Sucesso na TV e no YouTube, Raiza Costa lança livro: 'comida é carnal'

Em conversa com o Notícias Ao Minuto, Rainha da Cocada apresenta "Confeitaria Escalafobética"

© Editora Senac

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© Reprodução / Instagram raizacostaofficial

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Lifestyle entrevista 06/12/17 POR Raquel Lima


Cena 1: Enquanto ensina a derreter corretamente o chocolate, chef resolve tomar banho dele.  Cena 2: Ao fazer brownie em homenagem ao cãozinho, a mesma expert em confeitaria resolve colocá-lo (fofinho) ao lado dos ingredientes. Cena 3: Ao concluir uma torta, a cobertura caramelizada escorre da bandeja para a mesa e o take segue. As situações acima aconteceram, realmente, em alguns da centena de vídeos protagonizados por Raiza Costa, no YouTube e no canal pago GNT.

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“Criei essas cenas para mostrar que comida é carnal e que não devemos ter essa distância, pois comida é vida e vem da terra e não vivemos sem ela. Ela e nós somos praticamente a mesma coisa. Além disso, nenhum sonho de criança é tão recorrente quanto entrar em uma banheira de chocolate, não acha?”, defende a brasileira de 29 anos. “Comigo é tudo de verdade, até mostrar as fraquezas”, completa.

Pioneira, Raiza criou o primeiro canal de culinária do YouTube, o “Dulce Delight”. O leque de vídeos divertidos, informativos, além do carisma da própria confeiteira, que hoje tem mais de 572 mil inscritos, com vídeos que ultrapassam 13 milhões de visualizações, foi passaporte para a TV. A chef de pâtisserie - elogiada até por Gordon Ramsay durante participação no “Masterchef”, em 2012 - apresenta o “Rainha da Cocada”, programa exibido semanalmente pelo GNT. Nos Estados Unidos, tem uma série no Food Network, produz para marcas norte-americanas e tem uma produtora de vídeo que faz conteúdos de culinária para “um montão de gente”.

A criatividade e naturalidade com as quais Raiza lida com a comida são usadas para aliar receitas e assuntos como “a polêmica da censura aos mamilos nas redes sociais”, passeios por Nova York, cidade em que vive com o marido desde que foi admitida no The French Culinary Institute, e sobre a importância de comermos “comida real”. Raiza é contra conservantes, corantes e “gourmetização” de receitas simples.  O primeiro livro “Confeitaria Escalafobética” (Editora Senac) entrega a formação básica da chef: as artes visuais. As 400 páginas são uma ode à própria família (a quem agradece por ser exatamente como é), à confeitaria (com inúmeras receitas) e à arte (com uma diagramação que lembra a de um título sobre fotografia, por exemplo).

No início de cada capítulo, dou uma aula técnica sobre a química de certos ingredientes, reação, cuidado e depois durante as receitas vou dando as dicas para sucesso na elaboração de cada uma delas”, antecipa a autora.

Se “tentou me odiar, mas não conseguiu”, como brinca Raiza ao fim de alguns vídeos publicados no YouTube, veja, na entrevista abaixo, concedida por e-mail ao Notícias Ao Minuto, a história do livro, da culinária, da relação com os comentários “haters” e com o corpo positivismo.  

O “Confeitaria Escalafobética” tem a aparência de um livro de arte. Como foi a escolha desta estética?

Essa era a ideia, unir arte e gastronomia, duas vertentes já muito presentes no meu trabalho audiovisual. Gostaria de comunicar a confeitaria de um jeito irreverente, porém falando de questões sérias, como técnica francesa, respeito aos ingredientes e respeito a confeitaria de verdade.

Você acredita que há quem use um livro para cozinhar com tanto tutorial na internet? Quem é o leitor que espera atrair com “Confeitaria Escalafobética”?

Livros são atemporais, imortais. Essa representação analógica de um conteúdo que começou online me representa. Tenho playlists no Spotify, mas tenho coleção de vinil em casa. Existem coisas que são insubstituíveis e livro é uma delas. Ali é possível explicar em detalhes certos processos, mas sem se tornar chato. Tutoriais de internet, em sua grande maioria, tratam com superficialidade tudo, só um livro se aprofunda na complexidade das questões. Tanto  que tem gente interessada que mal lançamos e já estamos na lista da "Veja" como o quarto livro não-ficção mais vendido do país. Oba! ;)

Você usa algum livro para cozinhar?

Me "formei" com meus livros. Muito antes de frequentar a escola de culinária francesa em Nova York, eu já tinha o meu canal do YouTube, que o foi o primeiro dedicado à confeitaria da plataforma. Foram os meus livros técnicos, de faculdades de culinária, que me formaram antes de mais nada. Eu passo horas lendo e estudando reações técnicas na cozinha, para compreender profundamente o que se passa ali com os ingredientes e não somente me tornar um fantoche, reproduzindo receita que na primeira falha não vou saber identificar o motivo. Os livros técnicos te preparam para uma vida cozinhando, enquanto que uma mera receita só vai fazer o jantar de amanhã.  

Como foi que você chegou ao YouTube?

