Casos de diabetes tipo 2 crescem entre mais jovens, segundo médicos

Dados da pesquisa Vigitel, do Ministério da Saúde, mostram aumento de 65% em 15 anos na taxa de adultos brasileiros diabéticos -em 2021, eram 9,1% neste grupo, contra 5,5% em 2006.

© Shutterstock

Brasil SAÚDE-DIABETES 27/09/23 POR Folhapress

(FOLHAPRESS) - Filha, sobrinha e neta de diabéticos tipo 2, Beatriz Libonati fazia dieta quando passou a desconfiar de uma perda muito rápida de peso e aumento na sede. O diagnóstico de diabetes -doença caracterizada por uma deficiência na produção ou ação da insulina, o hormônio que controla o açúcar no sangue-, porém, não passava pela sua cabeça naquele momento. "Eu tinha 24 anos. Sou a mais jovem da família a ter diabetes. A maioria teve diagnóstico mais tardio."

PUB

Até que, um dia, começou a sentir fraqueza e mal-estar. Em poucas horas, já não conseguia ficar em pé. "Mediram minha glicemia e estava 580", lembra ela, que chegou a ficar internada por 15 dias devido a um quadro de cetoacidose diabética, uma complicação marcada por um aumento descontrolado no nível de glicose e acidez no sangue.

Uma das doenças crônicas de maior impacto no sistema de saúde, o diabetes tem crescido no país e no mundo. Dados da pesquisa Vigitel, do Ministério da Saúde, mostram aumento de 65% em 15 anos na taxa de adultos brasileiros diabéticos -em 2021, eram 9,1% neste grupo, contra 5,5% em 2006.

Especialistas atribuem a mudança a uma piora em fatores de risco, com aumento do sedentarismo e obesidade.

Em meio a esse avanço, casos de diabetes tipo 2, que respondem por 90% do total dos casos de diabetes e têm maior prevalência entre idosos, já começam a aparecer também em faixas etárias mais jovens, segundo médicos e entidades que acompanham o tema. Em geral, o diagnóstico desse tipo da doença, mais associado a fatores ambientais e marcado por uma resistência do organismo à ação da insulina, é mais comum após os 40 anos. Já os casos de diabetes tipo 1, doença autoimune que ocorre quando o pâncreas não consegue produzir suficientemente esse hormônio, são mais associados a grupos mais jovens.

"Quando se fala em diabetes, geralmente vem à cabeça que o tipo 1 é mais de criança e adolescente, e o tipo 2 de pessoas mais velhas. No entanto, temos visto que o tipo 2 tem aparecido em adolescentes e adultos jovens", diz Fernando Valente, professor de endocrinologia da Faculdade de Medicina do ABC e diretor da Sociedade Brasileira de Diabetes. "Está cada vez mais precoce e um dos motivos é a expansão da obesidade, que está acometendo mais cedo a vida das pessoas."

Paulo Miranda, presidente da Sbem (Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia), também alerta para casos mais precoces de DM2, como é a sigla para a doença. Uma situação que tem ocorrido com mais força ao longo da última década em alguns países, como os Estados Unidos (onde há alta prevalência de obesidade), mas que, pouco a pouco, começa a chamar a atenção também no Brasil.

"Observamos no dia a dia um aumento gradativo do número de pessoas com diabetes, em especial o tipo 2, em idades mais jovens. Tem sido mais comum o diagnóstico antes dos 30 anos, apesar de o maior risco de desenvolver o tipo 2 ocorrer nas pessoas com mais de 60 anos", afirma Miranda.

Ainda não há dados consolidados sobre o tema no país. Estudos internacionais, porém, reforçam o alerta. Pesquisa publicada em dezembro no The BMJ com base em dados do estudo Carga Global de Doenças apontou que a taxa de diabetes tipo 2 entre adolescentes e adultos jovens (de 15 a 39 anos) cresceu 56% em todo o mundo entre 1990 e 2019 -passou de 117 casos a cada 100 mil pessoas para 183 a cada 100 mil.

Crésio Alves, chefe do serviço de endocrinologia pediátrica do Hospital das Clínicas da UFBA e presidente do departamento de endocrinologia da Sociedade Brasileira de Pediatria, lembra que, nos EUA, casos de diabetes tipo 2 em ambulatórios que atendem pacientes já chegam a quase 30%.

"No Brasil, ainda é muito pequena essa proporção. Mas os pediatras, que até pouco tempo nunca diagnosticavam adolescentes com diabetes tipo 2, estão começando a ver", afirma. Dados do estudo Erica, feito com adolescentes em idade escolar entre 2013 e 2014, encontrou prevalência de 3,3% de diabetes tipo 2 nesse grupo e 22% com pré-diabetes -o equivalente a cerca de 214 mil adolescentes com DM2 e 1,46 milhão com pré-diabetes. Ainda não há dados atualizados para comparação.

Para Alves, apesar de ainda mais rara, a situação serve como alerta para a importância de adotar políticas para tentar frear o avanço da obesidade no país.

