© Ricardo Moraes / Reuters
A Superintendência-Geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) informou nesta terça-feira (19) que investiga a atuação de um cartel de empreiteiras em obras do Rodoanel e do Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano de São Paulo realizadas durante os governos tucanos entre 2004 e 2015.
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A informação foi antecipada pela Folha de S.Paulo, que revelou os detalhes do esquema que operou de 2004 até 2015 em obras que custaram cerca de R$ 10 bilhões aos cofres públicos.
As investigações são desdobramentos da operação Lava Jato e resultado de um acordo de leniência fechado pela Odebrecht com o Cade e o Ministério Público Federal em São Paulo.
Segundo a Superintendência, este é o décimo terceiro acordo do gênero fechado no Cade referente à Lava Jato. Para desfrutar do benefício da leniência, a empresa e seus executivos confessam a participação no cartel, forneceram informações e apresentaram documentos probatórios a fim de colaborar com as investigações das infrações.
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De acordo com a superintendência, os acordos são relacionados exclusivamente à prática de cartel. Caso existam crimes envolvendo a formação e atuação do cartel (como corrupção), eles serão investigados pelo Ministério Público Federal.
RODOANEL
O ponto de partida foram as delações de executivos da Odebrecht. Ao Cade eles revelaram como funcionaram os cartéis do Rodoanel e o das obras viárias de São Paulo.
De acordo com eles, no Rodoanel, foi possível chegar a um esquema que envolveu pelo menos 22 empresas entre 2004 e 2007, começando com cinco grandes empreiteiras (Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Odebrecht, OAS e Queiroz Galvão).
Essas empresas, relatam os colaboradores, começaram a fazer acertos pelas licitações em abril de 2004, quando se reuniram para combinar a formação dos consórcios da licitação do trecho sul do Rodoanel.
Outras teriam se juntando ao cartel até fecharem os últimos detalhes da licitação: vencedor, preços apresentados, condições, divisões dos cinco lotes entre os participantes do cartel e até abstenções.
O resultado saiu em abril de 2006. Andrade Gutierrez/Galvão Engenharia venceram o lote 1. Odebrecht/Constran levaram o lote 2. O terceiro ficou com a Queiroz Galvão/CR Almeida. Camargo Corrêa/Serveng assumiram o lote 4 e o quinto lote passou para a OAS/Mendes Júnior. As obras ficaram prontas em 2010 e terminaram ao custo de R$ 4,6 bilhões.
SISTEMA VIÁRIO
Nos depoimentos dos executivos da Odebrecht, também ficou evidente a formação de cartel, entre 2008 e 2015, em sete obras que fizeram parte do Programa de Desenvolvimento do Sistema Viário Estratégico Metropolitano de São Paulo, uma parceria entre o governo paulista e a Prefeitura de São Paulo.
Em 2008, quando foi lançado, o programa previa ampliação da Marginal Tietê e das avenidas Roberto Marinho, Jacú-Pêssego, Chucri Zaidan, Cruzeiro do Sul e Sena Madureira.
Também estava prevista uma obra no Córrego Ponte Baixa. Juntas, essas obras melhorariam o trânsito na capital paulista e custariam cerca de R$ 5,5 bilhões. O projeto foi dividido em lotes e as licitações ocorreram entre 2008 e 2013.
Segundo os depoentes da Odebrecht, até as obras no Córrego Ponte Baixa foram objeto do acordo -que tinha como objetivo impedir a entrada de participantes de fora do cartel e a acomodação entre as empresas envolvidas.
O processo a ser divulgado pelo Cade não menciona diretamente os governadores desde 2004, os tucanos Geraldo Alckmin, José Serra e Alberto Goldman, além de Cláudio Lembo, que governou pelo PFL entre abril de 2006 e janeiro de 2007.
Segundo os colaboradores, a formação dos consórcios foi feita conforme "sugestão do agente público" e com base na afinidade entre as empresas. Os documentos não revelam o nome desse agente.
Em reuniões entre Camargo, OAS, Odebrecht e Queiroz Galvão, por exemplo, teriam sido tratadas questões relativas aos ganhadores dos lotes da avenida Roberto Marinho.
INQUÉRITO
A partir de agora, a Superintendência ouvirá as empresas e os executivos de outras empresas que foram entregues pela Odebrecht na sua leniência com o Cade.
A Superintendência não tem prazo para concluir essa fase do processo, mas espera-se que sejam finalizadas até o final do primeiro trimestre de 2018. Depois disso, o processo é enviado para o conselho do Cade decidir se aprova o relatório e julga as empresas envolvidas. A companhia que fez a leniência não é condenada.
O julgamento final na esfera administrativa cabe ao Tribunal do Cade, que pode aplicar às empresas eventualmente condenadas multas de até 20% de seu faturamento. As pessoas físicas, caso identificadas e condenadas, sujeitam-se a multas de R$ 50 mil a R$ 2 bilhões.
VANTAGEM
Há outros doze acordos de leniência públicos apresentados pelo Cade referentes à Lava Jato. O primeiro foi celebrado com a empresa Setal/SOG, Camargo Corrêa, Carioca Engenharia, Andrade Gutierrez e OAS.
A legislação estimula a leniência porque, hoje, criou um mecanismo que prevê descontos para as empresas que forem pegas praticando cartel. A leniência só vale para a primeira empresa que confessar as ilicitudes praticadas. No entanto, a lei possui um mecanismo que permite às empresas envolvidas em um cartel desfrutar de descontos na multa em um processo caso entreguem outros cartéis de que tenha participado. Em boa parte é o que justifica a quantidade de leniências em andamento no Cade. Com informações da Folhapress.