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Investigação interna da Polícia Militar de São Paulo concluída neste mês diz não haver indícios suficientes para a corporação punir nenhum dos policiais militares suspeitos de participação na chacina de Osasco e Barueri, na Grande SP, que deixou 17 mortos em agosto de 2015.
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O relatório final, produzido por oficiais da PM, põe em xeque a apuração conduzida na época pela força tarefa do governo –da qual participaram a Polícia Civil e a Corregedoria da própria PM, sob gestão Geraldo Alckmin (PSDB). Diz que ela foi apressada e chegou a desprezar provas "de que não foram eles os autores".
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"Se análise mais atenciosa aos detalhes, aos fatos, às provas técnicas, testemunhais, tivesse sido realizada, certamente não estariam presos até a presente data três policiais militares aqui acusados", diz trecho de relatório que será encaminhado ao comando da corporação para decidir o futuro dos policiais militares.
A chacina de Osasco e Barueri foi a maior já registrada no estado. Segundo a investigação, na noite de 13 de agosto de 2015, homens armados mataram 17 pessoas, a maioria sem antecedentes criminais. As suspeitas recaíram sobre as forças de segurança porque, dias antes, um PM e um guarda municipal foram mortos por criminosos durante assaltos nessas cidades.
O relatório, produzido por um Conselho de Disciplina da corporação, trata de indícios relativos a dois sargentos, dois cabos e dois soldados apontados à época como suspeitos de participação no crime.
Três deles nem chegaram a ir a julgamento. Os outros três, porém, estão presos desde 2015 e foram condenados em primeira instância a mais de 100 anos cada um deles.
Na lista estão o cabo Victor Cristilder dos Santos e os soldados Fabrício Emmanuel Eleutério e Thiago Barbosa Henklain. Eles alegam inocência e recorrem na Justiça.
As punições previstas no Conselho de Disciplina vão de repreensão a expulsão. Por ser assunto administrativo, o resultado não precisa guardar relação com as decisões nas esferas criminal ou cível.
Um dos principais questionamentos citados pela investigação interna da PM se refere à testemunha protegida nomeada como Beta –considerada estratégica na apuração do crime. O relatório diz que ela não tem "qualquer credibilidade e teve suas informações confrontadas em juízo e completamente desacreditadas".
A testemunha disse, por exemplo, ter presenciado um assassinato praticado por Cristilder em Carapicuíba (Grande SP) na chamada pré-chacina –quando seis pessoas foram mortas entre os dias 8 e 9 daquele mês, na mesma região da Grande SP, com características semelhantes à chacina do dia 13.
Beta disse também ter certeza dessa identificação porque conhecia o PM pelo apelido de Boy, porque foram vizinhos em Carapicuíba, e que esse PM seria chefe da segurança de um mercado local.
Investigação da própria polícia apontou que Cristilder não tinha esse apelido, não morou na rua indicada por Beta e não trabalhou de segurança naquele mercado.
No endereço indicado como ex-residência do policial, na verdade, morou um outro PM –este sim apelidado de Boy.
A denúncia que levou à condenação dos policias –e também do guarda municipal de Barueri Sérgio Manhanhã– pelo tribunal de júri do Osasco é fundamentada principalmente na versão de Beta.
Com base nela, a Promotoria sustentou que Cristilder era chefe de grupo de extermínio do qual participavam os outros suspeitos –que, como ele, faziam bico no mercado.
A principal ligação entre Cristilder e os outros condenados levada ao processo foi a troca de mensagens (emoticons) entre ele o guarda Manhanhã em horários próximos do fim e do início dos ataques. Eram sinais de joinha –que, alegam os dois, referiam-se ao empréstimo de um livro.
Sobre isso, o relatório da PM afirma: "Incrível levar em consideração apenas a versão apresentada pelo responsável pela apuração na Polícia Civil e daí concluir que um sinal de positivo em forma de emoji demonstrasse que foram enviados para dar início a uma ação criminosa e depois avisar sobre seu término".
Algumas contradições de Beta –incluindo modelos e cores de carros diferentes utilizados no crime– levaram a Justiça de Carapicuíba a inocentar Cristilder sumariamente do homicídio doloso do qual era acusado na cidade na pré-chacina. Já em Osasco elas não foram consideradas relevantes pelos jurados.
Os advogados do grupo recorrem da decisão e devem usar esse documento da PM para tentar convencer os desembargadores do Tribunal de Justiça da necessidade de anulação dos julgamentos.
"Todos os advogados usarão esse relatório no recurso de apelação, como reforço de argumentação. Para nós, é de suma importância dada a rigidez e atenção que os oficiais da PM conduzem os processos", diz João Carlos Campanini, defensor de Cristilder. Com informações da Folhapress.