"O adulto com diabetes tipo 2 tem evolução mais arrastada. Existem milhares de brasileiros que têm e nem sabem, porque são praticamente assintomáticos. Já a evolução do diabetes tipo 2 em adolescentes é mais rápida e mais agressiva", diz o médico, para quem o cenário preocupa devido ao risco maior de complicações. "Por isso temos que estar mais atentos em prevenir e controlar a obesidade."

Atualmente, a estimativa é que ao menos 15,7 milhões de brasileiros vivam com diabetes, segundo o Atlas Diabetes. No mundo, são 529 milhões de pessoas com a doença, número que deve dobrar até 2050, de acordo com estudo publicado na revista The Lancet em junho.

Pesam nessa conta o envelhecimento da população, a redução da prática de atividades físicas e o avanço no índice de pessoas com excesso de peso, problema que já afeta 57% dos brasileiros e que tem levado a uma piora geral nos índices de doenças crônicas.

No caso do diabetes, porém, os impactos não ocorrem apenas no tipo 2 da doença.

"Estudos mostram que a prevalência de excesso de peso também está aumentando na população com diabetes tipo 1", afirma Valente, da SBD. "E aí entra na confusão de diagnóstico etiológico, porque o tipo 2 já aparece mais cedo, e nisso se parece com o tipo 1 [geralmente diagnosticado em crianças e adolescentes], enquanto o paciente com tipo 1 está com excesso de peso, e aí parece com o tipo 2."

Outro fator é a maior dificuldade no tratamento que, nos casos de diabetes tipo 1, exige necessariamente a reposição de insulina -o que, com o excesso de peso, pode levar à necessidade de doses mais altas.

Já em pacientes com diabetes tipo 2, o tratamento é feito com medicamentos orais -alguns hoje voltados também à perda de peso, mas ainda com restrições de acesso devido ao custo alto, lembra Valente.

Mudanças no estilo de vida, com prática de exercícios e maior controle da alimentação, também são recomendados.Para a operadora de caixa Sara Nascimento, 41, diagnosticada com diabetes tipo 2 aos 32 anos, esse é o principal desafio. "Sempre gostei muito de doces, massas, tinha alimentação desregrada, e descobrir o diabetes foi bem complicado."

Hoje, ela conta que vive entre altos e baixos em relação ao controle da doença. "Quando estou fazendo dieta e caminhadas, sinto que consigo controlar melhor. Mas, com criança pequena em casa, fazer exercício é mais difícil, e já fico 10 horas fora trabalhando."

As mudanças na rotina e desafios após o diagnóstico foram o que levaram Beatriz, 32, a criar o perfil Convivendo com o Diabetes para falar do dia a dia de quem vive com a doença.Logo após a internação, ela conta que chegou a ser diagnosticada com diabetes tipo 1. Exames feitos logo depois, no entanto, mostraram que se tratava de diabetes tipo 2, que, além da maior associação com fatores externos, também tem a história familiar como fator de risco importante.

"Tive várias fases ao longo desses oito anos de diagnóstico. Logo no início, o sofrimento foi saber que tinha uma doença que não tem cura. Isso impacta muito no psicológico. Pensava: será que mesmo me cuidando vou ter saúde e conseguir prevenir as complicações?", relata ela, cujo pai, que já morreu, teve perda de visão e precisou de hemodiálise devido ao diabetes.

"Aos poucos fui perdendo o medo de falar sobre diabetes e a aceitar o fato de que eu tinha algo que não tem cura, mas que posso controlar."

Para Beatriz, que hoje usa a página para dar apoio a outros pacientes, um dos principais desafios atuais é superar o estigma ligado ao diabetes tipo 2.

"Frequentemente tratam como se a pessoa buscou isso e não se cuidou, mas ninguém quer ter uma doença. E aí a pessoa se esconde, não fala que tem diabetes e isso prejudica muito a adesão ao tratamento."

O mesmo ocorre com a obesidade. "Mas é uma doença crônica como o diabetes, e temos que ter o mesmo olhar."

Leia Também: Falta de diagnósticos para Alzheimer preocupa especialistas

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

mundo Investigação Há 19 Horas

Laudo aponta que míssil da Rússia derrubou avião no Cazaquistão

fama Luto Há 22 Horas

Morre ator Ney Latorraca, aos 80 anos

fama Festas Há 23 Horas

Filho de Leonardo, João Guilherme dispensa Natal do pai e passa com Xuxa

fama Emergência Médica Há 17 Horas

Internado na UTI, saiba quem é Toguro, influencer indiciado por homicídio

mundo Cazaquistão Há 22 Horas

Nevoeiro, aves, míssil russo… O que se sabe sobre a queda de avião?

mundo Avião Há 23 Horas

Corpo é encontrado no trem de pouso de avião no Havai

fama Tragédia Há 16 Horas

Ator de 'Baby Driver', Hudson Meek, morre aos 16 anos

lifestyle Saúde Há 23 Horas

Nariz entupido? Saiba como resolver este incômodo

fama LUTO Há 18 Horas

Famosos lamentam morte de Ney Latorraca

brasil São Mateus do Sul Há 17 Horas

Equipe médica e paciente morrem em acidente com ambulância no Paraná