© Philippe Wojazer / Reuters
O empresário Abilio Diniz lança na terça-feira (15) uma plataforma digital gratuita voltada à longevidade com bem-estar. Aos 81, ele diz que se preocupa com o tema desde os 29. A ideia é agrupar no espaço pesquisas e projetos amparados em evidência científica, além das experiências pessoais de indivíduos e de organizações que estão fazendo a diferença nas questões do envelhecimento.
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O Brasil experimenta um acelerado processo de envelhecimento populacional. Em 2030, o país terá mais idosos do que crianças pela primeira vez na história e isso já representa um dos principais desafios para o sistema de saúde. "Envelhecer é uma certeza, envelhecer com qualidade é uma escolha. E, para isso, você tem que começar a se preparar antes", diz Diniz, 81, que tem 6 filhos, 17 netos e 2 bisnetos.
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A plataforma (www.plenae.com) se ancora em seis pilares: corpo (sono, alimentação, exercícios), mente (estresse, aprendizagem), relações (família, comunidade), espírito (fé e meditação), contexto (renda, educação) e propósito (sentido da vida). O empresário, que tem fama de brigão no campo empresarial, acaba de deixar o comando do conselho da BRF, dona da Sadia e da Perdigão, após briga acirrada com os sócios da companhia. Ele afirma que o episódio provou que é capaz de dar "aula de acordo, de fazer as pazes". "Meu propósito é ser feliz e compartilhar conhecimento", diz ele, que espera viver mais "20 ou 30 anos".
PERGUNTA - Como surgiu a ideia de criar essa plataforma digital voltada à longevidade?"
ABILIO DINIZ - Presto atenção em saúde e longevidade com qualidade há muito tempo. Comecei a me preparar para os 80 anos aos 29, quando comecei a fazer análise e trabalhar a cabeça. Era um cara realizado, dono de uma pequena rede de supermercados, pai de três filhos, mas vivia angustiado, tenso. Comecei a sentir dores no peito e o cardiologista disse: 'Você não tem nada ainda, mas vai ter'. Comecei a cuidar do corpo, da alimentação, do sono, da espiritualidade. Envelhecer é uma certeza, envelhecer com qualidade é uma escolha.
P. - Mas as pessoas mal conseguem se cuidar pensando no presente, como fazer isso pensando a longo prazo?
AD - Não é fazer disso um problema, se estressando, mas saber que está construindo um ativo importante no envelhecimento. Eu tenho seis pilares nos quais eu me apoio: atividade física, alimentação, autoconhecimento, controle do estresse, espiritualidade e amor.
P. - Se tivesse que eleger um pilar, qual seria?
AD - Alimentação. Uma vez perguntei à Susan Andrews [antropóloga e psicóloga de 72 anos]: 'Como você se mantém bonita e sempre em forma?' Ela, com uma voz fininha e baixa, disse: 'Sabe, Abílio, eu como pouco'. Devemos comer, no máximo, aquilo que será consumido [queimado]. Depois de uma certa idade, o melhor é comer um pouquinho menos ainda. Controlar a alimentação é vital. Atividade física é outra. Não precisa ser atleta como eu fui, não precisa competir. Por muito tempo, elegi o esporte como competição. Eu odeio a derrota. Por isso, competia, competia. Mas, para uma longevidade com qualidade, é fundamental que se faça exercício de fortalecimento, principalmente dos músculos das pernas. Existe uma coisa chamada sarcopenia, que é a morte das células que compõem os músculos. Isso é tão certo quanto a morte e os impostos.
P. - Qual a sua rotina de esportes?
AD - Tenho um programa de cinco dias, de segunda a sexta. Cada dia tenho uma atividade. Jogo squash duas vezes por semana, luto boxe uma vez por semana. Não basta ter ossos e músculos fortes. É preciso ter um sistema neural capaz de acioná-lo com rapidez e agilidade. Corro na esteira para manter o sistema cardiovascular ativo, corro um pouco de costas também, faço bastante bicicleta e nado se estou um pouco machucado. E faço muito fortalecimento muscular, três dias de membros inferiores e dois dias, de membros superiores. Sábado e domingo eu faço um aeróbico qualquer, às vezes longas caminhadas.
P. - Seja pelo custo, seja pela falta de tempo, é muito difícil alguém conseguir manter uma rotina como a sua.
AD - Não precisa ser como o Abilio. Um pouco de aeróbico, uma caminhada, um pouco de esforço num plano inclinado, são mais do que suficientes. Mas priorize o fortalecimento das pernas. É imprescindível ter pernas fortes na velhice.
