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Deputados do PL afirmam que são perseguidos por colegas da bancada se não votarem alinhados às posições do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) na Câmara. As denúncias foram feitas depois que o Estadão obteve fotos de mensagens trocadas no grupo de WhatsApp dos deputados federais do partido, neste domingo, 9, em que bolsonaristas radicais atacaram deputados que divergem das posições do ex-presidente. Houve revide e o clima esquentou tanto que o líder do PL na Casa, Altineu Côrtes (RJ), precisou restringir novas publicações, permitidas agora só aos administradores do canal.
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Parlamentares da legenda se dizem perseguidos desde que deram votos favoráveis ao governo na votação do arcabouço fiscal na Câmara. Na ocasião, 30 deputados do PL votaram a favor do governo. Mas deputados dizem que os ataques dos colegas bolsonaristas aumentaram depois dos 20 votos na bancada do PL a favor da reforma tributária. A liderança do partido orientou voto contra a reforma e Bolsonaro se empenhou pessoalmente em convencer correligionários a se posicionarem contra o texto. Só que, além dos ataques internos, a desobediência a Bolsonaro também provoca perseguição de milicianos digitais nas redes, diz quem diverge da cartilha bolsonarista.
Deputados perseguidos dizem que são assediados por cerca de 10 "radicais" da bancada, que são assim classificados por eles por praticarem ataques pessoais a quem não segue a cartilha bolsonarista. Em entrevista ao Estadão, os deputados Vinicius Gurgel (PL-AP) e Yury do Paredão (PL-CE) relataram ataques de bolsonaristas da bancada e disseram que o comportamento deles destoa até de Eduardo Bolsonaro (SP), o filho "Zero Três" do ex-presidente, que poupa os dissidentes de ofensas pessoais, embora turbine os argumentos do pai nas redes.
Quem diverge de Bolsonaro calcula que, na bancada de 99 deputados do PL, a maior da Câmara, há cerca de 10 bolsonaristas "radicais", porque atacam correligionários, e outros 20 bolsonaristas fiéis, porém "respeitosos" aos colegas.
Gurgel (PL-AP) disse que sua filha foi assediada por colegas na escola, porque bolsonaristas tacharam ele de "traidor" de Bolsonaro em montagens nas redes, depois que votou em favor do governo federal. "Perguntaram para minha filha na escola: 'por que teu pai traiu o Bolsonaro?' Eu não traí ninguém", relatou Gurgel, que é deputado federal desde 2011 e rejeita qualquer dívida com Bolsonaro por seu desempenho eleitoral.
"Sou 1001% PL e presidente Valdemar Costa Neto. Minha pior votação foi agora quando Bolsonaro veio para o partido, mas não tenho nada contra o ex-presidente. Infelizmente, quando não votamos com a pauta bolsonarista, somos agredidos nas redes sociais. Tem que ter respeito mútuo. A gente não fica criticando Bolsonaro ou bolsonaristas", disse o deputado.
Também turbinado por redes sociais, Yury avalia que os ataques dos seguidores de Bolsonaro na bancada são tentativas de manter seus eleitores engajados. Ele diz que não vai deixar bolsonaristas que lhe atacam interferirem em suas votações. "A gente se elegeu com a pauta diferente deles. Mas fazem tudo para ganhar likes", afirmou ao Estadão. "Não vamos deixar deputados radicais interferirem na forma de conduzir nosso mandato", acrescentou.
Gurgel diz que se absteve de votar na MP dos Ministérios, em que seria favorável à medida do governo, justamente para não ser atacado por bolsonaristas. Ainda assim, foi punido pelo partido - perdeu assento na Comissão de Agricultura, na Comissão de Integração Nacional e na Comissão de Saúde.
Deputados atacados por bolsonaristas avaliam que outros parlamentares deixaram de votar contra os interesses de Bolsonaro depois que os ataques começaram nas redes sociais, quando 30 deputados do PL votaram no dia 23 de maio a favor do arcabouço fiscal, proposto pelo governo.
A confusão deste domingo, 9, estourou depois que o deputado federal André Fernandes (PL-CE) resgatou uma foto postada pelo seu colega Yury do Paredão (PL-CE), em que este aparece ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante uma visita presidencial ao Ceará em maio. Como mostrou o Estadão, Yury foi um dos oito deputados punidos pelo PL com a perda da participação em comissões, por terem votado de maneira favorável ao governo na Medida Provisória (MP) que colocou em prática a divisão de ministérios idealizada por Lula. Além deles, Gurgel também foi punido pela abstenção. A punição foi aplicada sob a justificativa de que o PL "fechou questão" contra a aprovação da MP dos Ministérios.
Filho do senador Carlos Viana (Podemos-MG), o deputado Samuel Viana (PL-MG) fez uma longa argumentação no grupo de WhatsApp do PL, em que criticou atitudes dos bolsonaristas de fazer oposição a qualquer projeto do PT, "contra tudo a qualquer custo", sem propor nada em troca. Ele reclamou especialmente da postura na rejeição à reforma tributária.
"Vocês foram para o plenário posicionar enquanto o jogo estava rolando. Ninguém se preocupou em chamar os governadores, associações, se juntar a bancada ruralista, indústrias, etc. e tentar fazer do 'limão uma limonada'. Ser o pai das alterações no texto e estar mais perto da construção que estava sendo feita para ser o 'pai da criança' ou mostrar que a oposição da direita seria diferente da esquerda. Que faria com que aquele texto inicial, cheio de problemas, fosse alterado a pedido e trabalho da oposição. Isso é ruim não é pra mim, é pro próprio PL", reclamou Samuel Viana no grupo dos deputados do PL.
"Ser um partido bolsonarista é agir assim? Como o PT e PSOL fazem? Contra tudo a qualquer custo? Temos muito mais qualidade aqui. O príncipe conhece demais de tributário", afirmou Viana, em referência ao deputado federal Luiz Philippe de Orléans e Bragança (PL-SP).
Depois de restringir as publicações no grupo de WhatsApp, Côrtes, o líder do PL na Câmara, afirmou que vai conversar com o presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, e com Bolsonaro "para que possamos juntos com a bancada discutir e estabelecer nossos limites".
"Bolsonaro colocou na última reunião que nessa votação da reforma tributária não era o caso de fechar questão! Vamos manter a calma, com agressão não vamos resolver nada", afirmou Côrtes aos deputados no grupo de WhatsApp.