Lula veta trechos de projeto do Congresso sobre flexibilização de uso de agrotóxicos

Apelidado por ambientalistas de "PL do Veneno", o texto aprovado no Congresso centralizava no Ministério da Agricultura o registro de novos produtos, esvaziando as atribuições da Anvisa

© Getty

Brasil Agrotóxicos 29/12/23 POR Folhapress

BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O presidente Lula (PT) sancionou alguns pontos e vetou outros sobre o projeto de flexibilização de uso de agrotóxicos no país.

PUB

Apelidado por ambientalistas de "PL do Veneno", o texto aprovado no Congresso centralizava no Ministério da Agricultura o registro de novos produtos, esvaziando as atribuições da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Ao vetar esses pontos, Lula pretende restabelecer o modelo regulatório tripartite de registro e controle de agrotóxico, um tipo de estrutura seguido por agências regulatórias também de outros países.

Segundo integrantes do governo, o veto evita que as avaliações ambientais e de saúde passem a ser conduzidas, exclusivamente, pelo Ministério da Agricultura, sem conhecimento técnico para análise de riscos.

O presidente sancionou, porém, artigos da lei que impõem prazos mais curtos para análise de registros de agrotóxicos. Agora, o processo de produtos novos deverá ser concluído em até 24 meses, enquanto agrotóxicos com fórmulas idênticas a outros já aprovados terão prazo de 60 dias.

O Congresso irá analisar, na volta do recesso, se mantém ou derruba os vetos. Em 2023, o governo tentou barrar avanços da bancada ruralista na Casa, mas não teve sucesso. Agora, isso pode voltar a ocorrer.

Isso aconteceu, por exemplo, em relação à derrubada do veto ao projeto que institui um marco temporal para demarcação de terras indígenas.

Os vetos de Lula no caso dos agrotóxicos dividiram o próprio governo. O Ministério da Agricultura pediu que o projeto fosse sancionado de forma integral. O argumento contra o veto é que o modelo tripartite vai causar um descompasso, com prazos distintos em cada órgão, e que os técnicos da Agricultura já iriam levar em consideração as análises da Anvisa e do Ibama.No entanto, o veto ao superpoder foi defendido pelos ministérios da Saúde, Meio Ambiente, Trabalho e até o da Fazenda.

Também foi vetado por Lula o dispositivo que autorizava o Ministério da Agricultura e o Ibama a deferirem pedidos de produtos à base de ingrediente ativo em reanálise mesmo antes da conclusão do procedimento.

O petista também derrubou o trecho que dispensava empresas de colocarem nas embalagens a advertência de que o recipiente não pode ser reaproveitado.Ao todo, foram 14 pontos vetados por Lula. Na maioria deles, a justificativa apresentada pelo governo foi de que se tratavam de medidas inconstitucionais ou que poderiam representar risco ao meio ambiente e à saúde humana.

O PL estava em tramitação no Congresso desde 1999, quando foi apresentado inicialmente pelo ex-ministro da Agricultura e ex-governador de Mato Grosso Blairo Maggi, à época senador da República.

O avanço do projeto foi acordado ainda durante a transição de governo. Na época, no apagar das luzes do Congresso no ano de 2022, a Comissão de Agricultura (CRA) chegou a pôr a proposta na pauta.

REAÇÕES

A aprovação do projeto pelo Senado, em novembro, provocou reação de diversas organizações ligadas à saúde pública e proteção do meio ambiente, que entregaram manifesto ao presidente Lula durante a COP28, conferência do clima da ONU, em oposição à proposta.

A Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida, que assinou o manifesto, considerou que "o veto parcial do presidente Lula, embora seja um ato importante, é insuficiente para resolver os inúmeros problemas causados pela nova lei e as inconstitucionalidades apontadas pelos movimentos sociais e órgãos científicos".

Entidades como a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) e ANA (Articulação Nacional de Agroecologia) integram a articulação.

A CropLife Brasil, que representa a indústria de agrotóxicos, por sua vez, afirmou que já está em contato com representantes da Frente Parlamentar Agropecuária para discutir a futura apreciação dos vetos presidenciais pelo Congresso. Em nota, a associação se disse surpresa com as alterações no texto.

"A liderança do Mapa [nos processos de reanálise de pesticidas] garantiria maior previsibilidade para o setor privado e eficiência para a administração pública, sem renunciar aos rígidos critérios técnico-científicos da Anvisa e do Ibama", diz a entidade.

A associação também considerou injustificada a supressão do artigo que dispensava a marca da empresa em alto-relevo na embalagem dos produtos. "Atualmente, o Brasil possui um dos sistemas mais avançados de logística reversa do mundo, com destinação de 93% das embalagens usadas para reciclagem controlada", argumenta.

Outras entidades que representam o agronegócio, como Abag (Associação Brasileira do Agronegócio) e CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), foram procuradas pela reportagem mas não se manifestaram sobre o tema.

A porta-voz do Greenpeace Brasil, Mariana Campos, afirma que a lei é inconstitucional e que a ONG recorrerá ao STF (Supremo Tribunal Federal) para derrubá-la.

