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A desvalorização do peso e a inflação em disparada golpearam o setor gastronômico de Buenos Aires, um dos principais atrativos turísticos da capital argentina, ao lado da vida noturna. O número de estabelecimentos que fecharam as portas, em meio à crise econômica do país, expõe esse problema a portenhos e turistas.
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De acordo com a Câmara de Restaurantes e Associação de Hotéis, Restaurantes, Confeitarias e Cafés de Buenos Aires, em 2017 foram fechados 365 pontos gastronômicos, dos 4.000 registrados. A projeção para 2018 é de que número similar de casas deve encerrar as atividades.
A sinalização mais vistosa da tendência foi o fechamento da Rond Point, em julho. A tradicional confeitaria, há 40 anos recebendo a elite política e cultural da cidade, anunciou que suspenderia as atividades para uma nova reforma, sem porém informar a data de reabertura.
"Sair para comer é uma das primeiras coisas que as pessoas cortam quando aumenta a inflação", diz Verônica Sánchez, presidente da câmara. A inflação argentina segue para fechar o ano em 45%.
Com o peso desvalorizado, são os visitantes que socorrem comerciantes. "Nossa sorte são os turistas, que veem a Argentina barata por causa da desvalorização do dólar e querem sair para comer fora", diz Nicolo Puzzi, dono de uma cantina no bairro de Chacarita, fora do circuito turístico.
Quem mantém as portas abertas sofre com os custos de insumos. Ingredientes cotados em dólar rarearam.
Em um restaurante japonês no bairro de Palermo Soho, na semana passada, não havia wasabi. "Durante o kirchnerismo, não tinha também, mas era por causa das travas às importações. Agora não tem porque está caríssimo", disse o sushiman Cesar Araoz.
Uma recomendação da câmara aos restaurantes e bares é restringir horários para baixar os custos e, com isso, segurar os repasses para os preços nos cardápios.
Outra grande dificuldade para os comerciantes é lidar com os aumentos das tarifas de gás, eletricidade e água, que vêm paulatinamente perdendo os subsídios que recebiam durante os governos kirchneristas (2003-2015).
São crescentes os gastos para se manter o básico da operação -a iluminação, o gás para a cozinha e para a calefação, por exemplo.
Cafés mais simples, de bairro, que sobreviviam apenas na base de vendas de medialunas e cafés, começam a ter de improvisar para oferecer produtos mais em conta.
Os pontos mais baratos hoje são disputados, em especial para a abertura de cervejarias artesanais -verdadeira febre entre a juventude local- ou para pequenos investimentos voltados ao turismo.
Esse movimento de popularização, ainda que garanta algum retorno financeiro em meio à grave crise, tem um custo cultural: descaracteriza uma espécie de patrimônio local, o famoso café do bairro, onde portenhos se reúnem para ler jornais e conversar.
"Estão fechando estabelecimentos com mais de 40 anos de tradição gastronômica, que já vinham mal, mas resistindo e, com a crise atual, desistem. Como não há perspectiva de melhora, chega a um momento em que não há mais onde cortar", diz Sánchez. Com informações da Folhapress.