© Marcelo Camargo/Agência Brasil
Em manifestação enviada nesta segunda-feira (18) ao ministro Edson Fachin, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, requereu a homologação da rescisão dos acordos de colaboração premiada de Joesley Batista e Ricardo Saud.
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Ao longo das 45 páginas que integram o documento, a PGR rebate as alegações - tanto processuais quanto de mérito - que foram apresentadas ao Supremo Tribunal Federal (STF) pela defesa dos dois colaboradores, e reitera que eles descumpriram cláusulas dos acordos firmados com o Ministério Público Federal (MPF), em 3 de maio de 2017.
Ao mencionar a decisão tomada em 14 de setembro pelo então PGR, Rodrigo Janot, o documento destaca que o principal fundamento da rescisão, oficializada naquela data, foi a descoberta de que os colaboradores omitiram de forma intencional fatos criminosos dos quais participaram ou tinham conhecimento no momento da celebração dos acordos. Na manifestação, são descritos três episódios: a participação de Marcelo Miller como defensor dos interesses da J&F quando ainda era procurador da República, o pagamento de R$ 500 mil ao senador Ciro Nogueira (PP/PI) para mudar o posicionamento no caso do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, e a existência de uma contra bancária no Paraguai em nome de Ricardo Saud.
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Raquel Dodge frisa que, embora fossem de conhecimento dos colaboradores, uma vez que constavam de áudio que reproduziu uma conversa entre ambos, ocorrida em 17 de março, esses três fatos só chegaram ao conhecimento da Procuradoria-Geral da República em 31 de agosto. É que, inicialmente, essa era a data limite para a entrega de novos anexos e dados. As informações são da assessoria de imprensa da PGR.
A procuradora-geral frisa, no entanto, que o acordo condiciona a concessão do prazo à não existência de má-fé por parte do colaborador, exatamente o oposto do que ficou configurado no decorrer do procedimento administrativo. “Trata-se, portanto, de forte indício, e não mera especulação, a reforçar que os colaboradores agiram movidos pelo intuito de ludibriar o MPF e proteger aliados, em conduta claramente desleal e afrontosa ao pacto que fizeram nos Acordos de Colaboração Premiada e à justiça”, destaca.
Marcelo Miller
Em relação à participação do ex-procurador Marcelo Miller nas negociações firmadas por acionistas e executivos do Grupo J&F com o MPF, a procuradora-geral menciona uma série de indícios reunidos nos últimos três meses. Tratam de depoimentos, documentos e mensagens eletrônicas trocadas entre Miller, advogados do escritório Trench, Rossi e Watanabe e os próprios colaboradores, que deixam claro que ele atuou na defesa dos interesses de Joesley e Ricardo, antes do dia 5 de abril, quando deixou o MPF.
A manifestação menciona, ainda, resposta do escritório sobre o envio de fatura à J&F para o pagamento de R$ 700 mil por serviços prestados por Marcelo Miller nos meses de março, abril e maio. De acordo com a resposta, a forma como se deu esse procedimento não seguiu “os padrões internos para a realização de cobrança de honorários”. Além disso, o escritório admitiu que, quem de fato, trouxe o trabalho do cliente J&F para o TRW foi Marcelo Miller.
“Os atos que envolvem o ex-procurador da República Marcelo Miller, longe de terem menor potencial ofensivo ou apenaspontual, são conduta gravíssima, de extrema deslealdade e má-fé, sendo irremediáveis em razão da evidente quebra de confiança no sistema de justiça, que produziram”.
Ciro Nogueira
A estratégia adotada em relação ao ex-procurador Marcelo Miller se repetiu no caso do pagamento de propina ao senador do Piauí. Os colaboradores preferiram o silêncio no momento do fechamento do acordo. Como prova de que se tratou de uma omissão dolosa, Raquel Dodge menciona trechos da conversa entre Joesley e Ricardo em que fica claro que ambos pretendiam proteger o parlamentar. A transcrição do diálogo comprova essa intenção quando Joesley afirma ser fã de Ciro e diz que só o entregaria no final e se fosse preciso.
Raquel Dodge enfatiza que as informações só foram entregues à PGR após a divulgação, por parte da imprensa, de informações de que a Polícia Federal teria recuperado áudios possivelmente apagados pelos colaboradores. Também rebate a alegação apresentada pela defesa de que o caso era algo menor, cuja classificação como crime era desconhecida do empresário.
“Qualquer pessoa, ainda que sem conhecimentos jurídicos mínimos, diria o contrário, e o consideraria contrário ao Direito, ainda que não pudesse precisar o tipo penal. Não poderia ser diferente para Joesley Batista e Ricardo Saud, que têm capacidade plena e estão assessorados por advogados de elevado nível”, escreveu. A PGR lembra ainda que os colaboradores tiveram pelo menos duas oportunidades para relatar os fatos em cumprimento às obrigações pactuadas nos acordos mas preferiram não fazê-lo.