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(FOLHAPRESS) - O encontro do papa Francisco com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), agendado para quarta-feira (21) no Vaticano, é parte de uma série de passos do líder católico na tentativa de posicionar a Santa Sé como facilitadora de conversas que possam promover tratativas pela paz na Guerra da Ucrânia.
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Depois de enviar o cardeal italiano Matteo Zuppi a Kiev no começo deste mês, o papa estaria preparando a replicação do mesmo movimento na outra ponta, com uma viagem de seu assistente a Moscou.
Como parte da operação, tanto Lula quanto o líder de Cuba, Miguel Díaz-Canel, que tem audiência nesta terça-feira (20) com o papa, são vistos como nomes que mantêm canais de contato com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, e que poderiam abrir o caminho de Zuppi até expoentes do Kremlin.
O brasileiro desembarca nesta terça em Roma, onde também se reunirá com o presidente italiano, Sergio Mattarella, e o prefeito da capital, Roberto Gualtieri, do Partido Democrático, de centro-esquerda. Não está previsto encontro com a primeira-ministra Giorgia Meloni, do Irmãos da Itália, de ultradireita.
Além de temas ligados a questões ambientais e sociais, o principal assunto na pauta de Lula e Francisco deverá ser o conflito no Leste Europeu. Ambos afirmam buscar consenso entre outros países que levem a negociações pela paz, apesar de Volodimir Zelenski ter jogado água fria em ambas as iniciativas.
Em entrevista à Folha, o presidente da Ucrânia comentou, com ironia, as tentativas de Lula de ser "original" em seus planos de criar um "clube da paz". Em maio, após ter sido recebido no Vaticano, disse a um canal de TV italiano que dispensava a mediação do papa. "Com todo o respeito à Sua Santidade, não precisamos de mediadores, precisamos de uma paz justa", disse.
Quando esteve em Kiev, nos primeiros dias de junho, o cardeal Zuppi ouviu de Zelenski que o único plano de paz possível era o seu, composto por dez pontos, entre eles a restauração da integridade territorial da Ucrânia. O cessar-fogo, como sugere a linha de Francisco, estaria descartado. Segundo relato do cardeal, que é presidente da Conferência Episcopal Italiana, sua ida a Kiev não foi uma tentativa de mediação. "Fui manifestar interesse, proximidade, escuta, para que o conflito possa encontrar caminhos de paz", disse.
É nesse contexto que se inserem os encontros do papa com Lula e Díaz-Canel. Em abril, os líderes receberam em seus países Serguei Lavrov, chanceler russo que convidou o brasileiro para visitar a Rússia.
O convite foi rejeitado semanas depois, em um telefonema direto entre Lula e Putin.
Cinco dias depois, Lula e Francisco se falaram, também por telefone, e ali combinaram o encontro no Vaticano. Segundo nota do Planalto, na ocasião, o brasileiro, que acabara de voltar da cúpula do G7 em Hiroshima, no Japão, relatou ao pontífice suas conversas com outras lideranças sobre o conflito.
"O papa está agindo muito claramente para tentar criar condições que possam levar a viabilizar a ida de Zuppi a Moscou. Brasil e Cuba são dois países com relações não tensas com o Kremlin, e é fácil poder confiar a eles uma mensagem ou um pedido de ajuda", analisa Franca Giansoldati, vaticanista do jornal italiano Il Messaggero.
"Ele busca exercer uma pressão moral e criar condições para que outros atores internacionais possam intervir e encontrar uma espiral para a paz. O papa sabe perfeitamente que não tem a varinha mágica nas mãos, e o Vaticano não tem um plano de paz. Ele tenta facilitar uma etapa de diálogo."
Além do canal aberto com Putin, o Brasil é considerado peça capaz de influenciar os humores da América Latina e dialogar com Índia, África do Sul e China, que resistem a declarar apoio explícito a Kiev e a se juntar aos Estados Unidos e à Europa na condenação de Moscou.
A viagem de Zuppi a Moscou, ainda que não confirmada, é considerada iminente e deve se realizar sem aviso prévio, como quando foi a Kiev. Um encontro com Putin é considerado ainda improvável, mas estariam na mesa possíveis reuniões com Lavrov e com o líder da Igreja Ortodoxa russa, o patriarca Cirilo, a quem Francisco já exortou a não se comportar como "coroinha de Putin".
No fim de semana, após a alta hospitalar de Francisco, que ficou nove dias internado após cirurgia no abdômen, o chefe de Relações Exteriores do Patriarcado de Moscou, Antonij de Volokolamsk, anunciou ter encontrado o papa e integrantes da Comunidade de Santo Egídio, grupo cristão pacifista do qual Zuppi faz parte. A circulação dele pelo Vaticano reforçou rumores sobre os preparativos da ida a Moscou.
Após quase 16 meses da invasão russa à Ucrânia, a diplomacia do Vaticano, que mistura vias tradicionais com a abordagem pessoal de Francisco, já passou por diferentes fases. Logo após o início do conflito, o papa tentou se colocar em posição equidistante, o que atraiu críticas e gerou curtos-circuitos.
Um desses episódios foi quando convidou para o rito da via-crúcis, na Sexta-Feira Santa de 2022, duas mulheres, uma ucraniana e uma russa, para participarem lado a lado. A ideia foi levada adiante apesar de queixas públicas nos dias anteriores à celebração, manifestadas tanto pelo embaixador de Kiev junto à Santa Sé, quanto pelo arcebispo da Igreja Greco-Católica Ucraniana, que considerou a cena "inoportuna".
O argentino foi deixando de lado a equidistância e engrossou a voz contra Moscou, ainda que deixando uma porta sempre aberta a Putin. "Houve uma progressão diplomática. Após ouvir que era visto mais virado para Moscou que para Kiev, o papa fez uma correção de rota. E também entendeu que não daria para agir sozinho, que era preciso construir uma rede internacional e pedir ajuda a países amigos", diz Giansoldati.
O Brasil, na visão do Vaticano, está nessa lista.
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