No exterior, brasileiros criam grupo para fortalecer democracia do país

Coletivo Andorinha surgiu há quase dois anos, em Portugal, e desde então promove manifestações, palestras e debates sobre o cenário político do Brasil, com o objetivo de ajudar conterrâneos e estrangeiros a compreender melhor a nação

© Igor d'Angelis / Divulgação / Coletivo Andorinha

Política Lisboa 31/10/17 POR Mariana Vilela

Dezenas de pessoas reunidas para protestar, faixas e cartazes erguidos, gritos em coro defendendo a manutenção do resultado das eleições presidenciais de 2014. A manifestação poderia estar sendo realizada em qualquer cidade do Brasil, mas esta ocorria no Largo de Camões, em Lisboa, e dava o primeiro passo para a criação do Coletivo Andorinha – Frente Democrática Brasileira de Lisboa.

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É em Portugal que vive a segunda maior comunidade brasileira fora do país, perdendo apenas para os Estados Unidos. E foi lá que um grupo formado basicamente por universitários decidiu “apresentar uma contranarrativa do que estava acontecendo politicamente no Brasil”, como destaca Samara Azevedo, uma das fundadoras do grupo, que ainda é atriz e, atualmente, mestranda na capital portuguesa.

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Segundo ela, apesar de o primeiro ato ter ocorrido no dia 18 de março de 2016, foi apenas durante o 4º Seminário Luso-Brasileiro de Direito, organizado pela Faculdade de Direito de Lisboa e pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) ─ que tem entre os seus sócios o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes ─, entre 29 e 31 de março, que o coletivo “ganhou corpo”.Neste seminário, organizado por Gilmar Mendes, junto com a referida faculdade, grande parte da ala golpista, incluindo Michel Temer, José Serra e Aécio Neves, estaria em Lisboa para debater a crise. Então aquele grupo, que já havia se reunido no Largo de Camões, se organizou para estar presente durante o evento. Cerca de 300 pessoas foram até lá para protestar contra o frágil processo de impeachment, que ainda não tinha se consolidado”, lembra.

Do lado brasileiro, à época, alguns setores contrários ao impeachment também questionaram o evento, alegando que o encontro seria apenas uma “desculpa” para que a oposição se reunisse, no exterior, a fim de debater a saída da petista e um eventual governo de Temer.

Ainda segundo Samara, as informações que chegavam a Portugal não davam a real dimensão da crise política vivida pelo Brasil. “Como a mídia tradicional brasileira é controlada por alguns grupos, e é totalmente parcial e engajada com seus próprios interesses econômicos, não é por meio dela que uma discussão mais profunda do que acontece além-mar vai chegar aqui. É nesse espaço que a gente quer estar. Para dar outras versões dessa história do agora”, destaca.

Além de brasileiros, o Coletivo Andorinha também conta com a participação de portugueses. É o caso de Paulo Jorge da Silva. Depois de viver no Brasil, entre 2002 e 2008, passando pelo Rio de Janeiro (RJ) e por Salvador (BA), ele resolveu se juntar ao movimento. “Eu estive no Brasil a trabalho, para fazer a implantação e gestão de redes e segurança informática de uma multinacional”, conta o engenheiro de sistemas.

No coletivo, ele é apenas um dos integrantes, como faz questão de salientar, apesar de estar presente desde a fundação. “O coletivo é totalmente horizontal, não existe um idealizador, todos nós o somos”.

A posição também é defendida por Samara. “Não existem cargos formalizados ainda, e nem sei se haverá. Ninguém é representante de nada, não fomos eleitos e não pretendemos, por agora, pensar sobre isso, pois acho que estamos inseridos em outras lógicas”, diz. “Já sobre orientações políticas, é importante ressaltar que somos um movimento suprapartidário. Nossos integrantes são de diversas orientações político-partidárias, tanto brasileiras quanto portuguesas”, complementa.

Se para alguns sair do Brasil significa deixar de lado os interesses pelo país e por sua gente, para esse grupo é exatamente o contrário.

O coletivo é uma maneira de nos religarmos ao país, de contribuir com a tentativa de barrar os retrocessos que estamos sofrendo. Além disso, estar de fora e olhar para dentro é um privilégio maravilhoso. A gente consegue ver que existem outras possibilidades. Outros modos de fazer política, de viver em sociedade. As mudanças são possíveis”, afirma Samara.

Um ano e oito meses após ser criado, o Coletivo Andorinha já promoveu mais de 40 ações, desde intervenções de rua, mesas de debate e palestras. Na pauta, além do “Fora Temer”, manifestaram-se contra as reformas trabalhista e do ensino médio, e contra o decreto que extinguiu a Renca (Reserva Nacional do Cobre e Associados), na Amazônia, liberando a região para a exploração privada de minérios.

O grupo também vem sendo convidado para participar de eventos realizados por outras entidades, a exemplo das palestras com a ex-presidente Dilma e com o vereador por São Paulo Eduardo Suplicy, ocorridas em Lisboa e promovidas pelo núcleo do Partido dos Trabalhadores (PT) em Portugal.

“Também participamos do encontro mundial de coletivos do mundo inteiro, em janeiro deste ano, em Amsterdã, na Holanda”, lembra Paulo Jorge.

Independência

Eles ainda destacam que não recebem nenhum tipo de financiamento. “Todas as ações de rua foram pagas com ‘vaquinha’ feita no dia. De uns meses para cá, participamos de alguns eventos portugueses e conseguimos um caixinha. Mas é verba para imprimir papel. Não temos e nem queremos, por enquanto, pensar em uma direção financeira. Porque a gente não quer burocratizar o processo, não queremos dificultar a presença de quem quiser e precisar ser acolhido”, explica Samara Azevedo.

Já parcerias existem. “Com a Casa do Alentejo, que acolhe nossas reuniões e mesas de debate, e com o núcleo do PT em Lisboa”, acrescenta ela.

As reuniões, segundo a atriz, não têm uma regularidade, mas costumam ser comunicadas na página do coletivo no Facebook. “E é aberta a quem quiser participar”, destaca.

Questionados sobre o papel do Coletivo Andorinha, Samara e Pedro Jorge falam sobre a missão de “instrumentalizar quem está fora do país”, mas também destacam o poder das manifestações, ainda que com poucos participantes ou mesmo solitária, em um mundo cada vez mais conectado.A gente faz uma manifestação com 50, 100, 200 pessoas. Uma foto dessa manifestação corre o mundo. É difícil silenciar uma imagem. Então entendemos nossa potência comunicativa baseada nas imagens e vídeos que produzimos”, considera a atriz.

“Por meio da opinião que transmitimos, o movimento tem reflexos não apenas no Brasil, mas também na comunidade internacional, já que estamos na Europa”, avalia Paulo Jorge.

Samara ainda destaca os avanços alcançados no que se refere à compreensão do Brasil, seja pelos próprios brasileiros ou mesmo pelos portugueses. “Acho que nós do Coletivo Andorinha, de certa forma, contribuímos para isso”, orgulha-se.

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