Caetano Veloso faz homenagem ao amigo Catra: ‘Sua voz, vida e obra’

O funkeiro morreu neste domingo, vítima de um câncer no estômago

© Divulgação / Multishow

Cultura LUTO 10/09/18 POR Notícias Ao Minuto

Um dos maiores ícones e expoentes da música brasileira, Caetano Veloso usou sua conta oficial no Instagram para prestar uma homenagem a Mr. Catra, que morreu neste domingo (9), aos 49 anos, vítima de um câncer no estômago.

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O cantor e compositor baiano escreveu um longo texto para falar sobre sua relação com o funkeiro carioca, destacando como eles se conheceram e se tornaram amigos. Além disso, Caetano ressaltou “sua voz, suas conversas, suas histórias, sua vida, sua obra”.

“Teve vida poligâmica organizada. Ele representava coisas essenciais do ethos das periferias urbanas brasileiras. E era um cara alto astral, que sabia gostar de viver. É um caso existencial que o Brasil deveria amadurecer para estudar. O povo e tantos de nós amadurecemos para amar. 32 filhos. Muita coisa para ser vivida em apenas 49 anos”, disse Caetano.

Confira abaixo o texto na íntegra:

"Quando, nos anos 90, o Orfeu de Cacá Diegues ficou pronto, fomos exibi-lo em Vigário Geral e Vidigal. Em Vigário, houve um show em que eu cantava canções que compus para o filme e, representando o som de rap e funk das favelas que (para desgosto de K. Maxwell) pontuava suas cenas, subiram ao palco MVBill e @MrCatraReal. Havia uma tela grande ao ar livre para projeção e um palco adjacente. Quando eu fui anunciado, um número simpático de moradores se aproximou e pude ver algumas caras atentas entre os que me ouviam. Quando Bill foi anunciado, houve aplausos mais intensos e cresceu muito o número de espectadores frente ao palco. Mas a multidão se multiplicou e delirava ao grito do nome de Mr. Catra. Muita gente vinha dos barracos, gente que nem tinha se abalado para vir ver o filme. Fiquei fã de Bill, cuja música já conhecia, impressionado com sua beleza, elegância e integridade. E Catra, que eu desconhecia totalmente, me fascinou para sempre. Fiquei amigo tanto de Bill quanto de Catra. Com Bill tenho tido mais colaboração e parceria. Mas Catra foi uma série de surpreendentes revelações. Sua voz, suas conversas, suas histórias, sua vida, sua obra. Em Vigário ouvi coisas que vieram a ser conhecidas como funk proibidão. Depois ouvi de Catra autobiografia em que ele, criado por família branca de classe média, resolveu, adulto, ir viver na favela. Mais tarde, fui vê-lo cantar no Paris Café, no Recreio dos Bandeirantes, canções religiosas hebraicas sobre base eletrônica, entre damas da noite de salto alto e sem roupa. Seu amor por Israel era imenso. Sua visão da história era ousada e problematizada pessoalmente ("negros é que escravizaram negros e os venderam na costa"; "não precisamos de cotas mas de reencontrar a nobreza negra"; "não vou votar em ninguém em 2018: do jeito que tá hoje, me arrependo de ter lutado pela redemocratização"). Teve vida poligâmica organizada. Ele representava coisas essenciais do ethos das periferias urbanas brasileiras. E era um cara alto astral, que sabia gostar de viver. É um caso existencial que o Brasil deveria amadurecer para estudar. O povo e tantos de nós amadurecemos para amar. 32 filhos. Muita coisa para ser vivida em apenas 49 anos".

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Quando, nos anos 90, o Orfeu de Cacá Diegues ficou pronto, fomos exibi-lo em Vigário Geral e Vidigal. Em Vigário, houve um show em que eu cantava canções que compus para o filme e, representando o som de rap e funk das favelas que (para desgosto de K. Maxwell) pontuava suas cenas, subiram ao palco MVBill e @MrCatraReal. Havia uma tela grande ao ar livre para projeção e um palco adjacente. Quando eu fui anunciado, um número simpático de moradores se aproximou e pude ver algumas caras atentas entre os que me ouviam. Quando Bill foi anunciado, houve aplausos mais intensos e cresceu muito o número de espectadores frente ao palco. Mas a multidão se multiplicou e delirava ao grito do nome de Mr. Catra. Muita gente vinha dos barracos, gente que nem tinha se abalado para vir ver o filme. Fiquei fã de Bill, cuja música já conhecia, impressionado com sua beleza, elegância e integridade. E Catra, que eu desconhecia totalmente, me fascinou para sempre. Fiquei amigo tanto de Bill quanto de Catra. Com Bill tenho tido mais colaboração e parceria. Mas Catra foi uma série de surpreendentes revelações. Sua voz, suas conversas, suas histórias, sua vida, sua obra. Em Vigário ouvi coisas que vieram a ser conhecidas como funk proibidão. Depois ouvi de Catra autobiografia em que ele, criado por família branca de classe média, resolveu, adulto, ir viver na favela. Mais tarde, fui vê-lo cantar no ParisCafé, no Recreio dos Bandeirantes, canções religiosas hebraicas sobre base eletrônica, entre damas da noite de salto alto e sem roupa. Seu amor por Israel era imenso. Sua visão da história era ousada e problematizada pessoalmente ("negros é que escravizaram negros e os venderam na costa"; "não precisamos de cotas mas de reencontrar a nobreza negra"; "não vou votar em ninguém em 2018: do jeito que tá hoje, me arrependo de ter lutado pela redemocratização"). Teve vida poligâmica organizada. Ele representava coisas essenciais do ethos das periferias urbanas brasileiras. E era um cara alto astral, que sabia gostar de viver. É um caso existencial que o Brasil deveria amadurecer para estudar. O povo e tantos de nós amadurecemos para amar. 32 filhos. Muita coisa para ser vivida em apenas 49 anos.

Uma publicação partilhada por Caetano Veloso (@caetanoveloso) a 9 de Set, 2018 às 4:19 PDT

Em tempo, relembre no vídeo abaixo a parceria musical de Caetano e Catra, quando o funkeiro cantou ao lado do tropicalista o sucesso “Vaca Profana”, durante um programa que o agora saudoso artista carioca teve no canal Multishow, em 2016:

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