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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Tomada por diversas emissoras durante as eleições de 2020, a decisão de suspender a transmissão de declarações radicais de Donald Trump voltou a se tornar recorrente no contexto da atual corrida pela Casa Branca.
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Na última segunda-feira (15), logo após o empresário confirmar as expectativas e derrotar seus correligionários na primeira batalha pela nomeação republicana do candidato à Presidência, em Iowa, a emissora americana CNN interrompeu a veiculação de seu discurso de vitória.
A fala vinha sendo transmitida sem interrupções por cerca de dez minutos, mas, quando o empresário começou a falar sobre "imigrantes invadindo os EUA", o âncora Jake Tapper assumiu a transmissão.
"Aqui [vemos] Donald Trump declarando vitória com números historicamente fortes no caucus de Iowa. Aqui está ele, e enquanto eu falo, você o ouve repetindo sua retórica anti-imigração", afirmou o jornalista, seguindo com a cobertura da noite sem voltar a Trump.
O caso não é isolado -na MSNBC, por exemplo, nenhuma parte do discurso do republicano foi exibida. A âncora Rachel Maddow afirmou que o canal "ficaria de olho" no ex-presidente. "Vamos informar se houver alguma notícia nesse discurso", disse, emendando: "se houver algo notável, substancial e importante".
"Não é uma decisão que tenhamos gostado de tomar, é a revisamos regularmente. E, sinceramente, não é uma decisão fácil", disse a âncora sobre a escolha de não reproduzir a fala de Trump ao vivo.
As interrupções serviram de munição para o empresário retomar seus ataques à imprensa. Em um discurso em New Hampshire no dia seguinte, terça-feira (16), o republicano acusou os canais de serem desonestos.
"A NBC e a CNN se recusaram a transmitir meu discurso de vitória. Francamente, eles deveriam ter suas licenças ou seja lá o que for tiradas deles", disse Trump.
A conduta das emissoras não é novidade. Em abril, quando o ex-presidente fez um discurso em Mar-a-Lago, seu resort de luxo na Flórida, ao se tornar o primeiro ex-presidente dos EUA réu por uma acusação criminal, a MSNBC também decidiu não transmitir a fala.
O canal apenas exibiu a imagem de Trump discursando enquanto Maddow, que apresentava o telejornal naquele momento, explicava o posicionamento do veículo. "Há um custo para nós, como uma empresa jornalística, em transmitir falsidades conscientemente", disse ela. "Nosso acordo com os espectadores é monitorar essas declarações. Se ele disser algo noticioso, reportaremos imediatamente."
A ABC News chegou a transmitir o início da fala, mas a interrompeu no momento em que Trump declarou que a administração do democrata Joe Biden provocaria uma "Terceira Guerra Mundial nuclear".
Após deixar a Presidência, Trump parou de ter acesso direto aos telespectadores por meio de transmissões ao vivo em emissoras privadas -nesse período, até mesmo a Fox News, que não esconde sua simpatia pelo republicano, parou de veicular suas falas em tempo real.
Com a sua derrota na eleição presidencial de 2020, vários veículos ainda optaram por evitar reproduzir suas falas de modo a não dar espaço para suas alegações, sem provas, de que ele seria o real vencedor do pleito.
Um ponto de inflexão nesse sentido foi o discurso que Trump fez em 5 de novembro, dois dias depois da votação que deu vitória a seu rival e atual presidente. "Se você contar os votos legais, eu ganhei com facilidade", disse o republicano na ocasião. A MNSBC cortou a transmissão. CNN e ABC, por sua vez, optaram por deixar claro que as alegações eram falsas.
A imprensa escrita também deu tratamento especial ao pronunciamento. O Wall Street Journal, por exemplo, evitou chamar a notícia da declaração em sua página inicial, e o tabloide New York Post noticiou a fala com o título "Abatido, Trump faz acusações infundadas de fraude eleitoral". Já o New York Times deu em letras pequenas a chamada "Trump quebra o silêncio em declaração cheia de falsidades."
Mesmo antes disso, porém, algumas redes já tinham inaugurado a prática de tirar seus pronunciamentos do ar subitamente. Foi o caso da mesma MSNBC em 2019, que interrompeu a primeira entrevista de Trump a jornalistas após democratas abrirem uma investigação formal de impeachment contra ele sob a justificativa de que o então presidente não estava dizendo a verdade.
Em fevereiro de 2023, veio a público um documento judicial da Dominion Voting Systems que dizia que Trump teria tentado ligar para a Fox News no dia em que seus apoiadores invadiram o Capitólio, em janeiro de 2021, e que a rede teria se recusado a deixá-lo discursar ao vivo. A empresa, cujos equipamentos foram usados nas eleições de 2020 nos EUA, processou a emissora por difamação.