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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Mais da metade (52%) dos brasileiros acha que as mudanças climáticas são um risco imediato para a população do planeta, enquanto 43% opinam que elas só representarão perigo para quem viverá daqui a muitos anos. Apenas 5% dizem que a crise do clima não representa risco algum.
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Os números são da pesquisa Datafolha divulgada nesta segunda-feira (1º), que trata das percepções e opiniões sobre as alterações no clima. O levantamento ouviu 2.457 pessoas de 16 anos ou mais em 130 municípios pelo Brasil, entre os dias 17 e 22 de junho. A margem de erro é de dois pontos percentuais, com taxa de confiança de 95%.
"O percentual de brasileiros que compreende a mudança climática é elevado em comparação a outros países (por exemplo, os Estados Unidos)", analisa Mercedes Bustamante, professora do departamento de Ecologia da Universidade de Brasília. Ela se refere a outros dados da pesquisa, que mostram que 77% das pessoas dizem acreditar que as mudanças climáticas são provocadas principalmente pelas atividades humanas.
A pesquisadora pondera, porém, que é interessante comparar esses índices com a divisão que aparece quando os entrevistados são questionados sobre os efeitos do aquecimento global. "Isso talvez seja uma indicação [de que há uma] percepção da existência do problema, mas ainda não [percebe-se] como seus mais variados efeitos já estão no dia a dia."
Estudos mostram que o planeta já aqueceu mais de 1,2°C desde o período pré-industrial (1850-1900), que marca o grande aumento na emissão de carbono pela humanidade, e que fenômenos climáticos extremos, como tempestades e ondas de calor, já estão mais intensos e frequentes.
O Datafolha aponta ainda que, para 58% dos entrevistados, a humanidade não conseguirá agir para reverter os impactos das mudanças climáticas. Menos de um terço da população (31%) acha que será possível retornar a um clima mais ameno, enquanto 7% dizem que isso não faz diferença para a humanidade e o planeta.
O patamar de descrença na capacidade da humanidade de reverter as mudanças climáticas varia de acordo com a escolaridade, sendo mais alto entre aqueles que têm ensino de nível médio (60%). No estrato da população com ensino superior, 36% acreditam na possibilidade dos humanos conseguirem frear a crise climática.
Apesar disso, a pesquisa mostra que a disposição dos próprios brasileiros para mudar atitudes que têm o poder de potencializar o aquecimento global é alta.
Quase a totalidade diz que concordaria em adotar atitudes simples, como trocar as lâmpadas de casa por modelos mais econômicos (99%) e reduzir o uso de plástico (94%), e os índices de aceitação são altos mesmo diante de uma atitude custosa, como colocar paineis solares em casa (89%) e pagar mais caro por produtos com baixa emissão de carbono (74%) ou para ter um carro elétrico (63%).
Para especialistas, o que pode parecer uma contradição pode ser, na verdade, apenas desesperança com a inação de governantes e grandes corporações -que são os maiores culpados pelas emissões de gases de efeito estufa e, portanto, os principais responsáveis por reduzi-las.
"A ciência mostra caminhos para a resolução da mudança do clima. No entanto, creio que a percepção de que não haverá reversão indica a avaliação da morosidade ou mesmo falta de ações políticas concretas e robustas para abordar as soluções", afirma Bustamante.
"A falta de ação das indústrias do petróleo e dos governos que são associados a elas, que financiam uma enorme quantidade de governos no mundo todo, está fazendo com que o planeta esteja indo por uma trajetória de aumento de temperatura médio da ordem de 3°C", afirma o físico Paulo Artaxo, pesquisador da USP.
"Isto pode comprometer muito a qualidade de vida das próximas gerações, e isso não é para o final do século, já é para as próximas décadas", acrescenta ele.
Para Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, rede que reúne mais de uma centena de organizações ambientais, o impacto dessa desesperança da população em reverter as mudanças climáticas pode ter um efeito nocivo, de diminuir esforços nesse sentido.
"Quando o ser humano pensa, 'olha, já que não tem jeito, então para que que eu vou me esforçar? Para resolver algo que não tem solução?'. Isso, inclusive, se reflete no voto, na escolha dos governantes que vão gerenciar a máquina estatal, que é quem vai resolver o problema", explica.
"Isso desencadeia um problema em cima do outro, porque é uma imobilização. E quanto mais passa o tempo, mais estreita vai ficar a janela para termos alguma esperança de solução", diz Astrini.