"A lei viola artigos muito importantes da constituição: de direito à vida, à saúde, e em relação ao meio ambiente equilibrado", diz. "O texto também viola um conceito jurídico muito importante, que é a vedação ao retrocesso. Esse PL como foi aprovado e sancionado deixa lacunas que podem configurar retrocesso ambiental, e isto é inconstitucional, além de ferir o princípio da precaução."

A ativista cita alteração na lei que abre espaço para agrotóxicos riscos maiores à saúde humana.

"O pacote do veneno exclui a proibição de agrotóxicos que causam danos graves à saúde, como câncer, malformação fetal e mutações genéticas. Para que possa garantir o registro, a nova lei estabelece que esse ingrediente pode ser liberado se não houver 'risco inaceitável', mas não define o que é este risco", destaca. "Trazer parâmetros de forma tão vaga é aumentar o risco à saúde pública e à contaminação do meio ambiente."

A crítica é endossada pelo Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), que tem a alimentação saudável e sustentável como tema de parte de seus estudos.

Para Leonardo Pillon, advogado do instituto, "os vetos foram periféricos e se limitam a preservar algumas competências técnicas e de fiscalização da Anvisa e Ibama que iriam se concentrar no Mapa [Ministério da Agricultura e Pecuária]".

Segundo Pillon, a nova lei traz retrocesso em políticas de proteção do uso de agrotóxicos, já que autoriza o emprego "preventivo" dessas substâncias, antes mesmo de lavouras serem acometidas por pragas. "A nova lei incentiva o uso excessivo e desnecessário de agrotóxicos antes que exista uma justificativa agronômica real", avalia.

Outra entidade que se manifestou contra o chamado "PL do Veneno" foi o Inca (Instituto Nacional do Câncer), que divulgou nota no último dia 20 ressaltando os impactos nocivos dos agrotóxicos -posicionamento assumido pela instituição desde 2015.

"Na ocasião, recomendou a redução gradativa do seu uso até a sua eliminação por completo, bem como apoiou e incentivou a agricultura agroecológica, para a promoção da saúde e prevenção do câncer na população do campo e da cidade", diz o texto.

O QUE É O PL DOS AGROTÓXICOS?

- O PL (projeto de lei) 1.459, de 2022, aprovado em novembro pelo Senado, altera a lei 7.802, de 11 de julho de 1989, que trata desde a pesquisa até a comercialização, os registros e a fiscalização de agrotóxicos.- Após idas e vindas, o texto tirou a responsabilidade de aprovação de registros de agrotóxicos da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) e do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente) e a deixou sob a tutela do Ministério da Agricultura.- Outro ponto, pelo texto que passou no Congresso, é que os agrotóxicos com pedidos de reanálise (derivado de alertas ou desaconselhamento do uso por organizações internacionais) poderiam ser aprovados só pelo parecer do Ministério da Agricultura; a Anvisa teria caráter apenas "consultivo".QUAIS FORAM OS PRINCIPAIS VETOS DE LULA?- O presidente vetou o dispositivo que retirava da Anvisa e do Ibama as atribuições relativas à fiscalização do uso dos agrotóxicos- Também vetou trecho que dava ao Ministério da Agricultura poder exclusivo de avaliar alterações na formulação dos produtos já aprovados anteriormente- Lula barrou ainda, entre outros, item que desobrigava as empresas de colocar um aviso nas embalagens informando que o recipiente não pode ser reaproveitado

E O QUE O PRESIDENTE APROVOU?

- Há pontos sancionados por Lula que agradam a bancada ruralista e desagradam entidades de apoio ao meio ambiente e à saúde, como o prazo mais curto para análise de registros -de 24 meses-, enquanto agrotóxicos com fórmulas idênticas a de outros aprovados terão prazo de 60 dias

PARTILHE ESTA NOTÍCIA

RECOMENDADOS

fama boletim médico Há 15 Horas

Maidê Mahl está internada em estado grave, diz hospital

politica BOLSONARO-SAÚDE Há 9 Horas

Bolsonaro se sente mal e vai a hospital antes de ato na avenida Paulista

fama Redes Sociais Há 9 Horas

Suzana Alves, ex-Tiazinha, mostra rotina após se converter

fama Deolane Bezerra Há 9 Horas

Carlinhos expõe afastamento de Deolane antes de prisão

fama ELIEZER-CARMO Há 13 Horas

'Nunca quis ser pai, estava pouco me lixando', diz Eliezer

politica Governo Há 13 Horas

Lula demite Silvio Almeida após acusações de assédio sexual

fama Bets Há 14 Horas

Com Deolane presa, irmãs postam publis do 'Jogo do Tigrinho'

justica Dartford Há 13 Horas

Amigo é suspeito de esfaquear casal de brasileiros na Inglaterra

brasil Maceió Há 7 Horas

Estudante aponta arma para colega durante briga em faculdade; vídeo

fama Carnaval Há 15 Horas

Ex-BBB 24, Alane Dias será musa da Grande Rio em 2025