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IGOR GIELOW (FOLHAPRESS) - A China disparou ao menos 11 mísseis balísticos em direção a Taiwan nesta quinta (4), iniciando os exercícios militares em retaliação pela visita de a presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, à ilha que Pequim clama para si.
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As armas eram mísseis de curto alcance DF-11, a julgar por vídeos distribuídos pela imprensa chinesa, disparados de um arquipélago chamado Pingtan, que fica a cerca de 125 km de Taiwan. Segundo o governo da ilha autônoma, eles atingiram alvos na água, enquanto veículos como o nacionalista Global Times disseram que eles sobrevoaram território taiwanês.
Seja como for, com 300 km de alcance, eles poderiam fazer ambas as coisas: são armas que seriam usadas em um primeiro ataque a Taiwan. Como Taipé disse, os exercícios são desenhados para mostrar como seria feito um bloqueio aeronaval da ilha, já que Pequim divulgou seis áreas de manobras em torno do território.
Segundo o Ministério da Defesa de Taiwan, os projeteis foram lançados em ondas sucessivas por duas horas, a partir de aproximadamente 14h (3h no Brasil). A China diz que eles estavam equipados com ogivas convencionais, tornando esse o maior exercício de tiro com munição real no estreito de Taiwan na sua história.
A tática de atingir alvos no mar ou sobrevoar o território inimigo com mísseis é velha conhecida na região, sendo aplicada nos testes da Coreia do Norte sobre o Japão, por exemplo. É bastante intimidatório, mas não houve relatos de pânico em Taiwan, que já está em alerta militar máximo desde que Pelosi desembarcou na ilha, na terça (3) à noite.
A americana está em um giro asiático e fez a primeira visita de uma autoridade de seu nível à ilha em 25 anos, sob intensos protestos chineses, que consideram isso um apoio à independência nunca proclamada de Taiwan. Ela passou a quarta (3) em Taipé e voou para a Coreia do Sul, de onde vai depois para o Japão.
Encontrou-se com autoridades como a presidente Tsai Ing-wen e reafirmou o compromisso americano de defender a democracia da ilha, em oposição a autocracias -teve o cuidado mínimo de não usar a palavra China, mas foi obviamente inútil. Os EUA mantêm uma ambígua política ante Taipé, ao mesmo tempo reconhecendo a soberania chinesa implícita no reconhecimento diplomático de Pequim e oferecendo armas e promessa de proteção militar em caso de guerra.
O governo de Xi Jinping já disse ter um compromisso inadiável com integração da ilha, lar da liderança derrotada pelos comunistas na revolução de 1949, com o continente. Promete fazê-lo de forma pacífica, mas não descarta o uso da força e tem intensificado suas ações militares na região para deixar isso claro.
No ano passado, por exemplo, fez a maior incursão de caças e bombardeiros da história, testando a rapidez com que taiwaneses enviam aviões de interceptação. Na quarta, Pequim enviou 27 aeronaves de combate contra Taiwan, num "esquenta" dos exercícios prometidos até domingo (7).
Mais está por vir, e a tensão parece estar sendo dosada por Pequim de forma crescente. A imprensa chinesa fala que serão empregados armamentos sofisticados, como o caça furtivo ao radar J-20, um dos porta-aviões do país, um submarino nuclear, o destróier Tipo 52D e uma série de mísseis, inclusive o "matador de porta-aviões" DF-21 e o hipersônico DF-17.
O acirramento de ânimos é o maior entre China e EUA desde a Terceira Crise do Estreito de Taiwan, entre 1995 e 1996, quando mísseis foram lançados na região após o presidente da ilha visitar Washington.
O contexto atual é o da Guerra Fria 2.0, lançada por Donald Trump ante a assertividade crescente de Xi em 2017, que envolve de tarifas de comércio à autonomia de Hong Kong como campos de batalha. O governo de Joe Biden a intensificou, acelerando a montagem de uma rede de aliados no Indo-Pacífico para cercar Pequim e questionar suas reivindicações sobre as águas do principal corredor de comércio do país, o mar do Sul da China.
Ela tomou proporções dramáticas com a Guerra da Ucrânia, iniciada pela invasão promovida por Vladimir Putin em fevereiro. Moscou é a principal aliada de Xi, que dias antes do conflito havia recebido o colega russo e celebrado uma aliança. Ela não é militar em si, mas o apoio econômico e político que Pequim dá ao Kremlin, além da recusa de Xi de condenar o conflito, é visto pelos EUA como vital para Putin.