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(FOLHAPRESS) - Uma pessoa desapareceu a cada uma hora e meia no Rio de Janeiro, entre janeiro e julho deste ano. Ao todo, foram registrados 3.347 casos de desaparecimento no período. Mais da metade, 1.711, aconteceu na Baixada Fluminense e na zona oeste da capital, áreas com predominância da milícia.
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Os desaparecimentos têm sido usados pelos grupos criminosos como uma forma de impor o domínio territorial, conforme aponta a IDMJR (Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial).
A iniciativa divulgou seu boletim anual nesta quarta-feira (30), Dia Internacional das Vítimas de Desaparecimentos Forçados. Segundo o relatório, o número de desaparecidos na Baixada Fluminense equivale a 25% de todo o estado do Rio e é lá onde está a maior incidência de encontros de cadáveres e ossadas -20% em ambos os casos.
Apesar de o Brasil ser signatário da Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, o país não tem uma tipificação própria para esse crime. Os casos são registrados como desaparecimentos comuns e não há levantamentos oficiais para diferenciá-los.
Nos sete primeiros meses deste ano, a Baixada Fluminense foi o local com o maior número de registros de desaparecidos: 914. Em seguida, aparece a zona oeste da capital, com 797, e as zonas sul e norte juntas, 687. A divisão das áreas segue o mesmo parâmetro usado pelo ISP (Instituto de Segurança Pública).
O boletim da IDMJR é feito a partir de registros de ocorrência das delegacias do estado. Apesar de o número de desaparecidos ser alto, o coordenador executivo da iniciativa, Fransérgio Goulart, ressalta uma subnotificação.
"Imagina uma mãe fazer um boletim de ocorrência para falar que quem sumiu com filho dela foi o miliciano que ocupa o território em que ela mora. Ou então o varejista de droga, ou até mesmo a própria polícia. Os números podem ser muito maiores por causa desse medo", afirma Goulart.
O especialista aponta também para uma baixa taxa de elucidação dos casos de desaparecimento. Os dados do número de pessoas encontradas, vivas ou mortas, não são informados pelo ISP.
O Ministério Público do Rio tem o Programa de Localização e Identificação de Desaparecidos, mas, ao ser procurado pela reportagem, não informou os números de 2023 nem de 2022. As informações públicas do programa são sobre o perfil de quem desapareceu -39,1% das vítimas são pardas e 29,1%, pretas. A maioria são homens, 64,93%.
A faixa etária com maior número de desaparecidos é entre 12 a 17 anos (26,2%), seguida de 18 a 24 anos (17,1%).
Em geral, afirma Goulart, os casos de desaparecimento forçados são solucionados fora da esfera pública, ou seja, sem a participação das forças de segurança. As famílias das vítimas costumam encontrá-las a partir informações das redes sociais e de grupos de apoio.
"Se não há uma investigação firme da polícia, uma ossada ou corpo que eventualmente seja encontrado pode não ser identificado, e aquela família nunca vai ter uma resposta", diz Goulart.
"É uma mistura de falta de vontade e de estrutura para resolver esses casos. Porque se a polícia fizer uma busca direito, usando tecnologia, no Rio Guandu [que passa pela Baixada Fluminense], com certeza vai achar corpos lá."Procurada, a Polícia Civil não respondeu até a publicação.
'ÁREAS DE DESOVA'
A IDMRJ também identificou 92 cemitérios clandestinos na Baixada -15 a mais do que foi apontado no levantamento do ano passado. Eles são conhecidos como "áreas de desova". Os mais comuns são em linhas férreas, terrenos baldios, margens de rodovias e lixões. Na maioria das vezes, as vítimas são encontradas mutiladas e decapitadas.
O relatório da iniciativa aponta ainda que parte dos corpos das vítimas de desaparecimento tem sido expostos em áreas públicas pelos criminosos para impor sua força. A maior ocorrência disso tem sido na Baixada Fluminense.
"As milícias têm amplamente utilizado a decapitação e posteriormente a exposição de diversas partes dos corpos desmembrados em espaços públicos, como linhas férreas, para a construção de uma pedagogia do medo", diz o boletim.Desde 2021, o Rio de Janeiro vive uma tendência de alta no número de desaparecidos. Este ano, de janeiro a julho, houve um aumento de 10,2% em comparação ao mesmo período do ano passado. Já entre o 2022 e 2021, esse percentual foi de 30%.
Para Goulart, há uma relação entre essa alta e o número de operações policiais feitas, que também tiveram um aumento."Operações acontecem, em geral, em territórios dominados por um determinado varejo de drogas. Após as ações policiais, esses grupos ficam enfraquecidos, e as milícias ocupam o território deles. Em 2020, as milícias não tinham essa totalidade territorial como se tem hoje, depois dessas operações", diz.