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CLÁUDIA COLLUCCISÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com as baixas temperaturas no Rio Grande do Sul, médicos estão alertando para o aumento de casos de infecções respiratórias em crianças, especialmente as alojadas em abrigos devido às chuvas, e pedem que indústrias farmacêuticas doem medicações para prevenir essas condições.
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O foco das preocupações é o VSR (vírus sincicial respiratório), responsável por 75% dos casos de bronquiolite, doença respiratória que dificulta a chegada do oxigênio aos pulmões, e por 40% das pneumonias em bebês e crianças pequenas.
O último boletim InfoGripe, da Fiocruz, divulgado na quinta (16), mostrou um aumento de internações respiratórias causadas pelo VSR e pelo Influenza A em boa parte do país. O estado gaúcho vinha registrando alta de crescimento dessas hospitalizações, mas os dados não foram considerados nesse boletim, devido à dificuldade de atendimento da população atingida pelos eventos climáticos extremos.
Neste momento em que há um grande número de pessoas em abrigos, a situação deve se agravar. "As temperaturas estão caindo, então é uma situação muito propícia para a propagação desses vírus."
No caso da gripe por influenza, o governo gaúcho anunciou que pretende vacinar até segunda (20) toda a população em abrigos que ainda não foi imunizada neste ano.
Já para o VSR, há um medicamento indicado para a prevenção do vírus em bebês que está aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) desde outubro de 2023, mas que ainda não está disponível no mercado.
Trata-se do Beyfortus (nirsevimabe), da Sanofi, um anticorpo monoclonal, ou seja, uma proteína produzida em laboratório que imita a capacidade do sistema imunológico de combater o vírus.
Atualmente, o SUS já oferece o palivizumabe, da Astrazeneca, indicado somente para quadros graves de infecções respiratórias, com alto risco de hospitalização. Uma revisão da Sociedade Brasileira de Pediatria concluiu que o nirsevimab é mais eficaz na imunoprofilaxia (processos de prevenção) contra o VSR.
No mês passado, a Anvisa também aprovou o registro da vacina Abrysvo, da Pfizer, destinada a grávidas no segundo ou terceiro semestre de gestação para proteção do recém-nascido. No entanto, a vacina também não está no mercado brasileiro.
Há uma outra vacina aprovada no país contra o VSR, da GlaxoSmithKline, mas só para prevenir a doença respiratória em pessoas acima de 60 anos.
Em mensagem encaminhada às farmacêuticas Sanofi e Pfizer, Mariana González de Oliveira, professora de medicina neonatal da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre e Lucia Pellanda, reitora da universidade, solicitam a doação urgente da vacina e do imunobiológico para serem ofertados aos abrigados pelas enchentes.
"Estamos no auge da temporada de VSR, e isso criou um ambiente propício à propagação de doenças respiratórias, incluindo a bronquiolite por VSR, que pode ser particularmente grave em crianças pequenas", escreveram.
Segundo elas, as vacinas e os imunobiológicos contra o VSR são ferramentas cruciais na prevenção da doença e de suas complicações, especialmente em populações vulneráveis, como aquelas atualmente em abrigos. "Nossos hospitais já estão trabalhando no limite de sua capacidade e muitos deles ainda não têm água encanada."
Dada a situação crítica, elas solicitam que a Pfizer e a Sanofi considerem a doação urgente de um "número significativo" de doses das medicações para atender às necessidades dos abrigados. "A sua generosa doação teria um impacto significativo na saúde e no bem-estar das crianças que enfrentam um momento tão difícil."
Vários médicos se mobilizaram na causa. O oncologista pediátrico Cláudio Galvão de Castro Júnior, que tem atuado como piloto voluntário levando doações de medicamentos de São Paulo ao RS, diz que há uma grande preocupação com o VSR porque todos os anos ele infecta muitas crianças, o que provoca superlotação nas UTIs de Porto Alegre nessa época do ano.
Segundo ele, o vírus sincicial respiratório é muito prevalente na população, mas certos grupos são mais sensíveis. "Esse vírus é capaz de matar um paciente transplantado de medula, por exemplo. E um percentual pequeno de recém-nascidos, bebês de seis meses até um ano de idade, também podem ir parar na UTI e até morrer por causa dele."
A ideia, explica o médico, seria usar essas novas medicações nas populações mais vulneráveis, que estão em lugares coletivos, onde o risco de transmissão é maior e, com isso, tentar diminuir as internações nas UTIs. "Se a gente conseguir diminuir, dez, 15, 20 casos graves, teremos um impacto grande."
O imbróglio, segundo ele, é que as empresas não respondem se elas têm esses medicamentos disponíveis, mesmo que seja para a venda no exterior, já que ainda não estão sendo comercializados no Brasil. "A gente quer saber se tem para doar ou para vender e ninguém nos responde essa coisa básica."
Nas redes sociais, vários médicos gaúchos reforçaram o pedido. Segundo eles, o pico de transmissão do vírus sincicial deve ocorrer em poucas semanas, e há risco de colapso das emergências e UTIs.
O pneumologista pediatra Luciano Vitola pediu para que a Sanofi doe pelo menos mil doses do niverzimabe, e a Pfizer outras 2.000 doses da vacina. "Isso vai ser de altíssimo impacto para a saúde pública nas próximas semanas. A logística das UTIs está bastante complicada, a transferência dos hospitais da região metropolitana para Porto Alegre está muito complicada."
Em nota, a Pfizer afirma que, em relação à solicitação de doações da vacina materno-fetal Abrysvo, indicada para a prevenção de infecções causadas pelo VSR e aprovada no Brasil no mês passado, para gestantes e idosos, o imunizante está passando pelo fluxo regulatório determinado pelas autoridades nacionais e ainda não está disponível no país.
"A Pfizer não está medindo esforços para que Abrysvo chegue, num futuro próximo, às mãos dos brasileiros. E fará isso de forma ética, íntegra e parceira, atuando, como sempre, em conformidade com as exigências de nossa agência regulatória e dos demais órgãos governamentais envolvidos no processo."
Também em nota, a Sanofi afirmou que, em relação ao Beyfortus, imunizante indicado para prevenção contra o VSR, o produto ainda não está disponível no Brasil. "Após a aprovação pela Anvisa e recomendação pelas sociedades médicas, a Sanofi está trabalhando para garantir a disponibilização do produto no país o mais rapidamente possível."
A expectativa, segundo a farmacêutica, é que isso ocorra no segundo semestre de 2024. "Assim, diante da indisponibilidade do produto localmente, neste momento, a Sanofi está impossibilitada de atender a esta demanda especificamente, mas continuamos buscando dentro do nosso portfólio outras formas de apoiar a tragédia no RS."
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