Senado piora Reforma Tributária e cria fundos para dilapidar União, diz ex-secretário de SP

Salto destaca dois novos problemas. O primeiro é a mudança do prazo para fim dos benefícios fiscais de ICMS durante o período de transição.

© Jonas Pereira/Agência Senado

Economia FELIPE-SALTO 05/11/23 POR Folhapress

EDUARDO CUCOLOSÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Crítico da Reforma Tributária, o ex-secretário de Fazenda de São Paulo Felipe Salto afirma que a nova versão apresentada pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM) piora o texto aprovado pela Câmara em julho e está distante da proposta original, que representava uma evolução em relação ao sistema atual.

PUB

Salto destaca dois novos problemas. O primeiro é a mudança do prazo para fim dos benefícios fiscais de ICMS durante o período de transição. O segundo é o aumento dos recursos federais aos estados para compensar o fim da guerra fiscal.

A reforma prevê a transferência de R$ 160 bilhões para um fundo de compensação para bancar a redução dos benefícios fiscais no período de transição, de 2029 a 2032. Os estados também vão receber, a partir de 2033, o dinheiro do fundo regional, que terá aportes anuais que chegam a R$ 60 bilhões de 2043 em diante.

"Não são compensações. São dois enormes fundos que foram criados para dilapidar a União, sem contrapartida em termos de melhoria do sistema tributário", afirma Salto, que atualmente é economista-chefe e sócio da corretora Warren Rena.O economista diz que o Senado também deveria acabar com a ideia de ter um Comitê Gestor para administrar o tributo dos estados e municípios, além de antecipar e encurtar a transição para o fim do ICMS."Todos esses pontos são essenciais, e a minha esperança era que o Senado mexesse, todos eles pioraram", afirma.*Folha - A Reforma Tributária vai implantar um sistema que funciona em mais de 170 países. Por que o senhor avalia que isso não vai funcionar no Brasil?Felipe Salto - Quando a gente fala que a PEC 45 levaria o Brasil a se equiparar ao que é praticado no resto do mundo, é uma meia-verdade. A PEC original propunha um IVA [Imposto sobre Valor Agregado] nacional. Era uma evolução em relação ao que a gente tem hoje com o ICMS. Agora, o texto que foi modificado pelo Senado, primeiro, está muito distante do que era a proposta original e, segundo, pode levar a um sistema pior que o atual.O Brasil tem um IVA também, chamado ICMS. O problema é que o ICMS tem alguns entraves, como crédito físico, e não financeiro, ou seja, os consumidores intermediários não podem se acreditar daquilo que eles consomem de serviços no processo produtivo. A tributação é majoritariamente na origem. Os incentivos fiscais não têm nenhum controle, o que leva a uma exacerbação desses incentivos que redunda na guerra fiscal.O fim da guerra fiscal e a migração para o destino não vão acontecer. 'Ah, mas está previsto para 2033...' Da forma como está, uma transição concentrada de 2029 a 2032, em que as alíquotas do ICMS e do ISS vão diminuindo à razão de 10%, quando chegar em dezembro de 2032, as alíquotas vão corresponder ainda a 60% das atuais. Quem acredita que vai passar para zero só porque virou o ano-calendário?Folha - Os estados teriam algum incentivo para continuar com o ICMS?Felipe Salto - Total. Ainda mais agora que, no texto novo do Senado, aquela redução dos benefícios, que aconteceria proporcionalmente à redução das alíquotas, 10% ao ano a partir de 2029, não vai mais acontecer. Você vai ter os fundos, não só o de desenvolvimento regional que foi ampliado, mas o de compensação dos incentivos também, com um volume de recurso enorme que já pode ser distribuído a partir de 2029, mas os benefícios fiscais só acabam em Folha - Mas o fim do ICMS estará previsto na Constituição.Felipe Salto - Mudar a Constituição não é fácil, mas se você tiver a pressão da maioria dos estados, tiver a pressão dos setores empresariais que dependem e estão pendurados nesses incentivos, o que vai acontecer? Provavelmente vai ter uma PEC para prolongar os prazos.Se fosse mesmo para ter a transição para o destino, ela tinha que acontecer num horizonte de curto prazo. O contra-argumento a isso é que custaria caro, porque os estados não iam querer abandonar os incentivos em três ou quatro anos. Mas não é exatamente isso que estão fazendo? Inclusive agora aumentando o Fundo de Desenvolvimento Regional.O custo já está sendo pago, mas o benefício não está vindo. Ele está sendo prometido para 2033. Só que a fatura vai ser paga antes na sua maior parte.O que eu posso esperar disso? Que algum gênio da raça lá em 2031 ou início de 2032 vai propor a prorrogação de prazo. É óbvio. Imagina o [Ronaldo] Caiado ou quem quer que seja o governador de Goiás, para pegar o exemplo de um estado que faz muita guerra fiscal, ou mesmo Santa Catarina. Vai chegar e dizer, olha gente, estamos aqui com R$ 300 bilhões de