© Raul Guilherme / Divulgação
Se Andrea Tonacci permanece como o mais secreto dos nossos grandes cineastas, isso se dá, em grande medida, porque sempre foi o mais avesso a marketing.
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Importava-lhe fazer seus filmes. E pensar sobre o cinema. Sobre a imagem, especificamente: como fazer para captar sua verdade. Paulo Emilio escreveu sobre ele que seu primeiro curta, "Olho por Olho", era estranhamente correto, um tanto acadêmico. Talvez fosse a necessidade de dominar a forma? Talvez o olhar do crítico. Uma coisa é certa: Tonacci se preparou meticulosamente para fazer exatamente o que queria.
O próprio Paulo Emilio se surpreenderia ao ver "Bla Bla Blá" e, em seguida, o primeiro longa de Tonacci, "Bang Bang". Hoje clássico, este filme espantou desde o início pela audácia da narrativa.
Era, mais que um longa, um conjunto de contos centrados sobre o personagem de Paulo Cesar Pereio.
Espécie de observação do nonsense nacional na virada dos anos 1970, o filme alinhavava diversas histórias: bandidos incompetentes, a aventura de andar de táxi, de um macaco que cantarola uma velha valsa de Lamartine Babo... Cada sequência impressionava o espectador, cada uma delas também entusiasmou Paulo Emilio.
Depois desse filme, lançado precariamente no circuito comercial graças ao empenho de Nelson Aguilar, seguiu-se uma série de trabalhos fora do circuito comercial, entre eles o documentário em que acompanhou um grupo de sertanistas no contato com os índios araras, registrado em "Os Araras" (1980).
Num período mais recente, soube transformar trabalhos de encomenda em obras notáveis, casos específicos de "Biblioteca Nacional" e "Teatro Municipal".
Em 2006, realizou sua última obra-prima, "Serras da Desordem", que lhe valeu o prêmio de melhor filme no Festival de Gramado.
Ali ele narra a aventura do índio Carapiru, separado de sua tribo durante um ataque de fazendeiros. Carapiru foi encontrado anos depois pelo sertanista Sidney Possuelo, vivendo com brancos, mas sem falar uma palavra de português, muito longe do local onde vivera com sua tribo.
Falso documentário, esse filme trata de vários assuntos caros a Tonacci: a solidão, a separação, a distância. Mais do que tudo, no entanto, é um momento lancinante no final que nos leva a perceber a mais profunda preocupação do cineasta: a imagem.
É quando ele constata que desse homem de quem tudo foi levado ainda havia algo a roubar: sua imagem. E isso quem fazia era o homem da câmera. Quisesse ou não quisesse: era seu destino.
Andrea Tonacci, que finalizou esse filme com sua última companheira, a montadora Cristina Amaral, nasceu em 1944 na Itália e recebeu em 2010 a Ordem do Mérito Cultural: irônica homenagem oficial a um dos menos oficiais dos nossos talentos. Com informações da Folhapress. (Inácio Araujo)