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IGOR GIELOW (FOLHAPRESS) - O presidente Vladimir Putin prepara a volta do Grupo Wagner para a Guerra da Ucrânia, um mês e uma semana após a morte em circunstâncias obscuras do fundador da entidade mercenária que havia se rebelado contra as Forças Armadas da Rússia.
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No fim da noite de quinta (28), Putin recebeu no Kremlin Andrei Trochev, um dos mais experientes comandantes militares do Wagner, conhecido pelo nome de guerra Sedoi (grisalho, em russo). O vice-ministro da Defesa Iunus-Bek Ievkurov, que operou a tomada de controle pela sua pasta da estrutura do Wagner, estava presente.
"Unidades voluntárias podem executar várias tarefas de combate, acima de tudo, claro, na zona da operação militar especial", afirmou Putin no trecho gravado do encontro, usando o eufemismo oficial para a guerra. Trochev apenas concordava, sem falar nada.
"Você mesmo esteve lutando numa unidade dessas por mais de um ano. Sabe como é, como deve ser feito", disse o presidente.
A excepcional divulgação ocorre 38 dias depois que o jatinho Embraer Legacy 600 de Ievguêni Prigojin, o homem conhecido como "chef de Putin" por uma relação pessoal com o presidente que começou quando ele era dono de um restaurante em São Petersburgo, aparentemente sofreu uma explosão e caiu perto de Moscou.
Aparentemente porque ninguém deverá saber o que de fato ocorreu, já que as investigações não foram feitas pela autoridade aeronáutica russa -tanto que o pedido de cooperação de praxe com a fabricante brasileira no caso nunca ocorreu.
Morreram com Prigojin outras nove pessoas, muitas delas da cúpula do Wagner, entidade formada em 2014 para operar na anexação da Crimeia que acabou se tornando uma força militar com presença em cerca de 10 países, 7 deles africanos, auferindo do Estado russo R$ 5 bilhões anuais, fora contratos de todo tipo no exterior.
O Wagner tem de minas de ouro em Mali a uma cervejaria na República Centro-Africana. Estimativas tão extraoficiais quanto o grupo, que nunca teve existência legal como companhia militar privada na Rússia embora seus escritórios estivessem em todo canto, dizem que ao longo dos anos Prigojin amealhou até R$ 100 bilhões.
A queda do avião ocorreu dois meses depois de Prigojin liderar um inédito motim contra a cúpula da Defesa russa, que queria tomar controle do Wagner. Com isso, expôs Putin e fragilidades inauditas de seu sistema de controle do país. O Kremlin nega que o presidente tenha ordenado a morte do ex-aliado, claro.
Agora, o governo fez questão de deixar claro com quem negociava ao falar com Trochev, apontado pelo influente jornal Kommersant como o homem escolhido por Putin para comandar a operação do Wagner -que pode ou não manter seu antigo nome.
"Ele trabalha para o Ministério da Defesa", disse à agência RIA-Novosti o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov. Quantos homens e qual estrutura Trochev herdará, contudo, é uma incógnita. Na época do motim, Prigojin dizia ter à disposição 25 mil soldados na Rússia, a maioria recém-chegada da Ucrânia.
No país invadido, o grupo foi instrumental para a mais simbólica vitória russa neste ano, a conquista do bastião de Bakhmut, no leste do país. Mas foi uma vitória dura, após sete meses dos combates até então mais sangrentos da guerra, no qual o Wagner empregou como bucha de canhão humana prisioneiros saídos da cadeia em troca de serviço militar.
Ao menos 10 mil, de um total alegado pelo "chef de Putin" de 16 mil mortos na batalha, eram ex-detentos como ele, preso por dez anos na juventude por crimes de rua. Eles eram empregados de forma algo suicida, em ataques frontais de infantaria, e ao fim prevaleceram pelo maior número.
O que se sabe é que, de lá para cá, Putin buscou tomar para si o controle da vasta estrutura do Wagner. O vice-ministro Ievkurov foi o operador disso, ao visitar países como a Síria e a Líbia, onde o Kremlin também apoia um lado da guerra civil. Parte do grupo está na aliada do Kremlin Belarus, ou esteve, dadas as informações contraditórias sobre isso.
A exposição pública nesta sexta (29) do movimento de Putin sugere que Ievkurov e Trechov vão trabalhar juntos, com uma relação presumida de subordinação por parte do mercenário, um veterano de guerras no Afeganistão e na Tchetchênia. Em 2016, ele virou Herói da Rússia, mais alta condecoração do país, por seu papel na tomada de Palmíria, na Síria, das mãos do Estado Islâmico.
Com isso, está aberto um novo capítulo de uma das mais nebulosas histórias relacionadas à Guerra da Ucrânia. Não se sabe qual papel estará reservado ao Wagner agora, em meio à claudicante contraofensiva da Ucrânia. Analistas militares russos dizem que há menos falta de pessoal do que no ano passado, mas a experiência militar dos veteranos pode fazer diferença.
Ao longo do conflito, Prigojin bateu de frente com Serguei Choigu, o poderoso ministro da Defesa, o acusando de sabotar o trabalho dos mercenários por inveja de seus resultados. Deu no que deu. Logo depois da morte do mercenário, Putin editou um decreto obrigando mercenários a jurar lealdade ao Estado russo. No encontro com Trochev, prometeu benefícios previdenciários a quem lutar na Ucrânia.
Tudo isso havia sido feito por Choigu em junho passado, levando ao motim do Wagner. A concordância televisionada de Trochev sugere que, ao fim, os mercenários foram dobrados, mas o histórico requer prudência antes de conclusões definitivas.
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