© Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil
Luiz Carlos Velloso, Marco Antônio de Luca, Miguel Iskin, Wagner Jordão e Álvaro Novis, presos da Lava Jato no Rio, estavam sentados no ônibus da Seap (Secretaria de Administração Penitenciária) aguardando transferência do Complexo Penitenciário de Bangu para a cadeia pública José Frederico Marques, em Benfica, quando um novo detento se juntou ao grupo.
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Identificando-se como "Catatau de Gardênia Azul", ele deu um urro de saudação para os presidiários do outro lado da tela de metal que dividia o ônibus em grupos de seis.
"Quem é que tá aí?", perguntou um dos detentos para "Catatau".
"São os coroas gente boa da Lava Jato", respondeu ele."Bando de filha da puta! É por causa deles que eu roubei e estou aqui!", retrucou um deles. Por todo o trajeto, os detentos da Lava Jato foram ouvindo ofensas.
O contratempo foi um dos momentos de tensão vividos pelos presos no sistema penitenciário do Rio.A passagem do ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e seus supostos comparsas por Bangu foi repleta de suspeitas de regalias. Imagens do circuito interno mostravam livre trânsito deles pela unidade. Para o Ministério Público Federal, os benefícios cessaram em Benfica.
Ainda assim, a vida dentro do sistema para alguns não foi fácil. Um dos que mais sofreram foi Miguel Iskin, preso três dias após uma cirurgia no fêmur. O empresário, acusado de superfaturar equipamentos médicos, tinha dificuldades para realizar movimentos simples, como sentar-se ou trocar de roupa.
Iskin encontrou no empresário Eike Batista uma espécie de escudeiro. O fundador do grupo X passou a auxiliá-lo nas tarefas básicas diárias, como se vestir.
Eike, atualmente em prisão domiciliar, passou a dividir cela com Iskin em Bangu após deixar o espaço que dividia com Wagner Jordão Garcia. Pediu para trocar de cela temendo ser "contaminado" pela depressão profunda do ex-assessor da Secretaria de Obras, responsável por recolher a propina da pasta.Em Bangu, Eike também teve outras surpresas. Era frequente chegar a ele cartas de amor de presas desconhecidas do presídio feminino Nelson Hungria.
UNHA ENCRAVADA
Ocupar a mente é um dos desafios na cadeia. O ex-secretário de Saúde Sérgio Côrtes recebeu autorização para trabalhar como médico e faz quase 30 atendimentos por dia. Côrtes ressuscitou, com massagem cardíaca, quatro pessoas em Benfica. Ele costuma anotar num prontuário de forma detalhada cada atendimento -entre eles o joelho de Luca, acusado de superfaturar quentinhas.
O ex-secretário relatou parte de sua rotina em carta ao juiz Bretas, com fotos dos doentes na cadeia.Outro considerado "herói" em Benfica é o ex-secretário Wilson Carlos: ele permaneceu oito meses preso em Curitiba, distante dos demais, e não se tornou delator.
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Cabral pediu -e conseguiu- trabalhar na biblioteca. Passa o dia lendo, organizando e distribuindo os livros do local. A cada obra lida, são quatro dias a menos de pena.
O ex-governador é também um dos "tarados por notícias", segundo relatos. Não perde um telejornal no pequeno televisor que cada cela pode ter. Uma das últimas notícias que mais o irritou foi sobre o depoimento de Fernando Cavendish, ex-dono da Delta, que o acusou de cobrar 5% de propina no contrato do Maracanã -os dois eram amigos. Ele nega a cobrança.
Os detentos também demonstraram capacidade de adaptação para conseguir aproveitar a comida que familiares levam em visitas. A Seap permite entrada de três sacolas semanais por preso.
As marmitas são guardadas num "cooler" adaptado para não estragar. Eles compram um saco de gelo na cantina do presídio todo dia -o que é permitido-, jogam dentro de um balde, em seguida vedado com pano e fita crepe. A comida é requentada em banho-maria, com um aquecedor portátil elétrico para ferver a água.
Na antevéspera do depoimento sobre a suposta propina paga por Eike, o ex-governador sofreu outro desafio prosaico: uma unha encravada. Foi socorrido por Verônica Vianna, mulher de Côrtes.
Em Benfica, os presos da Lava Jato estão no segundo andar, logo abaixo da triagem de detentos do Comando Vermelho, Amigos dos Amigos e Terceiro Comando Puro. Apesar da proximidade, não há contato com os detentos.
Eles costumam ser notados apenas quando há gol do Flamengo.
À algazarra, o ex-governador, vascaíno, costuma retrucar aos companheiros de cela em tom de pilhéria: "Gol da mulambada". Com informações da Folhapress.