© Reuters / Ricardo Rojas
Pelo menos 4.645 pessoas morreram em consequência do furacão Maria e da devastação que causou em Porto Rico no ano passado, segundo um novo estudo de Harvard divulgado nesta terça-feira (29).
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A estimativa supera em muito o número oficial do governo, 64.
Publicado no New England Journal of Medicine, o estudo descobriu que a interrupção dos serviços de saúde aos idosos e a perda de serviços públicos básicos para os pacientes de doenças crônicas tiveram impactos significativos em todo esse território associado aos EUA, que foi atirado no caos em setembro, depois que o furacão varreu a rede elétrica e teve impactos generalizados na infraestrutura.
Algumas comunidades ficaram totalmente isoladas durante semanas, com estradas bloqueadas e falhas nas comunicações.
Pesquisadores nos EUA e em Porto Rico, liderados por cientistas da Escola de Saúde Pública T. H. Chan da Universidade Harvard e do Centro Médico Beth Israel Deaconess, calcularam o número de mortos pesquisando cerca de 3.300 famílias escolhidas aleatoriamente em toda a ilha e comparando o índice de mortes estimado após o furacão com o índice de mortalidade do ano anterior.
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Suas pesquisas indicaram que o índice de mortalidade foi de 14,3 por mil moradores de 20 de setembro a 31 de dezembro de 2017, um aumento de 62% comparado com 2016, ou 4.645 "mortes excedentes".
"Nossos resultados indicam que o número oficial de mortos, 64, é uma subestimativa substancial do verdadeiro peso da mortalidade depois do furacão Maria", escreveram os autores.
As estimativas oficiais de mortes atraíram fortes críticas de especialistas e moradores locais, e o novo estudo criticou os métodos de contagem de mortos de Porto Rico -e sua falta de transparência ao compartilhar informação- como um empecilho ao planejamento para futuros desastres naturais.
Os autores pediram que pacientes, comunidades e médicos desenvolvam planos de contingência para desastres naturais.
O Maria causou prejuízos de US$ 90 bilhões, tornando-se o terceiro ciclone tropical mais caro da história americana desde 1900, segundo os pesquisadores.
Mais de oito meses depois que o furacão devastou Porto Rico, a lenta recuperação da ilha foi marcada pela constante falta de água, falhas na rede elétrica e a falta de serviços essenciais.
Tudo isso pôs em risco a vida de muitos moradores que têm lutado para se reerguer, especialmente os doentes e os que vivem em áreas distantes, alguns dos quais foram os mais duramente atingidos pelo furacão.
A contagem dos mortos nesses desastres naturais é sempre uma tarefa difícil, mesmo sob circunstâncias ideais. Em Porto Rico, foi prejudicada pelas diversas falhas sistêmicas e pelo que os pesquisadores de Harvard acharam um método complexo de certificar as mortes em San Juan.
Os pesquisadores notaram que os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dizem que as mortes podem ser diretamente atribuídas a tempestades como o Maria quando são causadas por forças relacionadas ao evento, de destroços voadores à perda de serviços médicos; em Porto Rico essas mortes continuaram durante meses.
Entre os que morreram em consequência de lapsos no serviço médico estava Ivette Leon, 54, mãe de um grupo de escoteiros que morreu em 29 de novembro, cerca de 18 horas depois que foi liberada do hospital após o furacão.
Leon tinha adoecido, sentindo dores no corpo todo, com vômitos e calafrios. Os médicos lhe disseram que era uma infecção, deram-lhe medicamentos e a liberaram para a família.
O governo de Porto Rico enfrentou um exame imediato depois de relatar inicialmente que 16 pessoas tinham morrido em consequência da tempestade, que arrasou grande parte da ilha em 20 de setembro de 2017. O número continuou aumentando até o início de dezembro, quando as autoridades disseram que 64 pessoas tinham morrido.
O número oficial incluía diversas pessoas de todo Porto Rico, como as que sofreram ferimentos, foram arrastadas por inundações ou não conseguiram chegar a um hospital enquanto sofriam grave condição médica.
O governador Ricardo Rosselló não divulgou imediatamente dados de mortalidade nem as autoridades deram muita informação ao público sobre os processos que as autoridades estavam usando para contar os mortos. Mas as autoridades e médicos admitiam em particular que provavelmente havia muitos mais mortos e corpos se empilhando nos necrotérios de toda a ilha.
Depois de sofrer pressão do Congresso e de análises estatísticas de organizações noticiosas, que situavam o número de mortes acima de mil, Rosselló pediu a ajuda de especialistas da Universidade George Washington para revisar o processo de certificação de óbito do governo.
Ele prometeu que, "independentemente do que diga a certidão de óbito", cada morte seria inspecionada de perto para garantir uma contagem certa. "Isso não são apenas números, são vidas: pessoas reais, deixando para trás seres amados e famílias", disse Rosselló em uma entrevista coletiva no final de fevereiro.
Lynn Goldman, reitora da Escola de Saúde Pública do Instituto Milken, na Universidade George Washington, espera que um relatório inicial seja divulgado nas próximas semanas.
Especialistas estão avaliando dados estatísticos de mortalidade e pretendem mergulhar em registros médicos e entrevistas a famílias dos mortos, embora o âmbito e o financiamento da investigação mais profunda ainda não estejam claros, assim como seu momento.
Os pesquisadores de Harvard relataram que há vários motivos para que o número de mortos em Porto Rico tenha sido drasticamente subestimado. Toda morte relacionada a um desastre, disseram eles, deve ser confirmada pelo instituto de cientistas forenses do governo, que exige que os corpos sejam trazidos a San Juan ou que um perito médico viaje ao município local. E pode ser difícil localizar mortes por um agravamento de condições crônicas devido à tempestade.
Os pesquisadores disseram que o governo de Porto Rico parou de divulgar dados de mortalidade ao público em dezembro de 2017. Com informações da Folhapress.