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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal), pediu vista e suspendeu, nesta terça-feira (20), o julgamento de uma ação bilionária contra a União. O caso envolve contrato de compra e venda de pinheiros, em 1951.
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Trata-se uma licitação vencida pela Companhia de Madeiras do Alto Paraná S.A. para a compra de 300 mil pinheiros que faziam parte de bens de empresas incorporadas pela União em 1940.
A companhia porém, não recebeu dois terços das árvores que constavam no contrato.
No recurso, agora paralisado por Nunes Marques, a União pede o prosseguimento do caso no STF para anular sentença do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) que impôs indenização de aproximadamente R$ 1 bilhão por não cumprir o contrato de compra e venda dos pinheiros.
No caso de mais de 70 anos atrás, os bens eram administrados pela SEIPN (Superintendência das Empresas Incorporadas ao Patrimônio Nacional), autarquia que depois passou a ser incorporada como órgão da União.
O julgamento no STF começou no dia 9 de fevereiro e tinha prazo para terminar nesta terça-feira. O recurso está empatado na corte, com 5 votos em favor da União e 5 contra.
A sessão foi iniciada em plenário virtual. Nele, os ministros depositam os votos, sem a necessidade de debate. Agora, o prazo para o processo voltar à pauta do plenário do Supremo é de até 90 dias corridos.
A relatoria do caso é da ex-presidente e ministra aposentada Rosa Weber, que decidiu monocraticamente em 2022 negar seguimento nos recursos interpostos pela União, argumentando que, para acatar os argumentos da defesa, seria necessário reexaminar os fatos e as provas dos autos sobre os valores cobrados, o que não é cabível em recurso.
A partir de um novo recurso, então, o caso foi parar no plenário do STF.
O ministro Dias Toffoli, que também pediu vista, divergiu de Rosa Weber em favor da União sendo acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Roberto Barroso, Cristiano Zanin e Edson Facchin.
Já Carmen Lúcia, Gilmar Mendes, André Mendonça e Luiz Fux seguiram a decisão de Weber.
HISTÓRICO DO CASO
A Companhia de Madeiras do Alto Paraná tinha sede em Buenos Aires, na Argentina, mas era autorizada a funcionar no Brasil graças a um decreto de 1907. A empresa, porém, tinha prazo para permanecer no país, que era até 1956.
Em 1951, a companhia firmou contrato com a SEIPN para a compra de 300 mil pinheiros. O preço total de venda na época foi de Cr$ 24.000.000,00, ou Cr$ 80,00 cada unidade.
A empresa alega que recebeu apenas 43 mil pinheiros. Após recorrer na Justiça do Rio de Janeiro, contudo, chegou a ser favorecida com mais 57 mil árvores, completando, assim, 100 mil.
Com base em uma perícia feita sobre os valores da época e a correção monetária para a atualidade, o TRF-4, então, condenou a Fazenda Pública a pagar cerca de R$ 1 bilhão decorrentes dos 200 mil pinheiros que faltaram ser entregues, em ação movida pelos herdeiros de um dos sócios da companhia, Alberto Dalcanale.
Ao longo do processo, a União chegou a questionar o valor dos pinheiros, mas sem êxito. A AGU (Advocacia-Geral da União) e o MPF (Ministério Público Federal) argumentam que já foram pagos dois precatórios, o primeiro em 24 de agosto de 1990, no montante de Cr$ 64.024.485,07, e o segundo em 19 de maio de 1992, no valor de Cr$ 8.186.991.889,14.
Além de questionarem o valor exorbitante que ainda falta para pagar, argumentando que a "decisão judicial definitiva se baseou em perícia com erros materiais 'crassos'", a AGU e o MPF chegaram a pedir a anulação da decisão do TRF-4 sustentando que não há relação jurídica entre os requerentes dos pinheiros.
Acontece que o contrato foi firmado entre a Companhia de Madeiras do Alto Paraná e a SEIPN, mas a empresa deixou de existir legalmente no Brasil em 1956, sendo liquidada naquele ano. No processo consta que o conselho da dona da subsidiária brasileira, na Argentina, aprovou a prorrogação de sua permanência no Brasil, algo que, segundo a AGU e o MPF, não foi reconhecido pelas autoridades brasileiras.
Mas em 1970 a companhia alegou que pagou ao Banco do Brasil o valor de NCR$ 19.621,67, referente a um empréstimo que o banco deveria receber no âmbito do contrato de venda dos pinheiros.
"Ora, acreditar que o Banco do Brasil, sociedade anônima de economia mista, iria abrir conta corrente para a filial ou estabelecimento no Brasil de uma companhia estrangeira cujo prazo de duração já tinha expirado há muito é o mesmo que acreditar em histórias da carochinha", chegou a dizer a defesa da União no processo.
Em 1973, a dona da Companhia de Madeiras do Alto Paraná, na Argentina, declarou falência e foi liquidada, com a alegação de que a maior parte de seus bens estavam no Brasil, mas não conseguia regularizar a situação aqui por não ter recebido autorização para seguir com a atividade no país.
Nesse mesmo ano, a empresa entrou com uma ação contra a SEIPN para obter parte dos pinheiros. O presidente da comissão liquidadora, então, deu procuração para que Alberto Dalcanale, sócio no Brasil, recebesse o pagamento.
Após o falecimento de Dalcanale, seus herdeiros entraram na Justiça para receber o valor. Mas a AGU e o MPF alegaram que eles não têm legitimidade para receber o pagamento, questionando a procuração no nome de Alberto Dalcanale.
O caso foi parar no STJ (Superior Tribunal de Justiça). Após idas e vindas, o tribunal reconheceu que, mesmo sendo antigo, o assunto não deve ser ignorando e enviou ao STF a análise dos argumentos da defesa da União.
'VALOR DA INDENIZAÇÃO VIOLA REGRA CONSTITUCIONAL'
Hoje o principal argumento da AGU é que o valor da indenização deveria ser discutido no STF, "já que o laudo técnico que fundamentou a decisão judicial inicial violou a regra constitucional de que todas as decisões devem ser legitimamente fundamentadas ao apontar um valor exorbitante para a indenização".
Segundo a AGU, o laudo técnico considerou que todos os pinheiros da região vendidos à Companhia de Madeiras do Alto Paraná tinham o mesmo porte e largura, sendo de padrão máximo. Isso resultou, argumenta a AGU, em uma avaliação das árvores em valores superiores ao de mercado.
A Advocacia-Geral da União diz ainda que a questão ultrapassa os interesses das partes e envolve temas relevantes do ponto de vista econômico, político, social e jurídico.
"Os erros do laudo ferem princípios constitucionais, como da justa indenização, da moralidade e razoabilidade, além de gerar prejuízos indevidos aos cofres públicos", diz a AGU.