incentivos. Como vamos reduzir isso da noite para o dia?Folha -Se esse cenário de reversão de parte da reforma não se confirmar, o Brasil terá um bom sistema tributário com a aprovação da PEC 45?Felipe Salto - Não, porque aí vem a minha outra crítica, que é a centralização no Comitê Gestor [da arrecadação do IBS, novo tributo para estados e municípios].A minha proposta é que cada estado gerenciasse o seu IBS. Hoje o ICMS é repartido com os municípios. São Paulo faz a partilha do ICMS com 645 municípios, não dá problema nenhum. Por que eu preciso de um órgão central para a partilha do IBS?Quando digo que ele vai garantir automaticamente a devolução do crédito, corro o risco de erodir a arrecadação dos estados. Hoje o crédito que está embutido no ICMS já é devolvido e o critério é físico. Muda para financeiro, então a devolução tende a aumentar. O crédito acumulado, nas hipóteses de devolução de exportação e tal, vai ser devolvido automaticamente também? Os estados têm de se preparar para isso.Um argumento forte para ter o Comitê Gestor é que vamos migrar toda a tributação para o destino. Quando São Paulo vender para o Ceará, São Paulo vai ter que transferir a receita para o destino. Aí vai haver um risco de apropriação indébita da receita. Se o argumento é esse, explicita na PEC que apropriação é crime de responsabilidade fiscal. Não precisa de um Comitê Gestor para resolver isso.Eu faria uma mudança na legislação do ICMS para migrar para o destino, em quatro anos. Ah, mas vai custar caro. Bom, a PEC já está custando caro. Se é para pagar esse custo enorme, que é um risco fiscal para a União, melhor fazer uma coisa mais rápida, que preservasse aquilo que o sistema atual tem de bom e corrigisse as inequidades.Outra opção é uma que o governador Tarcísio Freitas deu e que não foi acatada. A câmara de compensação, que é um modelo que foi desenvolvido pelos auditores fiscais aqui de São Paulo.Folha - Não seria importante resolver também a questão dos tributos federais, IPI e PIS/Cofins?Felipe Salto - A junção do PIS/Cofins é crível. Vários governos tentaram fazer, já estava amadurecida e é bom, porque simplifica de fato e vai começar em 2026 e em 2027 os tributos antigos vão sumir. É diferente do que está sendo prometido para o ICMS.O problema que eu vejo nessa primeira parte federal é que o relator do Senado inventou uma coisa nova. Você acaba com o IPI e inventa um imposto novo para proteger a Zona Franca. Acaba tornando mais complexo o sistema. A parte boa da reforma é a junção do PIS e da Cofins. A única parte boa, eu diria.Folha - Há outros pontos que poderiam melhorar na proposta, além do comitê gestor e dos benefícios fiscais?Felipe Salto - Uma terceira coisa é mudar essa lógica de compensações, que na verdade não são compensações. São dois enormes fundos que foram criados para dilapidar a União, sem contrapartida em termos de melhoria do sistema tributário. Você vai começar a ter aporte nesse fundo de compensação já em 2025. Mas se o benefício acaba só em 2033, por que eu estou colocando R$ 8 bilhões em 2025?O cálculo da alíquota é outra coisa que me preocupa. Temos as exceções. Outra questão é a transição, que teria que começar muito antes e acabar muito mais cedo. Enfim, todos esses pontos que são essenciais, e a minha esperança era que o Senado mexesse, todos eles pioraram.Essa história de que ninguém sai perdendo com a reforma tributária é uma balela. Para ninguém sair perdendo, acontece isso. Você incorpora tantas exceções, penduricalhos e coisas específicas, para setores, estados, municípios, que virou um monstrengo, como eu tenho chamado.RAIO-X | FELIPE SALTO, 36Economista-Chefe e Sócio da corretora Warren Rena. Ex-Secretário da Fazenda e Planejamento do estado de São Paulo (2022), foi o primeiro Diretor-Executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado Federal

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

fama PRETA-GIL Há 19 Horas

Madrastra atualiza estado de saúde de Preta Gil e fala em recuperação lenta

brasil BR-116 Há 1 Hora

Acidente com ônibus, carreta e carro deixa 38 mortos em Minas Gerais

fama Vanessa Carvalho Há 43 mins

Influenciadora se pronuncia após ser acusada de trair marido tetraplégico

esporte CBF-DENÚNCIAS Há 2 Horas

Presidente da CBF demite diretor que é amigo de Ronaldo por justa causa

esporte DENÍLSON-JOGADOR 21/12/24

Denílson se despede da Band após 14 anos na emissora

fama ROBERTO-CARLOS Há 23 Horas

Em possível último especial na Globo, Roberto Carlos dá mais ibope que sertanejo

fama Blake Lively Há 20 Horas

Blake Lively processa Justin Baldoni por assédio sexual

fama RODRIGO-FARO Há 23 Horas

Rodrigo Faro grava último programa na Record e se despede

mundo Alemanha Há 19 Horas

Divulgadas imagens do autor de ataque em feira de Natal na Alemanha

mundo Alemanha Há 21 Horas

Atropelador em mercado de Natal na Alemanha era ativista anti-islã