Inclusão de novos membros no Brics deve definir futuro e perfil político do bloco

Na reunião, o bloco analisará se aceita novos membros e a que ritmo uma expansão se daria

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Economia Mundo 21/08/23 POR Folhapress

NOVA DÉLI E AHMEDABAD, ÍNDIA (FOLHAPRESS) - O Brics, bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, enfrenta na cúpula de Joanesburgo, de terça (22) a quinta-feira (24), o tema que deve definir o futuro e o perfil político do grupo criado para coordenar ações entre algumas das principais economias emergentes do mundo.

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Na reunião, que contará com as presenças do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), do primeiro-ministro da Índia, Narendra Modi, do dirigente chinês, Xi Jinping, e do líder da África do Sul, Cyril Ramaphosa, o bloco analisará se aceita novos membros e a que ritmo uma expansão se daria.

Entre outros pontos, o formato a ser desenhado no rico distrito de Sandton, na capital financeira sul-africana, deve indicar ainda se o Brics assumirá caráter mais político de contraposição a Estados Unidos e G7. Isso porque entre os mais de 20 candidatos a entrar no clube há países que antagonizam frontalmente com Washington, como Venezuela, Cuba, Irã e a Belarus, forte aliada de Moscou contra a Ucrânia.

A lista de postulantes inclui ainda as monarquias do Golfo Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, os vizinhos do Brasil Argentina e Bolívia, a Indonésia e importantes nações africanas como Egito e Nigéria.

Em maior ou menor nível, a expansão sempre esteve na agenda do Brics, tanto que os sul-africanos entraram no final de 2010, um ano e meio depois da primeira cúpula do clube, na Rússia. A ampliação é um projeto de longa data impulsionado pela China, mas enfrentava resistência dos demais sócios.

Mais de dez anos depois, a situação mudou. Pequim se consolidou como potência e viu crescer sua capacidade de influenciar o tabuleiro internacional. Em guerra contra a Ucrânia, a Rússia precisa do apoio chinês e não deve ser obstáculo à expansão. A África do Sul encara situação semelhante, com seu papel de liderança regional questionado diante de economias mais poderosas em seu continente.

Até mesmo Brasil e Índia -em geral os mais inflexíveis contra a ideia- têm dado sinais de que podem ceder. Recentemente, o chanceler indiano, Subrahmanyam Jaishankar, disse ver com a "mente aberta" a possibilidade de expansão, desde que haja regras para embasar as incorporações. Interlocutores dizem que o país se mostra disposto a aceitar o ingresso de alguns dos candidatos, como os do Golfo.

Já Lula deu declarações citando Arábia Saudita, Venezuela e Argentina como possíveis novos membros do Brics, o que colocou em xeque a posição do Itamaraty contra a expansão. Assim, a chancelaria brasileira tem negociado critérios para ao menos arrancar compromissos em troca da ampliação do bloco.

Os critérios ainda estão sendo negociados entre diplomatas dos cinco membros. O Brasil quer que os novos sócios declarem apoio à causa da reforma dos atuais mecanismos de governança internacional, entre os quais o Conselho de Segurança da ONU, além da defesa de uma arquitetura que preserve algum tipo de equilíbrio geopolítico. Existe a preocupação de que um crescimento desenfreado que inclua adversários históricos dos EUA seja percebido como o embarque do Brasil numa aliança antiamericana.

Para os assessores mais próximos de Lula, o Brics é crucial na estratégia do país de lutar por instituições internacionais que reflitam o atual caráter multipolar do mundo. Os auxiliares do petista dizem que o arranjo atual -seja no Conselho de Segurança ou em fóruns econômicos- não abre espaço para países emergentes e responde prioritariamente aos interesses dos EUA e de seus aliados europeus.

Não à toa, Lula frequentemente defende a necessidade de saídas para reduzir a dependência do dólar no comércio entre países em desenvolvimento -ideia vista com ceticismo por analistas e setores dentro do próprio governo. Uma das críticas veio do economista que cunhou o termo Bric pela primeira vez, em 2001. Ao Financial Times Jim O'Neill disse que a ideia de uma moeda para transações intrabloco era simplesmente "ridícula". "Vão criar um Banco Central do Brics? Como fariam isso? É quase constrangedor."

Para o governo Lula, o Brics alcançou ao longo da sua trajetória resultados que vão além da coordenação política e dos comunicados conjuntos. O principal deles é o NDB (Novo Banco de Desenvolvimento), que financia projetos de infraestrutura e de desenvolvimento sustentável nos países membros. Mesmo com carteira inferior à de outros bancos multilaterais, trata-se de uma instituição integralmente controlada por países emergentes, que sobrevive há quase dez anos e que passa por um processo de expansão próprio.

Mas o bloco também enfrenta contradições internas que levantam dúvidas sobre o funcionamento do clube e até mesmo sobre o seu futuro. O principal dilema talvez seja como equilibrar os interesses de China e Índia, as maiores economias do Brics. Os gigantes asiáticos ainda não resolveram uma disputa de fronteira e há um histórico de violentas escaramuças militares -a mais recente ocorreu em dezembro.

No início do mês, chegaram a circular rumores de que Modi participaria apenas virtualmente da cúpula devido ao incômodo com a crescente influência da China no bloco. A presença do premiê da Índia foi confirmada dias depois, mas a mera hipótese preocupou a presidência de turno dos sul-africanos, que já têm que lidar com a ausência do líder da Rússia, Vladimir Putin -impedido de viajar ao país em razão do mandado de prisão do TPI (Tribunal Penal Internacional) por supostos crimes de guerra na Ucrânia.

A África do Sul é signatária do tratado que criou a corte, e, assim, o país em tese é obrigado a prender o líder russo caso ele desembarcasse em território sul-africano. Houve pressão do Ocidente sobre Pretória, que chegou a considerar a transferência da cúpula para a China.

Nesse cenário de rivalidade regional, a China é contra uma reforma do Conselho de Segurança da ONU que inclua a Índia, o que cria uma trava às aspirações do Brasil de integrar o órgão de forma permanente.

Outro golpe contra o pleito brasileiro veio do chanceler da Rússia, Serguei Lavrov, que representará Putin na cúpula na África do Sul. Em visita a Brasília, em abril, o diplomata disse que o Brasil errou ao articular a ampliação do Conselho de Segurança com Japão e Alemanha -dois países do G7 que participam da estratégia de isolamento de Moscou devido à Guerra da Ucrânia.

Na mesma entrevista ao Financial Times, Jim O'Neill chamou a atenção para as divergências entre as duas maiores economias do Brics. "É algo bom para o Ocidente que China e Índia nunca concordem em nada. Se concordassem, a dominância do dólar estaria muito mais vulnerável."

CANDIDATOS A ENTRAR NO BLOCO

ArgéliaArgentinaBangladeshBareinBelarusBolíviaCubaEgitoEtiópiaHondurasIndonésiaIrãCazaquistãoKuwaitMarrocosNigériaArábia SauditaSenegalPalestinaTailândiaEmirados Árabes UnidosVenezuelaVietnã

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