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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Em mais um dia de julgamento do caso que vem provocando ojeriza em todo o mundo, a mulher que foi dopada pelo marido ao longo de uma década para que fosse estuprada por desconhecidos na França disse nesta quarta-feira (18) que tem sido humilhada pelos advogados que representam os 51 réus.
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"Me tacharam de alcoólatra. Disseram que eu estava embriagada e que eu fui cúmplice", disse Gisèle Pélicot, 72, no tribunal de Avignon, cidade onde ocorre o julgamento. "É tão humilhante e degradante ouvir isso. Eu estava em estado de coma, e os vídeos atestam. Os peritos se chocaram. E eles são homens."
Gisèle sofreu ao menos 92 estupros de 2011 a 2020, segundo os investigadores. Ela era dopada com ansiolíticos pelo marido, que procurava outros homens para violentá-la. Para estimular que outras mulheres denunciem os agressores, a vítima abriu mão de um julgamento a portas fechadas.
O caso ganhou projeção e vem estimulando debates sobre a violência contra a mulher. Nos últimos dias, milhares de pessoas foram às ruas em várias cidades francesas para demonstrar apoio à vítima.
"Quando viram uma mulher dormindo, [os réus] não questionaram? Eles não têm cérebro?", disse ela, descrevendo-os como "homens degenerados". Para Gisèle, o "perdão não existe" em crimes dessa magnitude.
As declarações ocorreram após o primeiro depoimento de Dominique Pélicot, 71, o principal réu do caso. Ele admitiu os crimes contra ele e pediu perdão, "mesmo que [o caso] não seja perdoável". Também afirmou que os outros acusados sabiam que estavam cometendo estupros.
Além de Pélicot, outros 50 homens, com idades de 26 anos a 74 anos, são réus. Todos são acusados de estupro de vulnerável e podem receber penas de até 20 anos de prisão. No caso de Pélicot, também pesa a denúncia de violação de privacidade, uma vez que ele filmava os abusos.
O tribunal pediu aos presentes que não vaiassem os envolvidos sob o argumento de que eles são inocentes até que se prove o contrário. Ainda assim, as tensões aumentaram na audiência desta quarta.
Causando as discussões mais acaloradas do dia, dois dos advogados que representam homens instruídos por Pélicot pediram ao tribunal para exibir fotos que, segundo eles, levantam dúvidas sobre se a vítima estava inconsciente -o juiz permitiu a exibição das imagens.
Gisele Pélicot rejeitou veementemente as insinuações de que as relações sexuais foram consentidas. "Eles estão tentando me prender com essas fotos", disse ela. "No estado em que eu estava, eu absolutamente não podia responder. Eu estava em um estado de coma, e as imagens mostram isso."
O caso veio à tona depois da captura de Pélicot em 2020. Ele foi flagrado em um shopping filmando as partes íntimas de uma mulher, por baixo de sua saia. Nos dias que se seguiram à prisão, os investigadores encontraram em seus computadores cerca de 4.000 fotos e vídeos de sua esposa inconsciente e sendo estuprada por dezenas de homens.
O julgamento deu visibilidade ao uso de drogas para cometer agressões sexuais, uma prática conhecida como submissão química, e vem motivando debates em toda a França sobre o tema.
Desde o início do processo, ativistas e associações que atuam pelos direitos das mulheres reiteram pedidos a todos os homens que "assumam, por fim, sua responsabilidade" na luta contra a violência de gênero e "parem de ficar em silêncio".