© Fernando Frazão/ Agência Brasil
Um dos responsáveis pela defesa de Sérgio Cabral (PMDB) nas 12 ações penais contra o ex-governador do Rio de Janeiro, o advogado Rodrigo Roca afirma que seu cliente é visto como um "troféu" pela força-tarefa da Operação Lava Jato no Rio.
PUB
+ Polícia prende ex-chefe da Casa Civil do governo de Mato Grosso
Roca diz que há "uma potencialização da versão dos delatores", o que ajuda os procuradores a criarem um "grande demônio" para taxar como "inimigo público".
Cabral reconhece o uso pessoal de sobras de caixa dois de campanha, bem como relação com os doleiros Renato e Marcelo Chebar, que firmaram delação premiada.
Contudo, diz que os dois gerenciavam seu dinheiro irregular dentro do país. Ele nega ter acumulado US$ 100 milhões no exterior, como eles relatam, bem como ter arrecadado propina, como afirmaram executivos da Odebrecht, Andrade Gutierrez e Carioca Engenharia. "Se tem 4, 5 fatos verdadeiros, pensa que está automaticamente autorizado a dizer que o 6º também é. Mas não é", afirma ele.
A estratégia de defesa visa desacreditar a delação dos doleiros e a confissão de Luiz Carlos Bezerra, amigo de infância de Cabral apontado como responsável por coletar e distribuir a propina.
Pergunta - O sr. ainda vê chances de Sérgio Cabral ser absolvido?
Rodrigo Roca - É claro. Se não acreditasse, não estaria na causa.A tese de uso de sobras de caixa dois de campanha já não é o reconhecimento de crimes?Roca - Poderia cogitar um crime de apropriação. Pela linha de inquirição do magistrado [Marcelo Bretas] e do Ministério Público Federal, ainda não está muito clara a diferença entre corrupção, propina, e o dinheiro que é doado, com o qual se faz um mau uso, mas sem contrapartida, sem vantagem. Pode-se dizer que há um problema. Mas não é nada parecido com o descrito nas intermináveis ações penais.
Ao reconhecer esses erros, ele não deveria buscar uma pena justa, em vez da absolvição?
Roca - Não, até porque ele deve ser julgado com a imputação que foi feita. E ele não reconhece crimes. Ele reconhece um desvio de conduta e que usou dinheiro de caixa dois. Se houvesse alguma figura criminal que abarcasse essa conduta, poderia ser punido por isso. Mas em absoluto crimes contra o mercado financeiro, lavagem de ativos, branqueamento de capitais, etc.
Essa é uma estratégia usada pelo [ex-presidente Fernando] Collor na ação penal contra ele.
Roca - Quando se fala da acusação, é uma versão, tese. Quando se fala da defesa, é uma estratégia. Ninguém admite, nem por hipótese, que ele não tenha cometido os crimes que estão dizendo. São duas versões. Não é porque está numa denúncia que é verdade.
O caso do ex-governador tem a materialidade, como as joias e todo o estilo de vida.
Roca - Não materializa pelo seguinte: eu ganho R$ 1.000 e tenho padrão de vida de R$ 2.000. É incompatível com meus vencimentos. Mas se eu ganho os mesmos R$ 1.000, e tenho padrão de vida com R$ 1 milhão também é incompatível. O que está acontecendo é que as pessoas não estão mensurando isso. Ele admitiu a compra de joias, mas não nesse montante. A maior prova disso é que não acharam as principais joias. Não acharam porque não existem.Uma das estratégias é colocar em dúvida a versão dos doleiros Renato e Marcelo Chebar.
Por que eles entregariam US$ 100 milhões para incriminar Cabral, esconder outros supostos clientes e ficar sob o risco de ter o acordo desfeito?
Roca - Eles estavam sob risco de investigação em outros países. Era uma questão de tempo até chegar a eles. Se descobrirem amanhã que eles mentiram, o que pretendo provar, eles já estão em Portugal. Vamos ver se vamos conseguir achá-los.
As informações da tabela entregue por eles foram confirmadas: pagamento de joias, voos de helicóptero...
Roca - Há uma cegueira em relação aos fatos e uma potencialização da versão dada aos delatores. Ela coincide, em alguns pontos, até determinado momento. O ex-governador de fato teve conta no exterior nos anos 1990, eles depois pagavam contas do ex-governador aqui no Brasil.
Se tem três, quatro, cinco fatos verdadeiros, pensa que está automaticamente autorizado a dizer que o sexto também é. Mas não é. Vamos sempre terminar com uma planilha de Excel e o medo da prisão. Tenho esperança que o doutor Marcelo Bretas [juiz responsável pelos processos da Lava Jato no Rio] me permita investigar a vida desses senhores no exterior [a defesa do ex-governador solicitou que a Justiça da Suíça e Andorra sejam questionadas sobre processos e investigações contra os doleiros]. Se eles mentiram, o acordo seria invalidado. Seria a ruína da estratégia acusatória.
Há também os depoimentos de Luiz Carlos Bezerra, amigo de infância do ex-governador que controlava a movimentação, e não firmou delação. Como explicar?
Roca - Tem que saber o que prometeram a ele, mesmo sem delação. Há réus que, de tão desesperados, acham que se eles apontarem o indicador para qualquer direção sua situação vai melhorar. O melhor alvo hoje em dia é o ex-governador.
O ex-governador é o político com mais processos na Lava Jato. Como avalia isso?
Roca - Os atores forenses volta e meia criam os grandes demônios, que taxam como inimigos públicos. O que me preocupa é que o ex-governador tenha se tornado um troféu. Por essa razão tem havido tanto empenho na caça a uma pessoa que está presa, que não teria condição de fugir para lugar nenhum.Há pouco tempo, sexta-feira sim, outra não, tinha a divulgação de uma denúncia, para não deixar o tema arrefecer na opinião pública. Sérgio Cabral virou o depositário do ressentimento de algumas autoridades contra o governo. Só que ele está longe do governo há três anos e meio.
Falou-se em algum momento em delação do Cabral. Isso pode ocorrer?
Roca - Isso foi uma ideia antiga, de seis meses atrás, e não contaria com meu apoio profissional. Se não fosse um grande mal entendido, ofereceria minha renúncia.
Por quê?
Roca - Foi um instituto mal importado. Nos países em que ele foi adotado, se beneficia alguns, para alcançar um número maior. Aqui essa pirâmide se inverteu. Beneficiam a muitos para buscar um. Com informações da Folhapress.