Derrota do PSDB em SP vira fantasma para Nunes e argumento para elo com Bolsonaro

Principal adversário de Nunes na disputa, Guilherme Boulos (PSOL) tem o apoio de Lula e busca nacionalizar o pleito

© Wilson Dias/Agência Brasil

Política ELEIÇÕES-SP 04/03/24 POR Folhapress

(FOLHAPRESS) - A derrota do ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB) em sua tentativa de reeleição em 2022 influenciou a decisão do prefeito Ricardo Nunes (MDB) de associar-se a Jair Bolsonaro (PL) na eleição municipal de São Paulo, apesar de apoiadores levantarem dúvidas sobre o custo-benefício do apoio do ex-presidente.

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O próprio ex-governador tucano, que vem aconselhando o prefeito nos bastidores, mencionou a Nunes a sua experiência para argumentar que a polarização nacional engoliu as disputas eleitorais como um todo e que não há espaço para que um candidato não se alie nem com o presidente Lula (PT) nem com Bolsonaro, como ele tentou fazer e não deu certo.

Principal adversário de Nunes na disputa, Guilherme Boulos (PSOL) tem o apoio de Lula e busca nacionalizar o pleito.

Para evitar repetir o fracasso de Rodrigo, que ficou de fora do segundo turno entre o bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o petista Fernando Haddad, Nunes optou pelo pragmatismo e buscou desde o princípio amarrar o apoio de Bolsonaro e evitar que o ex-presidente lançasse um nome mais à direita para concorrer.

Nessa empreitada, o prefeito teve o apoio do presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e do advogado e ex-secretário de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, que trabalharam para convencer o ex-presidente a apoiar Nunes e não lançar o deputado Ricardo Salles (PL-SP), que ficou sem legenda para concorrer.

Porém, nesse caso o cálculo era outro, igualmente pragmático. Se para Rodrigo a lição era que, sozinho, o centro não venceria, para os aliados de Bolsonaro a projeção foi a de que a direita bolsonarista, sozinha, não superaria Boulos na cidade onde Lula teve mais votos que o ex-presidente em 2022 (53,5% a 46,5%).

Naquele ano, antes que Bolsonaro lançasse Tarcísio, eles procuraram Rodrigo propondo que o tucano representasse o palanque do então presidente em São Paulo e que o hoje governador fosse o candidato ao Senado na chapa.

Rodrigo, no entanto, preferiu não se aliar ao bolsonarismo -acabou fazendo isso depois da derrota no primeiro turno, quando declarou apoio a Bolsonaro e Tarcísio, e recebeu o então presidente no Palácio dos Bandeirantes.

A memória da campanha de Rodrigo é evocada com frequência por aliados de Nunes, principalmente políticos do MDB e do PSDB, para justificar a aliança com Bolsonaro, apesar da série de ressalvas que esses líderes têm em relação ao ex-presidente, inelegível e cercado pelo inquérito que apura de tentativa de golpe de Estado a joias da Arábia Saudita.

De certa forma, a campanha de Rodrigo em 2022 se tornou um fantasma que ronda a pré-campanha de Nunes. Mesmo considerando a alta rejeição de Bolsonaro, auxiliares do prefeito dizem que não se pode correr o risco de repetir o que houve com o ex-governador, atropelado pelo candidato do ex-presidente em um movimento que não foi previsto.

Isso coloca Nunes numa situação delicada, com a obrigação de acenar aos bolsonaristas, mas tentando se livrar da rejeição desse campo na capital paulista.

Articuladores da pré-campanha de Nunes afirmam que não se pode desprezar a força eleitoral do bolsonarismo -a vitória de Lula em 2022, afinal, foi a mais apertada desde a redemocratização (50,9% a 49,1%).

Sem um candidato bolsonarista no páreo, Nunes teria condições de unificar os votos anti-Boulos e praticamente garantir sua vaga no segundo turno. Além do prefeito e do psolista, que brigam no topo das pesquisas, Tabata Amaral (PSB) corre por fora em terceiro lugar.

Políticos do entorno de Rodrigo afirmam que ele tinha convicção de que seria reeleito em 2022. De fato, havia uma série de elementos a seu favor, como o controle da máquina estatal, o apoio de quase a totalidade dos prefeitos, a coligação com o maior número de partidos e uma gestão com entregas -mesmas condições de Nunes hoje.

Entre os motes da campanha de Rodrigo, que exaltava sua experiência na gestão pública, estava o "nem direita nem esquerda", aposta que, vista com os olhos de hoje, é criticada por parte dos tucanos.

Rodrigo teve 18,4% dos votos, ante 35,7% de Haddad e 42,3% de Tarcísio.

"As pessoas não querem apenas governos bem avaliados, querem líderes com opiniões e posições claras", afirma Wilson Pedroso (PSDB), que coordenou a campanha de Rodrigo e apoia a reeleição de Nunes.

Desalojado do palácio, Rodrigo passou a maior parte de 2023 nos Estados Unidos, onde estudou inglês e negócios. De volta ao Brasil, deixou a política em segundo plano e abriu um escritório de advocacia tributária. Recentemente, vem retomando suas articulações e tem ajudado Nunes. Aliados acreditam que ele quer disputar o governo paulista em 2026.

O ex-governador esteve, por exemplo, entre as autoridades no palco da cerimônia de posse de Aldo Rebelo e José Renato Nalini na prefeitura, evento no último dia 19 que deu peso político à pré-campanha de Nunes.

Enquanto adota estratégia oposta à de Rodrigo em relação ao apoio de Bolsonaro, Nunes repete o tucano por outro lado ao defender a posição de centro, marca que o MDB quer imprimir no prefeito apesar do elo com o bolsonarismo -foi essa contradição que o ex-governador procurou evitar em 2022.

Na tentativa de obter o melhor de dois mundos, a pré-campanha de Nunes reivindica representar uma frente ampla, com apoiadores da centro-esquerda à extrema direita, o que dilui o peso de Bolsonaro.

"A gente pode extrair ensinamentos de toda eleição, mas a eleição para governador é uma eleição totalmente diferente da eleição para prefeito, porque o eleitorado é diferente.

Ainda assim, é claro que percebemos que o centro sozinho não ganha eleição. Então, precisamos construir politicamente uma composição vencedora", afirma o presidente municipal do MDB e secretário da gestão Nunes, Enrico Misasi.

A posse de Aldo e Nalini, que teve a presença do ex-presidente Michel Temer (MDB) e de outros líderes emedebistas, teve esse tom, numa espécie de contraponto à associação de Nunes com o bolsonarismo, que ficou evidente com a participação do prefeito no ato de Bolsonaro na avenida Paulista.

O emedebista não discursou na manifestação do último dia 25 e se manteve discreto no caminhão de som. Já no evento na prefeitura, na semana anterior, Nunes defendeu as vacinas e disse não estar preocupado "com questões ideológicas" ou com ir "para esquerda ou para a direita".

Leia Também: Pacheco e base de Lula no Senado barram pressão por anistia após ato bolsonarista

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