MSD informou que teve novas informações solicitadas pela agência há cerca de duas semanas e está compilando os dados para reenviar à agência.
No caso do Paxlovid, da Pfizer, o pedido foi feito em fevereiro. A Anvisa aponta que 50% da documentação teve a análise concluída e 41% ainda está em análise. A farmacêutica informou, em nota, aguardar a revisão da agência. "O período para que Paxlovid esteja disponível no Brasil dependerá da aprovação da Anvisa e também do andamento das negociações com o Ministério da Saúde para um possível acordo de compra", acrescentou.
Kit covid
Apesar de seguir grande parte das recomendações da Conitec, o Ministério da Saúde rejeitou em janeiro deste ano as diretrizes da comissão para não usar medicamentos sem eficácia do chamado "Kit Covid", que inclui remédios como cloroquina, hidroxicloroquina, azitromicina e ivermectina para tratamento de pacientes no SUS. "Esta posição reforça decisões anteriores do governo de usar indiscriminadamente medicamentos ineficazes e sem evidências científicas", avalia o professor do Instituto de Física de São Carlos da Universidade de São Paulo (USP) Adriano Andricopulo.
"No contexto nacional atual e de recursos disponíveis no SUS, seria prioritário atender as demandas de tratamentos precoces ou casos iniciais de pacientes com suspeita ou diagnóstico de covid-19. Também seria útil a disponibilidade de alguma terapia eficaz para salvar a vida de pacientes em estado grave. Estamos entrando em uma nova fase de diversidade de terapias surgindo para o tratamento da covid-19, o que leva a necessidade de constante avaliação e atualização, conforme novas evidências científicas e médicas de alta qualidade vão aparecendo", acrescenta.
Entre as possibilidades, o pesquisador aponta que Molnupiravir e Paxlovid seriam opções importantes para o tratamento inicial da doença. Para além deles, remédios como Sotrovimabe (GSK), Regdanvimabe (Celltrion) e Evusheld (Astrazeneca) também poderiam gerar resultado. "Contudo, não estão disponíveis nem na rede privada", explica. Por fim, nos casos graves e com risco de morte, ele reforça que o uso de anticorpos monoclonais como Tocilizumabe ou Baricitinibe seria útil.
Remédios para tratar a covid
Paxlovid
Pílula antiviral de via oral produzida pela Pfizer. Ainda não foi aprovada pela Anvisa, mas é uma das apostas para controlar a covid em estágio inicial.
Molnupiravir
Pílula antiviral de via oral desenvolvida pela Merck Sharp & Dohme (MSD) em parceria com a Ridgeback Biotherapeutics. Também não tem aval da Anvisa, mas já é usada em outros países.
Aprovados pela Anvisa:
Evusheld
Coquetel de anticorpos monoclonais desenvolvido pela AstraZeneca, anteriormente conhecido como AZD7442. Recebeu aprovação da Anvisa em fevereiro, mas não possui estoque no País. A farmacêutica informou que o preço do remédio deve ser definido na próxima semana. Acrescentou estar em contato com o Ministério da Saúde sobre a possibilidade de incorporar o produto no SUS e com alguns grupos hospitalares.
Regdanvimabe
Anticorpo monoclonal produzido pela Celltrion Healthcare. Desenvolvido especificamente para o tratamento da doença, deve ser administrado em até sete dias após o início dos sintomas. Possui estoque no País.
Baricitinibe
Inibidor seletivo produzido pela Eli Lilly. Recebeu parecer inicial favorável da Conitec e está avançando para ser disponibilizado pelo SUS em tratamentos para covid-19.
Remdesivir
Antiviral injetável fabricado pela Gilead, tem benefício marginal no controle do vírus. Possui custo elevado. Conitec recomendou a não incorporação pela rede pública em setembro do ano passado.
Outros medicamentos que foram aprovados pela Anvisa para tratar a covid, mas que não foram incorporados para tratamento na rede pública: Sotrovimabe (produzido pela GSK) e Regn-Cov2 (fabricado pela Regeneron em parceria com a Roche). O Xeljanz (Banlanivimabe e etesevimabe), da Pfizer, foi aprovado em abri