© Reuters / Marko Djurica
Dois anos após o plebiscito que decidiu pela saída britânica da União Europeia, o Reino Unido parece ainda mais fragmentado. Incapaz de chegar a um acordo sobre o formato do "brexit", o país se afunda em um processo confuso e incerto para o divórcio.
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"Não há chance de consenso", diz à Folha de S.Paulo Anand Menon, diretor do centros de pesquisa UK in a Changing Europe, um dos principais a estudar o impacto do "brexit". Segundo ele, qualquer resultado alcançado em março de 2019, prazo para a saída, deixará muitos britânicos insatisfeitos.
Professor de política europeia no King's College London, Menon escreveu "Brexit and British Politics", de 2017.
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A primeira-ministra Theresa May está sob forte pressão mesmo dentro do seu governo por causa do "brexit". Isso dará fim a seu governo?
- Não há chance de consenso sobre o "brexit". A questão é saber se ela conseguirá votos parlamentares para aprovar o acordo. Embora os defensores do "brexit duro" a pressionem, porém, também é improvável que eles obtenham apoio suficiente para derrubá-la.
Quando renunciou, em julho, o ex-chanceler Boris Johnson disse que "o sonho do 'brexit' morreu". Mas as negociações continuam.
- A visão que ele tinha pode ter morrido, mas há várias versões de "brexit", e esse é um dos problemas. May está trabalhando para cumprir o prazo, e, por mais que muita coisa ainda possa ocorrer, a saída continua a ser o resultado mais provável.
Qual o "brexit" provável?
- Não sei. Sem maioria clara no Parlamento, é muito difícil prever. Minha impressão é que May fará mais concessões à UE do fez que no plano já apresentado. O problema é saber se o Parlamento vai aceitá-las. Não parece haver maioria para aprovar nenhuma das saídas: a saída sem acordo; o "brexit suave"; o "brexit duro".
Esta incerteza parece contaminar a sociedade.
- Há vários lados nas negociações, então é mais complicado do que as pessoas esperavam. E nenhum modelo prevalece. As decisões políticas estão sendo contestadas dentro do governo, do parlamento e até dentro dos partidos. E, claro, tudo tem que ser aceito pela UE.
Desde o plebiscito, o 'brexit' tem sido avaliado como reflexo da polarização política em curso em vários países. Pela sua descrição, contudo, a fragmentação é múltipla.
- Sim. Qualquer que seja o resultado, a maioria das pessoas ficará insatisfeita. Assim como o Parlamento, a sociedade está fragmentada. Quando falamos das divisões da sociedade, porém, eu diria que a questão vai além do "brexit": a divisão esquerda-direita foi atravessada por um cisma entre os socialmente mais liberais e os menos, pessoas abertas ou fechadas ao mundo. Foi isso que esteve por trás do voto no "brexit", ainda que o processo aqui difira de outros países.
Qual é a diferença?
- A forma do processo político. A França é tão dividida quanto o Reino Unido, mas porque o sistema político deles não favorece os extremos [há segundo turno eleitoral], o país acaba parecendo equilibrado e liberal. Aqui tivemos um referendo em que todo voto pesa.
O ex-premiê Tony Blair [1997-2007] tem defendido um novo plebiscito. É viável?
- Qualquer coisa é possível com o "brexit". Não acho que outro plebiscito seja a saída mais provável, mas não é impossível. Só não sei como isso diminuiria as divisões políticas –elas poderiam até crescer.
Temos debatido o curto prazo. Como será a política britânica em 2028?
- Quase tudo depende do que ocorrer no próximo ano. A natureza do "brexit", as reações a ele, e o processo de saída ditarão o futuro. Além disso, a política está mudando muito aqui. É muita coisa ao mesmo tempo.
O plebiscito vai se consolidar como um momento-chave da história?
- Certamente. O plebiscito em si já bagunçou a política, embaralhou linhas partidárias e gerou muita amargura. E o divórcio mudará nossa economia profundamente. Com informações da Folhapress.