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IGOR GIELOW (FOLHAPRESS) - A usina nuclear de Zaporíjia, ocupada em março de 2022 por forças da Rússia no sul da Ucrânia, voltou ao centro das tensões da guerra entre os dois vizinhos. Kiev e Moscou se acusam mutuamente de tentar simular um ataque contra a unidade e culpar o adversário.
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É uma situação potencialmente grave, evocando memórias do acidente nuclear mais famoso da Europa, quando um reator explodiu na usina ucraniana de Tchernóbil, então na União Soviética, em 1986.
Na noite de terça (4), o presidente Volodimir Zelenski afirmou que os serviços de inteligência da Ucrânia detectaram "objetos que lembram explosivos" sobre 2 dos 6 reatores da usina, a maior do continente.
Segundo ele, é possível que a Rússia queira "simular um ataque" ucraniano. O comando das Forças Armadas divulgou nota detalhando a hipótese, dizendo que, se explosivos forem usados, provavelmente não haveria dano aos reatores, mas a impressão de que mísseis foram lançados contra eles.
O perigo dessa tese é a explosão de fato atingir os reatores, com escape de material radioativo ou, pior, sua fusão. Zelenski falou sobre o tema com o líder francês, Emmanuel Macron, e ambos combinaram de passar os detalhes para a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), órgão regulador do setor.
Na mão contrária, o Kremlin acusou a Ucrânia de planejar uma "ação terrorista" contra Zaporíjia. De acordo com o porta-voz Dmitri Peskov, a "situação é bem tensa porque há de fato uma grande ameaça de sabotagem pelo regime de Kiev, que pode ser catastrófica". Ele afirmou que "medidas estão sendo tomadas" para elevar a segurança do local. Com efeito, redes sociais russas mostram presença maior de veículos da agência de resposta a emergência nucleares da Rússia nos vilarejos em torno da usina.
Blogueiros locais relatam que alguns moradores foram retirados de suas casas. Na semana passada, Kiev fez uma simulação de acidente nuclear na capital da província de Zaporíjia, que segue sob seu controle.
Aumentando o grau das acusações conspiratórias, um assessor da direção da Rosenergoatom, operadora da rede elétrica das usinas nucleares russas, disse que, "na noite de 5 de julho [esta quarta], as forças ucranianas vão atacar Zaporíjia com mísseis de precisão e drones kamikaze". Segundo Renat Karchaa, os mísseis carregarão lixo radioativo de alguma das outras cinco usinas ucranianas para amplificar o efeito.
Há exagero no ar também. Zaporíjia está com seus reatores desligados, e eles são de um modelo soviético mais moderno, seguro e protegido do que os de Tchernóbil. Enclausurados em um recipiente de aço, são muito resistentes a rompimentos externos. Mas há outros perigos, com danos a estruturas de contenção de resíduos radioativos.
Algo previsível, nenhum dos lados apresentou evidências concretas das acusações, um padrão da guerra, aplicado tanto por Moscou quanto por Kiev, que está no meio de uma contraofensiva no sul e no leste.
Logo após o começo dela, há um mês, uma explosão atingiu a barragem de Nova Kakhovka, inutilizando uma usina hidroelétrica e inundando as margens do rio Dnipro nos cerca de 100 km finais do seu curso, rumo ao mar Negro. Até hoje não se sabe quem cometeu o crime e, claro, Kiev e Moscou se acusam pela ação. Militarmente, ambos foram afetados, pois a inundação por um lado dificultou qualquer avanço ucraniano na região, mas os campos minados e defesas russas foram varridas também.
Os ataques da contraofensiva, iniciados em 4 de junho, não lograram romper de forma decisiva as linhas defensivas russas. Zelenski já disse que há dificuldades e que o avanço é mais lento do que o esperado, enquanto autoridades de países da Otan, a aliança militar ocidental liderada pelos EUA, revezam-se na mídia dizendo que tudo isso é normal e que a ação principal ainda irá ocorrer.
Neste contexto, interessa a ambos os lados desviar atenção para Zaporíjia, no centro das preocupações mundiais desde que tropas de Putin a tomaram em meio a explosões e tiroteios em março de 2022.
A AIEA faz vistorias periódicas no local, temendo que os constantes combates na região acabem por violar a integridade da usina. Na mais recente, no mês passado, não foram encontrados explosivos que os ucranianos dizem ter sido plantados pelos russos, embora nem toda a unidade tenha sido examinada.
Com a destruição do reservatório de Nova Kakhovka, que abastecia as piscinas de resfriamento dos reatores da usina, o último reator ainda em atividade do local foi desligado por precaução. A usina é operada pela Rosatom, estatal russa do setor, mas mantém funcionários ucranianos.
Ainda no campo nuclear, Peskov classificou de fake news reportagem do jornal britânico Financial Times segundo a qual o líder chinês, Xi Jinping, teria alertado Putin a não empregar armas nucleares táticas, de uso militar mais restrito, contra a Ucrânia.
Ao mesmo tempo, o Kremlin tem mantido sua retórica agressiva no setor, ameaçando de forma velada de tempos em tempos o risco de uma guerra nuclear com a Otan e posicionando ogivas atômicas na aliada Belarus, perto da fronteira de três países da aliança.
Com efeito, a Polônia mordeu a isca e já pediu que os EUA façam o mesmo em seu território, ampliando o risco de um erro de cálculo e escalada militar imprevisível.
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