Comecei em 2010, quando notei que programas de culinária ainda eram muito estigmatizados como coisa de dona de casa e 'vovozinha'. Queria transformar esse meio em algo novo, que os jovens pudessem apreciar para perpetuarmos as nossas raízes culinárias. Com isso, o “Dulce Delight” nasceu, um programa inovador e nada ortodoxo, que trata a gastronomia com um respeito absoluto, porém ensinado de maneira casual, moderna, com uma comunicação honesta e genuína. Quando comecei, resolvi que queria todas as minhas influências ali, musica, stop motion, estampas, e claro, personalidade escalafobética, que é a minha. 

Por que decidiu, cinco anos depois de ser a primeira brasileira a cozinhar no YouTube, dividir as atenções com a TV?

Meus programas de TV sempre tiveram uma "production value" muito alta, ou seja, valor de produção. Isso quer dizer que, desde que comecei, já fazia uma produção que não cabia muito ali no Youtube e por isso tantas oportunidades surgiram para estar na TV. Pois eu já fazia um conteúdo para o Youtube com uma produção que, até então, só se via na TV. O Youtube me deu liberdade poética de mostrar para a TV que é possível fazer um programa com espontaneidade, sem ser engessado e muito divertido. Depois de me estabelecer ali, a Globo e o GNT me procuraram para criar um programa para eles e, assim, o "Rainha da Cocada" nasceu, com os mesmos princípios de antes, mas agora com uma produção maior... eu ainda tomo conta de tudo, desde as músicas que quero nos episódios até a cor do paninho que vai ficar na minha pia.

Em uma entrevista, você falou que gosta de ensinar a técnica, mas, ao mesmo, não tem aquele fanatismo com a calda que cai da bandeja, por exemplo. Pode comentar isso?

Como falei, comida é carnal, é organicidade, temos que aceitar a sua natureza também.

Parece que as pessoas, de modo geral, não sabem bem o que comem. Você concorda?

Concordo plenamente, especialmente em um mundo em que comida se tornou laboratorial. É tanta porcaria sendo feita com ingredientes impronunciáveis, abraçados por uma embalagem cheia de marketing, jurando que aquilo é a melhor escolha que você pode fazer. É muita informação nutricional e as pessoas estão perdidinhas. Por isso, eu insisto em dizer, consuma tudo que veio fora de uma embalagem, só assim você garante que o produto é de qualidade, pois foi a mãe natureza que te deu. Quanto àquele molho de tomate, à maionese e ao caldo de galinha embaladinho, digo não.

Em seus vídeos, você sempre fala sobre conhecer a origem do ingrediente e usar alternativas saudáveis a industrializadas. Por que é tão defensora desta causa?

Porque essa é única maneira de garantir que não estamos sendo enganados. Eu vejo gente comendo pão de forma que se diz saudável, lotado de açúcar e conservantes, enquanto um pão feito em casa leva apenas 3 ingredientes e esses "saudáveis" leva 37. As pessoas precisam começar a boicotar a indústria alimentícia porque ela não quer o nosso bem, ela quer número e nós somos apenas fantoches em suas mãos.

Você acha que é possível conciliar a vida moderna com a aproximação dos produtores, mesmo nas cidades grandes?

Tanto é possível que eu faço isso morando em uma das maiores metrópoles do mundo, Nova York. O consumidor tem um poder enorme nas mãos dele, o poder de escolha, e só com isso é possível mudar a indústria. Se as pessoas valorizassem mais o pequeno produtor, o tio mineiro que vende mel, o vizinho que faz queijo, estaríamos apoiando não somente seres humanos que merecem uma chance de mostrar o seu trabalho, mas pessoas que não vão adicionar cloreto de cálcio na sua comida. Comida de verdade vem de produtores de verdade.

O que você acha das tendências alimentares, tipo gluten-free e lacto-free?

Pura moda que a indústria alimentícia adora perpetuar com os nutricionistas endossando os conceitos. Uma coisa é você ser doente, outra é você achar que isso é saudável. Como falei, tem muita gente comendo pão glúten free com 37 ingredientes e achando que o mal mora no glúten do pão de fermentação natural com três ingredientes apenas. Falta conhecimento.

Qual a sobremesa mais gosta de comer? E de preparar?

Amo pudim e receitas "agudizadas", como creme brûlée, pudim e etc... Mas gosto muito de fazer vienoiseries, pães amanteigados, folhados. Acho o processo muito técnico e laborioso, quase uma meditação, dobra a massa, abre, dobra a massa e assim vai.

Seus vídeos carregam uma forte mensagem de 'corpo positivismo'. Como você chegou ao ponto de se colocar como uma mulher que se aceita, mesmo remando contra a imposição estética atual?

Não entendo a pergunta. Não entendo como uma pessoa possa não se aceitar. Não se aceitar é escolher não estar viva. É isso? Qual outra escolha temos? Somos o que somos, e essa atenção exacerbada à estética feminina é uma grande balela para falar de coisas que não importam. Muita mulher fazendo projetos incríveis, conquistando o mundo e a pergunta é sempre sobre beleza, cabelos e maquiagem. Isso para mim não é importante.

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