P. - Outro grande problema no envelhecimento é a perda de equilíbrio. Como manejá-la?
AD - O primeiro passo é se conscientizar de que você vai perdê-lo mesmo e ficar esperto. Existem maneiras de lutar contra isso. Perder o equilíbrio é complicado. Meu pai morreu aos 94 e minha mãe aos 99 anos. Os dois iam bem até o dia em que caíram e precisaram fazer complicadas operações, trocar cabeça do fêmur. Já não eram os mesmos quando voltaram para casa. As pessoas precisam olhar para isso, precisam se cuidar para não cair.
P. - No campo empresarial, o sr. tem fama de brigão...
AD - Eu tenho, mas já fui muito mais brigão. Dei aula de acordo, de fazer as pazes em tudo o que eu passei na BRF agora. Eu tenho uma agressividade que é minha, mas meu principal propósito é ser feliz. Desde pequeno, sendo filho de padeiro, baixinho e gordinho, busquei como meta ser feliz. Sempre fui um cara determinado, ambicioso para buscar meus objetivos. As pessoas conhecem mais as minhas reinvenções no campo empresarial, mas a maior foi ter me casado novamente aos 67, e hoje ter uma filha de 11 e um filho de oito anos.
P. - A plataforma digital vem na esteira disso?
AD - Sim, eu tomo cuidado com as coisas que faço para mim, mas há um bom tempo que a gente vem estudando atividade física, alimentação, administração do estresse, autoconhecimento. Agrupamos tudo no Plenae para que o maior número de pessoas possa se beneficiar de forma didática e gratuita. Vamos abrir a plataforma para o Brasil e, depois, para fora também. O maior interessado em longevidade com qualidade sou eu mesmo. Tenho filhos pequenos, mulher, quero viver mais 20, 30 anos. A minha espiritualidade é muito forte [ele é católico praticante], Deus tem sido um amigão comigo, tem me dado força, luz e clareza para superar as dificuldades. De que maneira posso retribuir? Fazendo o compartilhamento de todas as coisas que tenho aprendido na vida.
P. - Há muito modismo e pouca evidência científica em temas ligados à longevidade. A plataforma tem a preocupação de filtrar esses dados?
AD - A gente só vai trabalhar com base em evidência científica. Não recomendo dieta nenhuma. O que engorda ou o que faz mal à saúde é a regra, não a exceção. Tem muita gente que fala: 'ah!, para ele é fácil, só come salada, não gosta de nada, não bebe'. Não é verdade. Eu gosto de tudo de que as pessoas gostam, só não gosto de cebola e alho. Gosto de lasanha, pizza, churrasco. Mas eu não posso comer um churrasco no almoço e uma lasanha no jantar todos os dias.
P. - Como fazer chegar essas informações sobre longevidade à base da pirâmide social onde as pessoas, às vezes, não têm o que comer?
AD - Hoje, com as redes sociais, com um celular, todo mundo tem acesso a informações. Vamos decodificar esse conteúdo e mostrar em uma linguagem bem rasteirinha o que as pessoas têm que fazer com a alimentação, atividade física. É verdade que, com as pessoas mais humildes, é mais complicado. Elas não têm condições de ficar comendo cinco vezes por dia. Quando vão comer, estão morrendo de fome e comem o que tem. E comem muito porque acham que têm que estocar. Precisamos falar: comam alguma coisa nos intervalos, uma banana, por exemplo, que é fácil e barata.
P. - Mesmo as pessoas com boas condições socioeconômicas têm dificuldade em mudar hábitos. O nível de sedentarismo e estresse entre os executivos, por exemplo, é altíssimo. Qual o caminho?
AD - É muito difícil mesmo. As pessoas têm que começar a ver os benefícios. Eu não me estresso nunca [pensa um pouco e corrige: 'Eu não me estresso quase nunca']. Você precisa combinar com você mesmo com o que vai se estressar. Eu só me estresso com o que é muito importante na minha vida, com minha saúde e minha família. O resto é da vida. BRF, Carrefour, é da vida, é o que faço. Não vou me estressar com isso.É preciso ser minimamente organizado, ter disciplina. Saber o que vai fazer hoje ou semana que vem. Eu sei o que vou fazer no ano que vem. Não precisa ser idiota de se estressar por não conseguir ir daqui até ali em 15 minutos. Levei um tempão para entender isso. A questão, no fundo, é você se gostar. É olhar no espelho e dizer: eu gosto deste cara, vou fazer o melhor por ele. Com informações da Folhapress.