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IGOR GIELOWSÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em meio aos exercícios militares em retaliação pela visita de Nancy Pelosi a Taiwan, a China promoveu nesta sexta (5) a maior mobilização aérea de sua história no estreito que separa o continente da ilha que promete integrar a seu território.
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Segundo o Ministério da Defesa de Taipé, 68 aviões de combate chineses estiveram no ar na região, e 49 deles cruzaram a chamada Linha Mediana, fronteira extraoficial de espaços aéreos que divide o estreito de Taiwan. O recorde anterior era de 52 aeronaves, em outubro passado, mas naquela ocasião todos invadiram a área que a ilha patrulha.
Caças taiwaneses foram mobilizados para interceptar os invasores, como ocorre quase semanalmente. Na quarta (3), antes do início dos exercícios, ao menos 22 aviões haviam cruzado a fronteira aérea.
Ao mesmo tempo, os militares chineses executaram manobras navais com uso de munição real a norte, sudoeste e leste da ilha, efetivamente bloqueando o tráfego marítimo. No estreito, 13 embarcações navegaram perto da Linha Mediana.
Em uma rede social, a presidente da ilha, Tsai Ing-wen, pediu que os moradores mantenham a calma e disse que o governo "certamente pode garantir a segurança". "Preparamos uma resposta completa, e os militares estão fazendo o possível para responder aos ataques."
Pelosi, a presidente da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos, fez uma polêmica viagem a Taipé na terça (2) e na quarta (3). Ela encontrou-se com autoridades da ilha e reiterou o apoio americano à democracia local, na primeira visita do gênero em 25 anos.
Pequim havia alertado que considerava a ida de Pelosi uma violação de sua soberania, lembrando que, apesar de apoiar militarmente Taiwan, Washington reconhece os direitos chineses sobre a ilha, já que mantém relações diplomáticas com a ditadura comunista desde 1979.
Tal ambiguidade está colocada à prova, com Pequim anunciando sanções a Pelosi e cortando alguns itens da pauta de cooperação bilateral. É a mais aguda crise entre as duas maiores potências econômicas do mundo desde a chamada Terceira Crise do Estreito de Taiwan, ocorrida na esteira da viagem do então presidente da ilha para os EUA em 1995.
A questão é que agora a China tem musculatura política, econômica e militar antes inaudita, e vive a Guerra Fria 2.0 desde 2017 em vários campos com os EUA. A visita de Pelosi deu a Pequim a justificativa ideal para flexioná-las, ainda que os EUA digam que não há motivo para tanto.Os exercícios em torno de Taiwan são uma espécie de ensaio geral de um bloqueio aeronaval que poderia ser feito sem o custo humano de uma invasão territorial, subjugando Taipé. É uma das hipóteses na mesa de Pequim, que tem na incorporação da ilha uma prioridade nacional.
Para o líder Xi Jinping, a crise serve de escada para asseverar poder no momento em que se prepara para ser reconduzido a um novo mandato, em novembro. Desde 1982, a reeleição pelo Politburo do Partido Comunista só era permitida uma vez, mas Xi mudou a regra em 2018, possibilitando eternizar-se no poder e entronizando mesmo seu nome na Constituição do país.
Xi enfrenta uma grave crise econômica, assim a demonstração de força internacional também tem propriedades diversionistas. Os exercícios militares estão programados para acabar às 12h do domingo (1h em Brasília). A crise em Taiwan ocorre em paralelo à Guerra da Ucrânia, na qual a China apoia politicamente seu aliado Vladimir Putin contra Kiev e o Ocidente.
Taiwan está em alerta militar máximo, e os EUA mantêm navios, inclusive um porta-aviões, na região, além de terem deslocado bombardeiros furtivos ao radar B-2 para a Austrália.