O estilista mineiro Ronaldo Fraga emocionou o público nesta quarta-feira (26), ao mostrar sua coleção "El Día que Me Quieras: Uma Música, um Vestido, Muitas Estórias", no quarto dia da São Paulo Fashion Week (SPFW) e colocar 28 modelos transexuais para cruzar a passarela da semana de moda mais importante da América Latina.
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Antes do desfile começar, Fraga fez um discurso poderoso, de acordo com a revista Marie Claire: "Se aqui estamos falando do corpo como prisão do desejo, a roupa funciona como chave. As transgêneros se recordam do momento libertador em que usaram o primeiro vestido. Vocês verão uma coleção exclusivamente composta pelo mesmo vestido. Ela lembra o feminino de épocas glamourosas da década de 20, 30, 40. Parecem roupas de boneca de papel, como aquelas que encantavam as crianças antigamente. Mas a história não está na roupa, está nas vestes. Nesse universo complexo de gênero, identificação, corpo e desejo, a roupa é um escape. Para todos, aliás, e sempre, a roupa deveria ser um vetor de apropriação do ser. Ela é capaz de libertar como mostra a memória do simples uso da primeira saia, do primeiro salto e do primeiro batom." No backstage, o estilista continuou: "Eu falo de amor, de resistência, que é olhar para os invisíveis, para quem o Brasil não vê. Tentar enxergar poesia em terreno árido. É algo que a moda pode fazer e não faz".
O artista denunciou através de suas roupas uma triste e absurda realidade: o Brasil é o primeiro colocado no ranking das nações que mais matam travestis e transexuais no mundo, de acordo com uma pesquisa da organização não governamental (ONG) Transgender Europe (TGEU), rede europeia de organizações que apoiam os direitos da população transgênero. Ao todo, entre 2008 e 2014, foram registradas mais de 604 mortes no país.
A seleção das modelos foi feita através das redes sociais, no qual o produtor Fernando Valiengo ficou responsável pelo casting. De mulheres operadas a travestis, o anúncio da escalação era anônimo e contou com a participação da cearense Valentina Sampaio, escalada para desfilar anteriormente para a marca La Garçonne, e da top mineira Carol Marra, que declarou:
"Ronaldo deu voz a quem não tem voz, deu visibilidade a pessoas que são invisíveis. Todas as modelos do desfile eram trans e puderam contar uma história independente do seu gênereo, afinal a genitália estava tampada. Então elas mostraram uma roupa com beleza, feminilidade e dignidade, como quaquer outra modelo faz. Foi muito lindo".
O estilista é conhecido por sempre polemizar e questionar comportamentos em suas criações. Em 2009, por exemplo, ele colocou idosos na passarela de sua coleção inspirada na peça Giz, da companhia de teatro Giramundo, de acordo com o jornal Folha de S. Paulo.
Na última segunda-feira (24), a marca LAB Fantasma também emocionou o público na sua estreia na SPFW, ao encerrar o segundo dia colocando na passarela modelos negros e plus size.