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LUCAS LACERDA, PAULO EDUARDO DIAS, LUANA LISBOA, GABRIEL JUSTO E CLAUDINEI QUEIROZSÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Com ruas escuras, semáforos apagados e comércios fechados devido à falta de luz, moradores da Grande São Paulo enfrentaram neste sábado (12) as consequências de um apagão em larga escala que atinge a região -e que não tem prazo para acabar.
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A situação fez a capital paulista relembrar o caos de novembro do ano passado, quando uma chuva deixou milhões de pessoas sem luz, algumas por até uma semana.
Dessa vez, o apagão começou na noite de sexta (11), após uma tempestade que teve ventos de mais de 100 km/h e que causou o desligamento de 17 linhas de alta tensão. Ao menos sete pessoas morreram no estado.
Concessionária responsável pela distribuição de energia na Grande São Paulo, a Enel disse que inicialmente 2,1 milhões de clientes foram afetados. Até as 21h deste sábado, 1,35 milhão continuavam sem luz, sendo 870 mil na capital. O fornecimento de água também foi prejudicado em algumas áreas.Em entrevista coletiva, a Enel se esquivou de dar um prazo para o religamento da energia em todos os locais.
"Eu não quero passar uma previsão para vocês sobre a qual eu não tenho evidência real de que vamos conseguir atender", disse o presidente da Enel São Paulo, Guilherme Lencastre. A empresa diz ter recebido mais de 1 milhão de chamadas e que está priorizando os clientes críticos e as linhas de alta tensão.
É o caso do marceneiro Orlando Bind, 78. Diabético, ele necessita de aplicações de insulina, armazenadas em geladeira.
"É uma vergonha. Foi às 19h de ontem e até agora, nada. Coloquei a insulina em uma caixa de isopor com gelo. Vou ter que comprar mais gelo".
No caso de Rafaela Maurer, 30, moradora de Pinheiros, na zona oeste, a falta de energia durante mais de 12 horas afetou profundamente a rotina com seu filho recém-nascido. O bebê acabou de ir para casa após três meses internado na UTI.
"Ele ainda está se adaptando à nossa casa e quase não dorme durante a noite, então eu e meu marido precisamos ficar nos revezando na madrugada. Sem luz foi preciso fazer toda uma adaptação com lanternas e velas", conta.No apagão do ano passado, o casal ficou dias sem energia e perdeu tudo que tinham na geladeira.
Como estratégia desta vez, optaram por não abrir a geladeira de início. "Ficamos com medo de acelerar o processo de aquecimento das comidas e a gente perder o que tínhamos armazenado para a primeira semana do bebê em casa."
Situação semelhante acontece com a advogada Vanessa Ziotti, moradora de Jardim das Camélias, na extrema zona sul. Mãe de trigêmeos autistas de sete anos, ela tem passado por uma situação difícil com as crianças.
Ainda sem energia, conta que, além de ter perdido seis kg de carne na geladeira, a falta de luz desregulou a rotina dos filhos, peça essencial na redução da ansiedade e do estresse em pessoas no espectro.
As crianças se regulam ao tomar banho e, no fim de semana, usam os celulares para jogar, atividades que foram prejudicadas pela situação. "Os meus filhos já se agrediram, já bateram cabeça na parede, já estão sem dormir, já pararam de comer, então estou muito preocupada porque não tem previsão de quando vai voltar".
As áreas mais atingidas foram zonas oeste e sul, além de municípios como Taboão da Serra, Cotia, São Bernardo, Santo André e Diadema. A concessionária afirmou que as rajadas de vento "entraram" pela zona oeste e, depois, passaram pela zona sul, onde houve o maior número de estragos.
Os moradores lotaram os canais de comunicação da Enel. Em nota, a companhia afirmou que acionou um plano de contingência com 1.600 técnicos em campo, número que deve chegar a 2.500. "Em alguns locais, trechos inteiros da rede foram danificados e será preciso reconstruir quilômetros de rede, trocar postes, transformadores e outros equipamentos."A concessionária também disse que está disponibilizando 500 geradores para casos mais críticos e que tem dois helicópteros percorrendo as linhas de alta tensão para identificar falhas.
Além da falta de luz, os ventos fortes também causaram prejuízos. Moradora da zona oeste, Melissa Oliveira, 32, viu seu carro ser destruído por uma árvore.Quando a ventania começou, ela tentou sair de casa, mas foi impedida pelo namorado. "Olhei da minha janela e vi o tempo virando. Se meu namorado tivesse deixado eu sair, eu poderia estar agora sob o carro", disse à reportagem.
Melissa disse ter aberto um pedido de poda da árvore em frente a casa em fevereiro e, na mesma data, avisou a central 156 da prefeitura sobre o risco de queda. Ela afirmou que somente hoje soube que o pedido havia sido negado.O subprefeito da Lapa, José Marcelo Costa, disse que o pedido foi indeferido por ausência de informações, que deixaram a solicitação inconsistente.
Segundo a Defesa Civil estadual, as rajadas de 107,6 km/h em Interlagos, na zona sul, da capital foram as mais fortes já registradas desde 1995 pelo órgão.Na Granja Viana, o vendaval arrancou uma grande árvore perto do Alphaville da Granja, que caiu sobre a rede elétrica e atingiu um veículo que transitava pela avenida São Camilo.
Segundo a prefeitura de São Paulo, o volume médio de chuva na sexta-feira, de 13,3 milímetros, chegou a 11,8% dos 112,7 milímetros previstos para todo o mês de outubro.
Já a Prefeitura de São Paulo registrou 49 ocorrências entre 19h de sexta e 7h deste sábado. Foram dez chamados sobre galhos e árvores na zona leste, 19 na zona norte, seis na zona sul e 11 na regiões central e oeste. Ainda, houve um desabamento na zona leste e outro na zona norte -que também teve um deslizamento.
O Corpo de Bombeiros registrou, em todo o estado, 150 chamados para queda de árvores na região metropolitana até o início da manhã deste sábado.
Durante o temporal, uma árvore caiu em uma feira na rua Professor Nina Stocco, em Campo Limpo, na zona sul, atingindo duas pessoas. Uma vítima teve o óbito constatado pelo médico do Samu no local. A outra foi levada ao pronto-socorro da região.
Parte do bairro do Campo Limpo ainda estava incomunicável na noite deste sábado. A rede de telefonia e de internet sofria com um apagão no entorno da avenida Professora Nina Stocco A atendente de uma loja contou que desde cedo moradores procuraram o estabelecimento, um dos poucos com energia, para usar o wifi ou carregar o celular.
Em Bauru, no interior do estado, outras três pessoas e um cachorro morreram por volta das 18h após serem atingidos por um muro que colapsou com a força do vento e da chuva no bairro Samambaia, de acordo com a Defesa Civil.
Na Grande São Paulo, uma pessoa morreu em Diadema, de acordo com a Defesa Civil, atingida por uma árvore, e outra ficou ferida por um galho. Já em Cotia, segundo o Corpo de Bombeiros, duas pessoas morreram após o desabamento de um muro. Elas chegaram a ser socorridas inconscientes e em estado grave, mas não resistiram. Uma terceira vítima sofreu escoriações e também foi atendida, mas passa bem.