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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Nobel da Paz deste ano foi uma das exceções na história do prêmio: a vencedora foi uma mulher, a ativista iraniana dos direitos humanos Narges Mohammadi, 51, atualmente presa em Teerã sob acusação de "espalhar propaganda contra o Estado".
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Assim como nas demais categorias do prêmio Nobel, em que a proporção de vencedores homens em relação a mulheres é de 9,4 para 10, também o da Paz é dominado por eles.
Desde o primeiro ano em que a láurea foi entregue, em 1901, 92 homens venceram o prêmio, enquanto apenas 19 mulheres receberam o troféu, contando com a edição de 2023. Isso significa que 83% das premiações foram masculinas.
A primeira mulher a ganhar a categoria também inaugurou a linhagem feminina no prêmio como um todo. Foi a escritora tcheca Bertha von Suttner (1843-1914), autora de "Abaixo as armas" e laureada pela organização sueca em 1905 por sua militância pela paz.
Desde então, mulheres como a defensora dos direitos das crianças à educação Malala Yousafzai, do Paquistão; Shirin Ebadi, primeira juíza do Irã; e a ativista pelo banimento de minas terrestres Jody Williams, dos Estados Unidos, foram premiadas por seu esforço para promover a paz, os direitos humanos e a democracia.
O anúncio do Nobel da Paz deste ano foi feito na manhã desta sexta-feira (6) pelo comitê norueguês. "Ela apoia a luta das mulheres pelo direito de ter vidas plenas e dignas", afirmou o órgão sobre a premiada, Mohammadi. "Esta luta, em todo o Irã, tem sido alvo de perseguição, prisão, tortura e até morte."
Mohammadi é assediada pelo regime iraniano há 30 anos por seu ativismo, iniciado quando ela ingressou na universidade, e por artigos escritos em favor dos direitos das mulheres no país. Seu marido, Taghi Rahmani, que já ficou detido por 14 anos também por sua atuação política, vive exilado na França com os dois filhos gêmeos, Ali e Kiana.
Para Rahmani, o prêmio irá fortalecer a luta pelo direito das mulheres. "O mais importante é que este é, de fato, um prêmio para a mulher, a vida e a liberdade", disse ele à agência de notícias Reuters. Após a premiação, a ONU pediu ao regime iraniano a liberdade de Mohammadi. Pouco depois, a Fars, agência de notícias semioficial iraniana, afirmou que Mohammadi foi premiada por suas "ações contra a segurança nacional". "Narges Mohammadi recebeu o prêmio dos ocidentais", disse o veículo. Até o momento, nenhuma autoridade do regime em Teerã comentou a láurea.
A ativista já havia sido presa em 2009, quando ficou oito anos na cadeia. Libertada em 2020, voltou a ser detida em 2021, enquanto participava de cerimônia pela memória de uma pessoa morta durante protestos contra o regime islâmico em 2019. Ela cumpre pena de mais de 10 anos.
Mesmo na prisão, Mohammadi continua com suas ações políticas. Após a morte de Mahsa Amini sob custódia da polícia moral do país, em setembro de 2022, ela tem encorajado manifestações e condenado a resposta repressiva de Teerã.
O anúncio do Nobel ocorre no momento em que grupos de direitos humanos afirmam que uma adolescente iraniana foi hospitalizada em coma após um confronto no metrô de Teerã por não usar o hijab, o véu islâmico. As autoridades iranianas negam os relatos.
"Como muitos ativistas dentro da prisão, estou tentando encontrar formas de apoiar o movimento", afirmou ela em entrevista por escrito ao jornal The New York Times, neste ano. "O povo do Irã está fazendo a transição para fora da teocracia da República Islâmica. A transição não será pular de um ponto para o próximo. Será um processo longo e difícil, mas as evidências sugerem que definitivamente acontecerá."
Segundo o comitê, a láurea deste ano ainda reconhece as milhares de pessoas que se manifestaram contra as "políticas de discriminação e opressão" do regime iraniano. "O lema adotado pelos manifestantes -'Mulher, Vida, Liberdade'- expressa adequadamente a dedicação e o trabalho de Narges Mohammadi", afirmou.