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Se o mercado editorial fosse comandado por mais mulheres, seria bem melhor, porque não há igualdade de gênero nesse setor.
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A afirmação foi feita pela autora bielorussa Svetlana Aleksiévitch em entrevista coletiva na tarde deste sábado (2), antes de sua mesa na Flip (Festa Literária Internacional de Paraty). A Nobel de Literatura é a grande atração do evento literário este ano.
Ela contou que uma vez viu a imagem de uma ministra da Defesa Civil na Suécia, em gravidez avançada, recebendo as tropas do país. "Se essas ministras da Defesa fossem mulheres, teríamos menos guerra e sofrimento no mundo."
Quando a jornalista começou a escrever sobre guerras, escutou que estava no lugar errado, já que em seu país espera-se que as mulheres façam poesias "sobre flor, amor". "Por ser mulher eu não poderia abordar esse tipo de tema pesado e sofrido, já que esta seria uma literatura masculina."
Svetlana pontuou outras diferenças entre relatos de homens e mulheres ao contar as entrevistas que está fazendo para seu próximo livro, sobre amor.Ao conversar com um casal que já se separou, a mulher lembrou com detalhes a maneira como eles se conheceram. Disse que o ex caminhou por um cano com um buquê de flores. Ao ouvir isso, o antigo companheiro comentou: "Mas fui tão idiota assim?".
"Meu problema é encontrar a chave para a voz masculina. Talvez os homens não tenham inclinação para a sinceridade, para expressar sua relação com o amor, principalmente a uma mulher perguntando."
LADO HUMANO
Sobre o papel da literatura, ela considera que qualquer cultura, assim como o jornalismo, precisa fortalecer seu lado humano. "Sou chamada de escritora das catástrofes, mas não me considero isso. Apenas coleciono a alma humana em cada situação difícil."
Falando novamente de igualdade de gêneros, ela disse que acha que o Brasil não deve estar tão distante disso porque o país tem ou teve ("Ainda não sei dizer) uma presidente mulher.
Svetlana contou que, ao conhecer correspondentes de guerra mulheres, sempre teve a impressão que a cobertura jornalística feita por elas era melhor que a dos homens.
"Na minha terra, os meninos são educados nessa cultura da guerra, como se fosse algo normal ou inevitável. Mas, para as mulheres, a guerra significa sempre morte e sofrimento."
A autora contou ainda que, depois de tanto tempo cobrindo catástrofes, perdeu a capacidade de testemunhar certos tipos de sofrimento. Hoje, por exemplo, ela não conseguiria mais ver uma pessoa morta num campo de batalha, porque choraria.
"Um cardiologista abre o peito [de um paciente] e não vai chorar sobre o coração aberto. Os jornalistas devem fazer como eles e encontrar forças."
Sobre os problemas que teve por escrever seus livros –como o exílio e livros confiscados–, Svetlana afirma, porém, que foi uma opção sua perseverar. "Meu medo maior é me cansar dessa luta cotidiana. Porque existem momentos de desespero, como o atual em minha terra, com uma sensação de desilusão."
Com informações da Folhapress.