Decisão de contingenciar gastos gera embate no governo e preocupação com TCU

Uma ala da equipe econômica defende segurar despesas mesmo que a estimativa das contas públicas fique dentro do intervalo de tolerância, que permite um resultado negativo de até R$ 28,8 bilhões

© Servidor do TCU atuou para adiar julgamento do órgão, diz Lava Jato

Economia GOVERNO-GASTOS 03/07/24 POR Folhapress

(FOLHAPRESS) - A discussão sobre o contingenciamento de gastos para assegurar o alcance da meta fiscal de déficit zero em 2024 abriu um embate dentro do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Uma ala da equipe econômica defende segurar despesas mesmo que a estimativa das contas públicas fique dentro do intervalo de tolerância, que permite um resultado negativo de até R$ 28,8 bilhões. Em maio, a projeção indicava um déficit de R$ 14,5 bilhões.

A preocupação dessa ala é mostrar para o TCU (Tribunal de Contas da União) que o governo não está perseguindo o limite inferior da banda, apenas para cumprir a regra do novo arcabouço fiscal, mas sim o centro da meta.

A ideia, porém, enfrenta resistências de outro grupo, que vê com reservas a tese de que é preciso impor uma trava mais dura para mostrar à corte de contas e ao mercado disposição do governo em frear despesas.

Para esse grupo, o governo deve mirar o centro da meta, mas se o relatório projetar um resultado dentro do intervalo, não cabe contingenciamento.

Nos últimos dias, as incertezas em torno do compromisso do Executivo com o cumprimento das regras ajudaram a impulsionar a cotação do dólar, que chegou a passar dos R$ 5,70 durante os negócios na terça-feira (2).

O contingenciamento é necessário quando há frustração de receitas. Nessa situação, o governo precisa segurar os gastos para evitar o estouro da meta fiscal.

O próximo relatório de avaliação de receitas e despesas, relativo ao terceiro bimestre, será divulgado em 22 de julho. No estágio atual, apontar qualquer número seria especulação, pois os dados atualizados de gastos obrigatórios e da evolução da arrecadação ainda não estão prontos.

Um dos técnicos ouvidos pela Folha reconhece que, se as novas estimativas do Orçamento indicarem um déficit de até R$ 28,8 bilhões -dentro do intervalo de tolerância-, é possível que haja um racha na equipe econômica em torno da decisão sobre o contingenciamento.

Por isso, há até uma espécie de torcida para que a reavaliação aponte um resultado mais negativo do que a banda permite. Assim, a necessidade de congelar recursos seria inequívoca, e o embate se daria em torno do tamanho do bloqueio.

Nesta segunda (1º), o ministro Fernando Haddad (Fazenda) disse que o contingenciamento será do "tamanho necessário" para cumprir as regras do arcabouço fiscal, mas não deu detalhes.

Em junho, o TCU emitiu um alerta de que tomar o limite inferior da banda de resultado primário como referência para adotar ou não o contingenciamento pode elevar o risco de estouro da meta e "afetar a credibilidade das regras fiscais".

A decisão do plenário foi recebida por parte dos integrantes da equipe econômica como um recado importante sobre como o tribunal vai analisar a condução da política fiscal.

O tribunal ainda não se manifestou sobre outro aspecto relevante: a possibilidade de limitar o contingenciamento de despesas a R$ 25,9 bilhões, conforme previsto na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), sem que isso configure infração do gestor.

O Ministério do Planejamento enviou a consulta formal ao TCU sobre o tema, mas o processo ainda não tem data para ser julgado.O governo está otimista com o desfecho sobre o caso, apesar da manifestação contrária da área técnica. Ainda assim, o tom é de cautela.

Parte dos técnicos do governo diz que, sem decisão definitiva do tribunal até 22 de julho, a recomendação será efetuar o contingenciamento em valor mais conservador -mas sem paralisar a máquina pública- para evitar que eventual revés na corte de contas pegue o governo de surpresa.

Qualquer decisão diferente disso, segundo um dos técnicos, pode deflagrar um impasse e a resistência de gestores em assinar os documentos que formalizam as estimativas.

A avaliação da ala mais cautelosa é de que empurrar com a barriga e evitar agora um contingenciamento mais significativo pode, inclusive, criar uma armadilha para o próprio governo, que ficaria nas mãos do Congresso Nacional.

A lei complementar do novo arcabouço fiscal descriminalizou o estouro da meta fiscal, mas estabeleceu uma série de gatilhos de contenção de gastos. Um deles, como mostrou a Folha, pode tirar até R$ 16 bilhões de Lula em 2026, ano de eleições presidenciais.Nas palavras de um técnico, o descumprimento da meta "não mais derruba o presidente, mas o deixa sangrando".

Sem uma base consolidada no Congresso Nacional, o governo enfrentaria dificuldades para aprovar eventual flexibilização no alvo para 2024.

Já os opositores e a ala do centrão mais sedenta por emendas teriam uma poderosa moeda de troca para barganhar com o Executivo. Por isso, parte dos técnicos defende que, diante da "arapuca montada", o governo seja cauteloso e adote o contingenciamento ainda em julho.

Leia Também: 'Ruídos' sobre sucessão no BC e quadro fiscal afetam juros, diz Campos Neto

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