Governo Milei sugere que Mães da Praça de Maio inventaram cifra de vítimas da ditadura em vídeo

O número oficial, que até hoje é compilado pelo Registro Unificado de Vítimas do Terrorismo de Estado, é de 8.631 mortos e desaparecidos de 1976 a 1983, mas o próprio relatório reconhece que ele é subestimado

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Mundo ARGENTINA-DITADURA 25/03/24 POR Folhapress

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Neste domingo (24), data em que a Argentina relembra o aniversário do golpe que instaurou no país uma ditadura militar (1976-1983), a Casa Rosada divulgou em suas redes sociais um vídeo de 12 minutos com a visão do governo eleito sobre a repressão e a luta armada nos anos anteriores à implementação do regime.

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A produção rejeita a cifra de 30 mil vítimas do regime no período, adotada por movimentos sociais importantes do país, como o das Mães da Praça de Maio.

O número oficial, que até hoje é compilado pelo Registro Unificado de Vítimas do Terrorismo de Estado, é de 8.631 mortos e desaparecidos de 1976 a 1983, mas o próprio relatório reconhece que ele é subestimado.

O presidente Javier Milei republicou o vídeo em sua conta no X, o antigo Twitter, com a mensagem "por uma memória completa para que haja verdade e justiça".

Intitulado "Dia da Memória pela Verdade e Justiça", o vídeo tem formato de documentário e abre com o escritor Juan Bautista "Tata" Yofre lendo um trecho de um livro do tcheco Milan Kundera que diz que, "para liquidar as nações, o primeiro passo é tirar-lhes a memória".

Bautista lança a ideia de que a história da violência na Argentina dos anos 1970 e da ditadura "não foi contada de forma completa".

Em seguida, o ex-guerrilheiro Luis Labraña afirma que a cifra de 30 mil desaparecidos foi inventada pelas Mães da Praça de Maio num momento em que elas buscavam financiamento no exterior.

"Esses 30 mil serviram para buscar a verdade, ajudaram a realidade? Não. Fortaleceram o ódio e também começaram a obscurecer a verdadeira história", diz. A declaração foi rechaçada pela organização, uma das mais simbólicas da luta contra a ditadura na Argentina.

Ainda no vídeo, María Fernanda Viola, filha do capitão Viola, militar assassinado por guerrilheiros de esquerda dois anos antes da ditadura, diz que o governo Kirchner proibiu uma homenagem ao seu pai no cemitério onde ele está sepultado. "Acredito que, com a verdade, muitas feridas serão curadas."

Ela também ironiza os movimentos da esquerda que falam em direitos humanos e questiona o que foi feito dos seus direitos e dos de sua irmã, que eram crianças quando Viola foi assassinado. Por fim, chama a ditadura militar de uma "guerra" e diz que pessoas "de ambos os lados" foram mortas, concluindo que, quando se conta só uma parte da história, ela não está completa.

Antes da divulgação do vídeo pela conta oficial da Casa Rosada, a vice-presidente, Victoria Villaruel, havia publicado uma mensagem em que fazia referência ao número de desaparecidos e solicitava reparações às vítimas dos grupos armados da esquerda do período.

Villlarruel é notória revisionista quando se trata da ditadura argentina. Em setembro passado, já durante a campanha de Milei, ela organizou evento em Buenos Aires em que chamou esses grupos armados de terroristas por suas ações contra o governo militar e defendeu a indenização daqueles que eles feriram ou mataram.

Segundo a imprensa argentina, a ideia do vídeo é resumir o que Milei e, principalmente, sua vice defenderam durante a campanha: uma "memória completa" do período repressivo, ressaltando violências cometidas por grupos militantes contrários ao regime à época e pintando-a como uma "guerra".

Ainda de acordo com a imprensa argentina, o responsável pela obra é o produtor Santiago Oría, documentarista do presidente e um dos estrategistas de imagem de Milei.

Organizações de direitos humanos e movimentos de esquerda tradicionalmente realizam atos em memória das vítimas da repressão no dia 24 de março. Em Buenos Aires, as ruas foram tomadas por milhares de pessoas que clamavam que a ditadura não se repetisse nunca mais.

Leia Também: Milei mudará aposentadorias por decreto após fracasso no Congresso, diz jornal

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